Conselho Tutelar, o “Procon” da área da infância e adolescência

Escola Superior do MPU
3 min readApr 26, 2017

Por Tiago Ranieri de Oliveira, Procurador do Trabalho e Vice-Coordenador Nacional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (COORDINFANCIA/MPT)

Os conselheiros tutelares são agentes que procuram assegurar os direitos da criança e do adolescente, abordando-os, sensibilizando-os, identificando suas necessidades e demandas e desenvolvendo atividades e tratamento. Eles funcionam como uma espécie de “Procon” da área da infância e adolescência, pois recebem o encargo de atender brasileirinhos em situação de risco pessoal e social, em razão dos seus direitos terem sido ameaçados ou violados por ação ou omissão da sociedade ou do Estado.

Esta ocupação, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), nasceu da necessidade de se implementar os direitos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal de 1988, em especial os direitos das crianças e dos adolescentes. O trabalho desses agentes é exercido em instituições ou nas ruas, geralmente em equipes multidisciplinares. Os horários são variados: tempo integral, revezamento de turno ou períodos determinados.

Socialmente, o Conselho Tutelar tornou-se uma das primeiras instituições da democracia representativa, uma vez que seus membros são escolhidos pela própria sociedade. É um órgão garantista da exigibilidade dos direitos assegurados nas normas internacionais, na Constituição e nas leis voltadas à população infanto-juvenil. Sua atuação vai além da requisição de serviços, passando pela identificação das vulnerabilidades, buscando tratá-las na dimensão e especialidade que merecem.

Para tornar suas decisões efetivas, os conselheiros tutelares podem requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, assistência social, previdência, trabalho e segurança. Diante de qualquer situação de vulnerabilidade, risco e/ou ameaça aos direitos da criança e do adolescente, o Conselho Tutelar tem a legitimidade e obrigatoriedade de atuar para que o princípio da proteção integral e prioridade absoluta seja garantido e concretizado.

Também é papel do conselheiro agir para coibir o trabalho infantil, aquele desempenhado por pessoa abaixo de 16 anos de idade. Num país em que a desigualdade social impera, o trabalho abaixo da idade mínima ainda é visto, pelo senso comum, como uma alternativa à miserabilidade e à marginalidade. Infelizmente, essa visão atinge a atuação do próprio conselheiro tutelar, o que gera grande deficiência no combate dessa mazela social.

Esse olhar equivocado ocorre por falta de capacitação e qualificação, de sensibilidade com o tema (acreditar que o trabalho antes de 16 anos é natural torna-o invisível), e pela ausência de um Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente efetivo. Disso surge um paradoxo: se o “soldado” de frente (conselheiro tutelar) não consegue identificar o “inimigo”, toda a atuação do restante do sistema de garantia de direitos (CRAS, CREAS, MPE, MPT, Justiça) fica comprometida, pois a rede não será acionada a tempo e na proporção que foi planejada.

Importante ressaltar que não é papel do conselheiro tutelar fiscalizar empresas que exploram mão de obra infantil. Essa competência é do auditor-fiscal do trabalho. Entretanto, ao conselheiro cabe identificar a ocorrência do trabalho infantil e, para isso, ele tem que estar apto a detectá-la, colher dados para acionar a rede de proteção, requisitar serviços e notificar o Ministério Público do Trabalho.

Há ainda a necessidade de o conselheiro tutelar conhecer todos os atores da rede proteção do seu município (CMDCA, CRAS, CREAS, diretores e professores de escolas, agentes comunitários de saúde, promotor de Justiça, juiz da Infância, juiz do Trabalho, procurador do Trabalho, entre outros) e saber que alternativas podem ser ofertadas para solucionar o problema.

Certamente, sem afetividade pelos direitos da criança e do adolescente, jamais teremos efetividade na luta para a qual o Conselho Tutelar foi criado.

* Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU). Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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