UM PERIGO ENTRE AS GERAÇÕES

Fabio Souza
6 min readMay 22, 2023

Muitas vezes buscamos, para garantir uma segurança de funcionamento dentro de um contexto ministerial, aceitar reproduzir o comportamento de um sistema que já está sentenciado, mas que funciona no tempo vigente, como se adaptar-se a isso fosse o melhor para ser saudável no serviço ministerial.

Mas eu observo algo que foi muito triste na história do Brasil: esse mesmo sistema foi alimentado por muitos profetas mais velhos que não se submeteram a serem treinados por outros mais velhos que eles, ou ainda, por outros que estivessem à sua frente por terem caminhado há mais tempo nessa expressão. Isso compromete em muito quando se aconselha alguém mais novo que ele ande com o mais velho, porque este mesmo não se disciplinou no desenvolvimento do seu próprio serviço. Esse é o retrato do profético-apostólico no país.

Por isso, será necessário criar um novo procedimento, e infelizmente, para preparar os mais novos, invariavelmente teremos de encarar o modelo vigente dos mais velhos que já foi construído em cima de uma insubmissão dentro do próprio Corpo.

“No caminho para o Egito, no lugar onde Moisés e sua família haviam parado a fim de passar a noite, o Senhor o confrontou e estava prestes a matá-lo. Mas Zípora pegou uma faca de pedra e circuncidou seu filho. Com o prepúcio, tocou os pés de Moisés e lhe disse: “Agora você é para mim um marido de sangue”. (Quando disse “um marido de sangue”, estava se referindo à circuncisão.) Depois disso, o Senhor deixou Moisés.”

‭‭Êxodo‬ ‭4‬:‭24‬-‭26‬ ‭NVT‬‬

Um personagem que pode nos ajudar a visualizar a gravidade desse comportamento é Moisés. Quando ele é chamado por Deus, demorou um tempo para ser convencido, assim como levou tempo para ser capacitado, e ainda colocou uma pessoa entre ele e Deus, Arão.

Mais à frente, Moisés também correu o risco de perder sua vida e seu chamado pelo fato de, antes mesmo de tirar o povo do Egito, não ter circuncidado seu próprio filho Gérson. Esse foi o mesmo ponto que ele não observou enquanto caminhava os 40 anos no deserto. Ele achava que os problemas do deserto mereciam mais atenção, quando na verdade algo muito mais decisivo estava sendo negligenciado.

Os memoriais são referências que Deus coloca ao longo da jornada para que relembremos premissas essenciais, e não demos espaço para coisas que não fazer parte do nosso viver com Deus. A circuncisão era uma ação física que ajudava a preparar para o futuro. Um hebreu mostrava assim para o seu filho a garantia do cumprimento sobre a promessa que Deus tinha feito ao pai Abraão. No caso de Moisés, a circuncisão era um símbolo marcante da aliança de Deus com o povo, e de maneira mais direta, sobre a promessa da entrada na Terra Prometida.

Porém, os complicadores foram aumentando cada vez mais. Além de não circuncidar a geração dando o recurso que a ajudaria a tomar as posturas certas, Moisés acabou se ocupando ainda mais em combater as posturas erradas do povo, como no episódio do bezerro de ouro. Esse é um risco que todos nós corremos quando primeiro omitimos um compromisso com a esperança. Primeiro, desacreditamos do que foi orientado e depois vamos perdendo tempo insistindo em destruir ameaças, quando na verdade isso é a responsabilidade do povo fazer. Vamos tentando trabalhar mais do que Deus, como se isso fosse possível, e acabamos cansados, inclusive nas nossas expectativas sobre o que está por vir. O mesmo aconteceu com Moisés; ele não tinha esperança no futuro. Ele atende a missão de tirar o povo de um lugar, mas não transmite a esse mesmo povo a esperança e a preparação para prosseguir.

Quando o povo chegou à Terra Prometida, em Josué 5, no final da sua liderança, Moisés mais uma vez não se recorda de circuncidar os mais novos para assumirem de maneira palpável uma parte da promessa que aquela circuncisão estaria garantindo deles receberem enquanto filhos de Abraão.

“Josué teve de circuncidá-los porque todos os homens com idade suficiente para ir à guerra quando saíram do Egito haviam morrido no deserto. Assim, Josué circuncidou os filhos dos israelitas que haviam crescido e tomado o lugar de seus pais, pois não tinham sido circuncidados no caminho.”

‭‭Josué‬ ‭5‬:‭4‬, ‭7‬ ‭NVT‬‬

Perde-se uma geração inteira no deserto; aqueles que sabiam guerrear as guerras do passado e do presente e que viveram todos os desafios de Israel na travessia do deserto morreram sem nem terem sido circuncidados. Moisés ficou preocupado com os problemas e as circunstâncias do deserto, enquanto uma geração inteira nasceu ali e não era circuncidada enquanto nascia. E em vez de preparar um povo novo, Moisés morreu com o povo antigo.

Josué foi colocado para tomar aquilo que foi prometido, mas antes precisou corrigir a rota, tendo que circuncidar aqueles que não foram circuncidados, antes mesmo de ingressarem na terra. Esta foi sua primeira tarefa ao assumir a liderança de Israel. E com isso, ele teve que trabalhar o coração e o interior desses homens para que eles pudessem possuir o que foi prometido para eles da maneira devida, sem correrem o risco de serem assediados por outros deuses. Assim foi possível comer do produto da terra, como também foi possível uma ocupação apostólica. Porém tudo foi muito custoso porque, embora estivessem muito perto, a circuncisão demandava tempo, assim como demanda tempo tratar das coisas profundas do coração. Exige um tempo de parar, mexer, e tempo de sarar até que se possa avançar novamente.

““Povo teimoso! Vocês têm o coração incircuncidado e são surdos para a verdade. Resistirão para sempre ao Espírito Santo? Foi o que seus antepassados fizeram, e vocês também o fazem!”

‭‭Atos‬ ‭7‬:‭51‬ ‭NVT‬‬

Com isso, eu trago uma pergunta: como você está contando os seus dias? Se você conta os seus dias olhando para frente, não pode ter medo do futuro. Você precisa olhar para frente sabendo que aqueles que estão atrás de você são a entrada para este futuro. E eles estão no futuro mesmo parecendo estarem atrás hoje, e são eles que podem levar a nós, os mais velhos, para esse destino.

João Batista dizia “o que vem após mim é maior do que eu”. O que vem após o nosso tempo hoje sempre será maior. Isaque viu o futuro e abençoou seus filhos; do mesmo modo, não podemos ter medo de “perder a utilidade”. Nossa utilidade para o futuro vai estar condicionada à forma como estamos olhando no presente aqueles que estão atrás e vêm depois de nós, os mais novos.

Ezequias não se importou com a geração, assim como não se importou com seus filhos nem com o futuro. Ele só quis tirar mais proveito, viver bem os seus próprios dias, e isso encerrou a tolerância de Deus sobre todo o Israel. Já havia sido decretado de que depois do seu reinado o povo entraria em uma interrupção, um exílio. Às vezes, nós demoramos para concluir aquilo que precisamos simplesmente porque não nos importamos com o futuro, nem com os mais novos; nós não esperamos pela beleza dessa construção.

“Ezequias disse a Isaías: “A mensagem do Senhor que você transmitiu é boa”. Pois o rei pensava: “Pelo menos haverá paz e segurança durante minha vida”.”

‭‭2Reis‬ ‭20‬:‭19‬ ‭NVT‬‬

Conclusão

Então hoje temos uma tarefa: precisamos nos ocupar em circuncidar uma geração que já nasceu no deserto, em meio aos problemas que tentamos resolver e às vezes, por focar mais neles, não estamos tendo a paciência necessária para uma tarefa maior. Qual deve ser a nossa ênfase nesse momento? Com toda certeza, preparar o coração de uma geração para que ela entre e possua o que está a uma pequena distância, e nós possamos ver o futuro, e abençoar os que estão próximos de nós. Para que possamos receber a dádiva de termos mais um tempo e, em meio a isso, estarmos mais envolvidos em cuidar do futuro do que dos dias em si, que já são um presente. Eu acredito ser esse o nosso principal desafio.

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Fabio Souza

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