O texto mais difícil de escrever

Fernanda Fahel
3 min readMay 29, 2017

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Foto: https://goo.gl/aOV1vU

Desde que criei o Despedida de Ana e Mia, sempre falei que me despedi da Anorexia e da Bulimia, focando sempre nesses dois transtornos alimentares. Mas, na realidade, me despedi também da Compulsão Alimentar. Acho que demorei a escrever algo sobre essa parte da minha vida porque talvez tenha me forçado a apagar da memória.

Acontece que eu tinha vergonha de falar sobre isso, porque foi o maior dos sofrimentos em todo o período que tive transtorno alimentar. E o que me fez ter força para finalmente expor essa parte da história foram os relatos que recebi de pessoas que também tiveram compulsão.

A compulsão começou durante o tratamento de anorexia e bulimia. Meus pais tinham acabado de se separar, eu ia mudar de casa, ia mudar de escola, tinha que escolher uma profissão — eu queria jornalismo, uns falavam que era melhor fazer engenharia -, as pessoas falavam que eu tinha engordado… Engordado! A ansiedade me consumiu.

E junto com a ansiedade, veio o descontrole. Falo que meu sofrimento nesta fase era maior porque, antes, quando eu simplesmente não queria comer, eu não comia. Quando me forçavam a comer, eu vomitava. Mas a compulsão eu não conseguia controlar. Comia, comia, comia… Sem limites. Eu queria parar, mas não tinha força.

Para minha mãe era muito simples, assim como foi com a anorexia. Para ela era muito simples eu comer, assim como ela achava que era muito simples eu não acabar com todas as bolachas do armário da dispensa e com tudo o que havia na geladeira.

“QUEM COMEU TODA A BARRA DE CHOCOLATE QUE EU COMPREI?”, “QUEM COMEU TODO O SORVETE QUE TINHA?”, “QUEM COMEU TODO O DOCE DE LEITE?”, “QUEM COMEU TODOS OS LANCHES QUE SÃO PRA LEVAR PRA ESCOLA?”…

Claro que foi a Fernanda. Sentia vergonha. Junto vinha mais ansiedade. Mais descontrole. Mais depressão. Menos autoestima.

ACONTECE QUE NÃO ERA SIMPLES!

Eu precisava de ajuda! Minha mãe brigava, conversava, tentava compreender… Não tinha jeito. Voltei para a terapia, era o melhor a se fazer.

Percebi que o que me fazia ter episódios de compulsão era ficar sozinha. Eu sempre precisei de alguém para conversar ou para assistir um filme ou só para me fazer companhia. Quando ficava sozinha, a comida virava minha companheira. Comia até não aguentar mais.

Com isso, a bulimia acabou ganhando seu espaço de volta. Mas tinha dias que a garganta não suportava mais tanta dor… Já não conseguia colocar para fora. Ganhei peso e mais sofrimento.

Tinha vergonha de sair na rua, de ir para a escola, de comer na frente das pessoas, de vestir roupas justas… Logo eu, que sempre fui tão vaidosa.

As compulsões pararam há quase cinco anos, com muita persistência no tratamento e usando meu tempo para fazer o que gosto. Minha autoestima voltou, o descontrole cessou e a felicidade nasceu. Hoje consigo comer na frente das pessoas, consigo tomar um café da manhã com a minha mãe… Hoje tenho controle sobre a minha vida.

O tratamento multidisciplinar me ajudou muito, por isso sempre digo que os pais devem dar apoio aos filhos e procurar os especialistas necessários. Mas além disso, é preciso se amar e ser amado.

Sobre a Compulsão Alimentar: esse transtorno se caracteriza pela ingestão de grande quantidade de alimentos em um período de tempo limitado, acompanhado da sensação de perda de controle. É necessário entender que não se trata de fraqueza ou falta de força de vontade, mas sim de um distúrbio alimentar. O que muita gente não sabe é que a anorexia e bulimia podem desencadear a compulsão, já que dietas restritivas só alimentam a ansiedade por querer comer mais. Não se culpe se você desenvolveu a compulsão. Saiba que é comum e que existe tratamento!

Termino este texto com um alívio enorme. Eu me despedi da compulsão alimentar. Ela não me pertence mais!

Aqui falo sobre como venci a Compulsão Alimentar. ❤

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Fernanda Fahel

Jornalista, Educadora Parental (PDA), Doula, madrasta e mãe. Criadora do Despedida de Ana e Mia (2013) e De Bem Comigo (2014). 🌟 Instagram: @fefahel