Indo, voltando, revoltando e o “novo”, denovo…

Filipe Dalmatti Lima
10 min readJul 28, 2015

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Um ensaio sobre a história do RPG, segundo meu ponto de vista.

Olá pessoal, antes de mais nada, dedico este texto ao Gary Gygax.

Está aqui, Bro-Gax, que os raios Fifo cheguem até você!

BAAAAM!!!

Então um doido resolve que joguinhos com miniaturas seriam mais legais se as mesmas minis tivessem “vida”. E um bando de idiotas comprou essa ideia estúpida e ficou ouvindo o que aquele doido tinha a dizer….

Pois é, eis que nasce o D&D em sua forma mais bruta. Ninguém sabia o que era RPG, nem se existiam formas certas de jogar. Os conceitos eram todos primitivos e orientados exclusivamente para a regra de combate: se a sua rolagem for igual ou maior que a Tentativa de acertar classe de armdura zero (TAC0) você acertou!

A real, é que os jogos de estratégia nos ensinaram bem a conduzir um combate. Mas e o resto? PORRA, FUDEU… isso os jogos de minis não ensinaram….

Ai meu amigo, isso foi desenvolvido na base gogó: a arte de convencer pela lógica (se é que tem alguma lógica em sentar ao redor de uma mesa, rolar dados, falar de elfos e dragões e ainda mencionar o que seria “fisicamente factível”). Porra, como eu vou encontrar uma armadilha?

  • Caralho MANO, usa a porra da lógica: é claro que com uma VARA DE 3 METROS eu acho qualquer armadilha (dat vara), basta dizer onde eu toquei ela…

Este é apenas um dos muitos exemplos de como usar lógica dentro do RPG para resolver os problemas. E mano, não, não estou criticando! É um puta sistema FODA! Adoro jogos old school e a lógica RPGística de resolver problemas. Tudo tinha que ser resolvido seguindo uma narrativa. Não tinha balanço e essas porra que servem para nego chorão… então você que ser um cara que só uma magia por dia, tem o pior PV base, não pode usar armadura e sabe que depende do trabalho em equipe para sobreviver? Caralho, que dahora, faz tua ficha de mago ae ❤ ❤ ❤ ❤ ! Então o jogo estava indo

Só que… este sistema lindo tinha uma desvantagem chamada BOM SENSO! Por que o jogo começou a se popularziar e uns pombos enxadristas (que acham que apenas aquilo que eles pensam está correto e não aceitam argumentos) estavam fodendo com o RPG! Imagina que legal, você está lá, DE BOAS NARRANDO TEU D&D primeira edição e chega um #pomboenxadrista na tua mesa e começa a questionar seu “bom senso” com o conceito de “bom sendo” dele:

“Mas mestre, é IMPOSSÍVEL meu personagem ser incapaz de abrir esta fechadura, no histórico de 10 páginas eu contei sobre mais de 1000 tipos de fechadura diferente que ele já é ESPECIALISTA em abrir. Como estamos falando de uma era medieval, só existiam 947 tipos, ou seja….mimimimimi… não seja injusto…. mimimimimi …. não sei porque pede para a gente fazer histórico se não podemos usar as informações lá … mimimimimi….”

Aí meu amigo, FUDEU! D&D não funcionava sem bom senso. Conclusão: precisamos de um sistema melhor, é lógico. Fácil, vamos criar regras para as coisas que fazemos com mais frequência: cavalgar, escalar, diplomacia, heráldica, idiomas antigos, etc. Também precisamos de mais opções, que tal uma classe mais da natureza? Um campeão da luz que nem o El Cid, caralho, aquele filme foi foda demais! E mais magias, magias todo mundo gosta das magias… Nossa, eu comecei nessa época! Bom e velho AD&D!

Como nem só de D&D viverá o homem, outras vertentes surgiram. Temos o GURPS que levou a sério esse lance de resolver todos problemas com regras. Se a questão era falta de regras, simples, façamos 1 regra para cada situação! Agora acabou, RPG não precisa mais de bom senso, lançamos o manual que governa o mundo virtual, basta estudar ele e aplicar todas as regras! GENIUSSS. Parabéns Senhor Steve Jackson, você inventou o primeiro mundo virtual analógico: bastava o jogador anunciar uma ação e com um tempo tendendo ao infinito, paciência e boa vontade, o mestre com certeza encontraria uma regra para a situação nos 666 suplementos de GURPS. Ou não, alguns mestres audaciosamente usavam do bom senso enquanto jogavam GURPS. Inclusive, isto é exatamente o distingue uma boa sessão de uma sessão lixo em GURPS: bom senso.

Já algumas pessoas mais espiritualistas resolveram que os búzios poderiam resolver todas as coisas, inclusive no RPG. Então elas juntaram suas crenças obscuras com a infalível predição da religião africana e criaram o sistemas de “Mundo das Trevas”, muito conhecido pelos jogos “Vampiro, a máscara”; “Lobisomen, o apocalipse”, “Mago, a ascensão” e seus outros 666 cenários míticos. Brincadeiras a parte, a White Wolf mandou bem pra caralho! Sua premissa foi a seguinte: no final de contas não precisamos só de regras, precisamos de história, de conteúdo. Cada jogador precisa se sentir único e o mais importante da face da terra. E mano, foi do caralho! Sério! O sistema D10 é super legal e introduziu fortemente a ideia de “interpretar seu personagem” criando livros e mais livros puramente descritivos. Até começaram os “Live-Action Roleplays” em que a galera usava a ambientação de Vampiro e resolvia as coisas com Jo-Ken-Po ao invés de búzios. Mano, bons tempos! Eu não to nem aí se o Vampiro não foi o primeiro LARP, pelo menos ele foi um dos mais famosos em São Paulo e para mim isto é o que vale.

Ainda existiram outros sistemas na mesma época e cada um com uma proposta. Só que foda-se, não vou falar do que eu não conheço direito. O que eu posso garantir é que esta é a santíssima trindade do RPG e estes são os principais elementos, até então (segundo a minha opinião, este é o meu texto, se eu quisesse falar sobre a teoria GNS eu teria falado!):

  • Bom senso
  • Interpretação/História/Narrativa
  • Regras

Todos os jogos/cenários tinham uma forma de lidar com isto. Até que o Mundo das Trevas e GURPS permaneceram mais ou menos “as it is” até os dias de hoje. Já o nosso brother D&D… quanta diferença!

Mesmo sendo O JOGO, AD&D era questionado e remendado o tempo todo. Não é atoa que temos 6,23x10^23 suplementos tentando buscar novos sabores, opções e inovação para o jogo.

Chegou a hora da terceira edição: D&D 3/3.5/3.75 ou Pathfinder

Vamos melhorar as regras e dar o flavor de opções para os jogadores com o sistema de talentos. Também vamos acabar com o desbalanço do jogo, tornando-o equilibrado e divertido para todos. Vamos adicionar níveis de encontro, assim os desafios estarão sempre na “medida certa”. Tinha TUDO para dar certo, tudo mesmo… só que…

Sem o bendito do bom senso, porra, o D&D virou uma espécie de GURPS muito mais cancerígena. Pelo menos em GURPS o mestre podia limitar o número de suplementos. Só que D&D, bicho… FUDEU: todos deveriam funcionar em “harmônia”. Agora os #pombosenxadristas começaram a estudar o sistema e fazer verdadeiros combos intermináveis (ao invés de contar detalhes obscuros no histórico). Se eu fizer gnomo guerreiro da para começar com CA 22 e BBA +8 para atacar com toque no nível 1, pronto: fiz meu guerreiro-tocador gnomo arremessador de fogo grego. Aí do mestre se ele não deixar, vou #cholar.

Então o D&D 4th perguntou para sua mãe: no céu tem pão? E morreu

Pronto, o sacro-santo caiu e não tinha uma Frostmourne que o transformou em um Lich-King. A galera de RPG despirocou. Até este momento as coisas tinham apenas ido e voltado. Agora as coisas estavam revoltando.

Eis que começaram movimentos como:

  • Vamos voltar a jogar como nos primórdios, aquilo que era RPG. (coff… DCC… coff OD.. coff, coff, coff)
  • Vamos voltar para o 3.5 ou migrar ao Pathfinder (que é menos bugado e tem uma equipe que houve nossos feedbacks, coisa que a WoTC não era acostumada em fazer).
  • GURPS e Vampiro seguiram em paz, dando risada da concorrente…
  • Vamos criar jogar que reforçam a narrativa deixando as regras em segundo plano.

Então BAAAAAM: o corpo morto fedendo da quarta edição serviu de esterco para os sistemas modernos mais fodas ou jogos indepentes. Eis que muitos jogos começaram a aparecer no mercado. Sério, obrigado WoTC por ter feito a quarta edição. Graças a ela o RPG prosperou e virou coisa linda de Deus.

Então, Gary Gygax não suportaria a 4a edição. Alias, isto é bíblico:

O justo perece, e ninguém pondera sobre isso em seu coração; homens piedosos são tirados, e ninguém entende que os justos são tirados para serem poupados do mal. Isaías 57:1

Sim meus amigos, o Deus Cristão com certeza joga D&D e tirou Gary-Bro da terra antes que ele visse a MERDA da WoTC.

E todos aqueles que gostaram/defendem D&D 4th, saibam que:

Agora que eu já fiz minha zueira e alfinetei hard, quero falar do “novo”

Aqui houve uma quebra total de paradigma. No princípio era:

O jogo já tem as regras para o combate, o resto podemos resolver usando lógica, narrativa, bom senso ou improvisando algum teste na hora.

Com a evolução dos jogos, o conceito passou a ser:

Vamos criar um jogo e as regras são aquilo que o seu personagem é capaz de fazer.

Então um novo movimento começou a ganhar força:

Vamos criar um jogo e as regras determinam aquilo que você pode, ou não, narrar.

Não é atoa que muitos jogos narrativos surgiram “com força”apenas após o esterco:

  • House of the Blooded — Julho de 2008.
  • FIASCO — 2009.
  • Legends of Anglerre — 2010.
  • Dungeon World — 2012.
  • Apocalipse World — 2010.
  • Dresden Filers RPG — 2010.
  • 13th age — 2013.
  • Fate Core / Fate Acelerated Edition — 2013
  • Infinidade de jogos indie de altíssima qualidade.

Sim, eu sei que o Fate começou com o sistema FUDGE em 1992 (não menospreze a minha inteligência, este texto não é uma enciclopédia sobre RPG!) , muito antes mesmo do D&D 3/3.5. Mas dentro do cenário de um jovem brasileiro que nasceu em 1986 de classe média-baixa, tudo o que eu sei sobre RPG era aquilo que chegava pela DEVIR ou mencionado na Dragão Brasil. E se eu não mencionei Tagmar ou RPGs brasileiros é porque eles não tiveram grande relevância nos conceitos de RPG. E pare de ser hipócrita, se eles fossem relevantes estariam sendo vendidos até hoje. Tormenta é exemplo de um cenário que sobreviveu mesmo em vacas magras, lembrando, cenário não é a mesma coisa que sistema.
If I wanted a world-wide impact text with all possible international references, I would have written it in English, BITCH.

Então agora vem o “denovo”. Então surgem franquias com o velho “mais do mesmo” das regras como:

  • Dragon Age RPG — 2010.
  • Numenera — 2013.
  • Sistema Um anel — 2011.

E eis que a Fênix das cinzas ressurge: D&D 5th!

Esta foto explica muitas coisas: é uma franquia rica pra cacete! Você pode lançar o sistema que você quiser, a WoTC tem dinheiro pra caralho e marketing, ela não joga no mercado para “perder”. Longe de mim dizer que o D&D 5 é ruim! O sistema ficou legal sim, pra caralho! Seu nome, popularidade, marketing, investimento fazem dele o pai do RPG e a eterna franquia do primeiro RPG!

Seja Narrativo, seja Old School, seja New School, seja LARP, seja Boardgame, MMORPG ou Ragnarok, todo mundo merece respeito! ❤ ❤ ❤

O que a história do RPG me ensinou nesta jornada mal organizada e mal escrita aqui apresentada à você, honroso leitor que chegou até o fim, é que RPG e bom senso tem tudo a ver. No final das contas tudo o que as regras sempre fizeram foi nos amparar em situações difíceis. Não existe o melhor sistema, tudo é na realidade uma farofada mais do mesmo que só fica divertida se os participantes (mestre incluso) estiverem dispostos a contar uma história legal. ❤

Sim! Com boa vontade e imaginação até uma história de 15 minutos entre dois amigos pode ser uma sessão de RPG inesquecível.

Obrigado Gary, se você não tivesse sido um doido para começar tudo isto, eu não seria um nerd estúpido digitando este texto inútil que custou algumas horas da minha vida que jamais vão voltar. Quer saber? Valeu a pena! :-D

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