A transição do professor para o facilitador.
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A s formas de ensinar e aprender ciências e outros campos correlatos mudou. Segundo o filósofo Pierre Levy, a inteligência é coletiva. É bem isso mesmo.
A Internet tem revolucionado a velocidade com que as informações são compartilhadas e geram ainda mais conhecimento. A interdisciplinaridade, ou seja, a capacidade de conectarmos, de forma profunda, diferentes áreas do ensino e da aprendizagem, é o futuro da educação.
Países como a Finlândia tem investido pesado no uso da escola como um espaço para a resolução de problemas reais de um forma integradora. As múltiplas caixas de conteúdos com horários de aulas bem definidos, e com disciplinas isoladas, serão diminuídas, ou mesmo, extintas. Vivemos na era da integração.
A própria palavra disciplina deveria ser vista com uma boa dose de criticismo. Estamos mais interessados na disciplina dos estudantes ou em uma educação transformadora que parte deles?
Os estudantes não devem somente memorizar ou replicar conteúdos. Na verdade, os estudantes precisam integrá-los, e, nesse processo, devem tornar prático, de algum modo, aquilo que estão aprendendo. Assim, os estudantes serão capazes de participar efetivamente das decisões emergentes na sociedade. Uma educação integradora produz equidade e melhorias sócio-econômicas duradouras por meio da autonomia.
No que tange tal autonomia, os estudantes precisam desenvolver habilidade múltiplas e interdisciplinares, e que não são de cunho apenas conteudista ou de memorização.
As crianças e os jovens do futuro precisam desenvolver as habilidades do século XXI. A educação do século XXI deve ser focada em cinco pilares:
Criatividade: Os estudantes devem inovar, produzir múltiplas ideias, refiná-las, e considerar as ideias de outros estudantes.
Criticismo: Os estudantes devem desenvolver suas capacidades de analisar, interpretar, avaliar, tomar decisões, e resolver problemas.
Colaboração: Os estudantes precisam trabalhar conjuntamente na co-criação de soluções, buscando atingir um objetivo mais integrativo e emergente, mantendo a flexibilidade e compartilhando as responsabilidades.
Comunicação: Os estudantes devem expressar e compartilhar informações, opiniões, e soluções, sejam elas deles mesmos ou de outras fontes, de forma clara para a sociedade.
Contextualização: Os estudantes precisam estar conectados aos contextos em que vivem, procurando soluções para os problemas reais.
Os estudantes precisam entender o porquê da aprendizagem e porque aprender é tão relevante para a efetivação das melhorias nas condições sócio-econômicas pessoais e do país.
Quem é o professor do futuro?
Um facilitador! O facilitador é responsável pela facilitação da aprendizagem dentro dos pilares das cinco habilidades do século XXI. O professor do Século XXI é um facilitador, e como tal, mediador do processo de aprendizagem e não a fonte de todo o conhecimento em si. O conhecimento é construído, e não é estático, e deve contar com as tecnologias educacionais. Os problemas não estão todos resolvidos mas a educação expositiva pode assim fazer parecer. O facilitador deve facilitar o claro entendimento dos problemas que cercam o cotidiano dos estudantes e guiar os estudantes na busca de soluções, propiciando nesse processo que os estudantes estejam no centro da aprendizagem. Os educandos precisam entender na prática que a maior responsabilidade sobre a aprendizagem deles é deles mesmos. O facilitador se compromete a ajudar os estudantes sobre o porquê da aprendizagem, com exemplos reais que demonstram claramente os impactos da educação de qualidade para todos nas nossas vidas pessoais e nas formas de relacionamento em sociedade. O facilitador vai estimular esse entendimento prático através de projetos conectados com a realidade desses mesmos estudantes. O facilitador deve crucialmente contribuir para que os estudantes conectem áreas e comuniquem seus resultados de forma criativa, colaborativa e crítica para a sociedade.
Vivemos, felizmente, em tempos onde a informação é conspícua. A era da informação na Web 2.0 com aplicativos, blogs, e redes sociais. A informação cabe na palma da mão em dispositivos móveis conectados a uma rede mundial de informação: a Internet.
A Internet é um espaço de intensa colaboração e esse processo deve ser curado e facilitado pelos educadores. Nesse ambiente, o estudante não é apenas um consumidor de ideias mas também um produtor, e esse aspecto deveria estar na base da educação nas salas de aula.
O professor não é mais o único detentor do conhecimento dentro da sala de aula e fora dela. O papel do professor de certificar-se sobre a fixação dos conteúdos pelos estudantes é obsoleto.
O facilitador não está interessado na memorização dos conteúdos dos estudantes, mas em seu uso prático na construção de novos conhecimentos e soluções.
Há muito o que ser feito nesse sentido nas escolas brasileiras. Os estudantes brasileiros tem um dos piores desempenhos internacionais na aplicação dos conhecimentos científicos, embora os estudantes das escolas públicas federais tenham um desempenho tão bom quanto os estudantes em países no topo dos índices educacionais, como a Finlândia. A desigualdade é grande no Brasil.
A responsabilidade do facilitador é encontrar novas formas de ensinar dentro desse contexto tecnológico e de grande informação para garantir maior eficiência na aprendizagem dos estudantes. O facilitador deve avaliar se os estudantes estão realmente aprendendo e desenvolvendo as habilidades cruciais para sua vida como um cidadão participativo e inovador, e não somente medindo se os estudantes sabem memorizar e reproduzir.
As reuniões de professores (facilitadores) e pais com os estudantes devem incluir a ideação e a produção de formas de avaliação das habilidades indispensáveis aos estudantes do século XXI. Essas avaliações não podem ficar limitadas ao universo das provas e simulados.
As formas de avaliação devem, preferencialmente, ser feitas por meio da execução e conclusão de projetos: Aprendizagem Baseada em Projetos. O facilitador deve buscar formas de inspirar os estudantes a seguirem o caminho do conhecimento. Os estudantes precisam aprender a estudar e o farão quando entenderem as razões que justificam esse processo. Os humanos precisam de propósito, e a educação deve ser feita com um propósito que garanta melhorias nas condições de vida dos brasileiros.
Além disso, é preciso ser criativo, e inovar com criticismo e colaboração, comunicando os andamentos das ideias e soluções para todos os segmentos do contexto escolar.
As escolas do futuro conversam em debates que incluem as vozes de todos os elementos que as compõem. As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) são grandes contribuidoras para que esses debates ocorram e sejam disseminados. É preciso que os estudantes sejam bem representados e que os segmentos escolares criem um plano de ação para a transformação da escola.
Além disso, as tecnologias educacionais de baixo custo criam condições que auxiliam os facilitadores nesse processo tão importante de transição da educação do passado para as demandas da educação do século XXI.
As tecnologias educacionais ampliam a autonomia e a experimentação dos estudantes e facilitadores, enquanto quebram os paradigmas das caixas pretas e hierarquias. Elas colocam a responsabilidade da execução dos projetos e a busca por informações para a conclusão dos mesmos nas mãos dos próprios estudantes. Uma aprendizagem criativa com a mão na massa!
As tecnologias educacionais não devem ser encaradas como um fim, mas como ferramenta de apoio na aceleração da conexão entre os professores e os estudantes. Elas servem para ampliar o engajamento dos estudantes nas atividades e projetos, e, finalmente, no desenvolvimento das habilidades do século XXI.
Por exemplo, os estudantes podem desenvolver soluções para o problemas locais. As informações coletadas podem ser postadas em um blog, aplicativo, ou website aberto para a comunidade. As atividades podem ser demonstradas para a população local em feiras ou oficinas produzidas pelos estudantes com a colaboração dos professores e pais. Na educação do século XXI, as escolas dialogam com a comunidade. A escola é o palco para o surgimento de novas soluções que atendem às demanda das comunidades que compõem e cercam a escola. Um local de pertencimento. Um local onde todos os segmentos participam de sua construção e da construção do conhecimento.
As tecnologias educacionais podem sim contribuir com que as escolas brasileiras se tornem cada vez mais instituições do século XXI.
A escola do século XXI é um local onde os estudantes se sentem bem, não estão lá por obrigação mas por entendimento sobre a importância do ambiente escolar. Esse pertencimento é também emocional. O estudante do século XXI deve entender o porquê da escola, e isso se dá por meio da construção desse espaço e de suas atividades também pelos estudantes. O professor do século XXI é um facilitador que entende a aprendizagem continua e não está preocupado com a transmissão do conhecimento mas com a avaliação correta e integrada do desenvolvimento intelectual e das habilidades dos estudantes.
A escola do século XXI é uma escola com tecnologias educacionais que permitem ampliar as vozes e as capacidades dos professores, estudantes, gestores, pais, e cidade. A escola deve ser um local de diversão com foco no desenvolvimento da inteligência coletiva.
Um ambiente democrático que temos orgulho.
Saiba +: Conector Ciência
Atualizado/editado: 11–07–2017, 9:37 (Horário de Brasília)
— — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — — Filipe Oliveira é um comunicador de ciências e consultor educacional com experiência de mais de 10 anos na elaboração, execução, e publicação de projetos científicos e educacionais nas escolas e universidades.
Formado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Mestre em Biologia Evolutiva pela Uppsala University (Suécia) e LMU-Munich (Alemanha). Desenvolveu sua tese de mestrado na Harvard University (US) e trabalhou na University of Helsinki (Finlândia) como pesquisador Nível II.
Fundou a iniciativa educacional Conector Ciência que visa ampliar a cultura de experimentação científica nas escolas e ONGs.