Projeções não-proféticas para 2018: economia e política (parte 1)

Filipe Possa Ferreira
6 min readJan 3, 2018

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Economistas e afins adoram projeções. Eu particularmente tenho uma teoria para a adoração por projeções: a insegurança. Teimamos em fazer projeções pois ao pensar que podemos prever o futuro nos sentimos mais seguros. Claro que há alguns tons de cinza nessa questão, pois quando a previsão do futuro lhe confere uma vantagem, esta pode ser usada para transformar completamente sua vida profissionalmente e, principalmente, financeiramente. No meu caso específico a previsão a seguir tem um caráter meramente intelectual e reflexivo — ou em outras palavras, ela me ajuda a entender melhor o mundo que vivo.

No Brasil, e praticamente em todos os países de matriz democrática eleitoreira, os anos de eleição são anos atípicos. Quando esses anos somam-se com a Copa do Mundo, que é um fator importante para nós, as coisas ficam ainda mais interessantes. Seja por fortuito do destino, ou quem sabe propositalmente, todo ano de Copa do Mundo desde 1994 foi ano de eleição presidencial no país. Em 1994 — FHC e Brasil campeão; 1998— FHC e Brasil vice-campeão; 2002 — Lula e Brasil campeão; 2006 — Lula e Brasil nas quartas de finais; 2010 — Dilma e Brasil nas quartas de finais; 2014 — Dilma e 7x1. Interessante.

O Brasil de 2018, o país e não a seleção de futebol, difere um pouco dos anteriores. Passamos pela mais grave crise econômica e política que se podia imaginar. A anestesia do golpe/impeachment segue fazendo seu efeito. Os desdobramentos políticos e econômicos de 2016 até os dias atuais continuam reverberando em nossa sociedade. A polarização política que foi marca em 2014 e nas manifestações de 2016 continuam, mesmo com a volta de Lula às eleições, e com Bolsonaro chegando a números impressionantes. Desses dois já temos 50% dos eleitores nas pesquisas. O primeiro até então presidenciável, pois vai depender do fatídico 24 de janeiro próximo, aglutina uma força política de parte considerável da esquerda, e da classe mais pobre do país — o que lhe conferiu um status imbatível em todas as pesquisas até hoje. O segundo, ainda uma incógnita até para ele mesmo dado que ainda não possui um partido definido, depende de seu discurso embebido no ódio e da negação de tudo da política, mesmo que ele esteja lá há quase 30 anos. Para aproximadamente 20% seu discurso ainda pega — a questão que fica é até quando ele vai pegar. Na mesma corrida ainda figuram as velhas caras em nova forma, como Alckmin, Marina Silva, Ciro Gomes e Henrique Meirelles. O último, apesar de velho conhecido, se posiciona como a candidatura mais refrescante dentre todos, principalmente com o respaldo do mercado financeiro e parte do empresariado que vê em Henrique o porto seguro econômico que tanto necessitamos. E já que é para fazer previsões, ai vamos nós.

Ao meu ver Alckmin tem a maior chance de ser o próximo Presidente da República Federativa do Brasil em 01/01/2019. A seu favor pesa a “quase” totalidade de apoio do PSDB, principalmente com a saída de João Dória Jr. do páreo. O PSDB é o 3° maior partido do país, atrás apenas de MDB e PT, e possui o controle eleitoreiro e orçamentário do maior colégio do país: a cidade e o estado de São Paulo. Por outro lado, o então governador de São Paulo não tem potência eleitoreira para vencer Lula nas urnas, o que torna sua vitória dependente da cassação do ex-presidente petista. Nesse sentido, Lula é sim o principal fiel da balança de 2018, e a decisão em torno de sua candidatura pode definir o pleito em outubro. O segundo fiel da balança é o próprio MDB, maior partido do país e seu atual governante. Sua principal virtude figura na forma de aglutinador dos partidos fisiológicos, que não são poucos. No entanto sua potência eleitoreira é baixa e sua última candidatura própria foi em 1994, com Orestes Quércia e seus exíguos 5%. Dessa forma, a decisão do MDB entre candidatura própria ou apoio pode ser fundamental, como sempre o foi.

Contudo, o caminho de Alckmin não será simples. O pré-candidato tucano ainda precisa convencer uma parte importante do eleitorado para que ele chegue ao segundo turno. Do restante 50% de eleitores há uma parte significante de indecisos, principalmente da classe média média e alta, que votaram pelo impeachment da ex-presidenta Dilma, mas que não estão convencidos que o MDB e Temer era a melhor escolha, muito pelo contrário. Estes ainda estão esperando a definição do jogo para entrar de cabeça nas eleições, e são desses que necessita Alckmin. Meirelles também briga por parte desses votos, e apesar de pouca experiência executiva, já flerta com evangélicos e com o mercado na corrida. Enquanto Alckmin ou Meirelles seria o voto de refúgio da polarização Lula x Bolsonaro, ainda pesa contra a candidatura do tucano a descoberta de corrupção em seu governo e de outros tucanos em obras em São Paulo — no entanto isso depende do alcance das delações e do poder da mídia em alimentá-la. Nesse sentido, a luta contra a corrupção também é um dos fiéis da balança. Não seria uma surpresa se Alckmin e Meirelles juntassem suas forças na corrida. PSDB e PSD são amigos de longa data e partilham de posições políticas semelhantes. Uma chapa dos dois conseguiria fazer frente à polarização Lula x Bolsonaro, contando ainda por cima com a opinião positiva de grande parte da mídia, do mercado e do empresariado (comumente tucanos). O que poderia impedir esta chapa de se concretizar, talvez seja as ambições de Meirelles à presidência, pois vice, como todos sabemos, é figurante (a não ser que conspire contra a cadeira maior). Particularmente eu acredito que Meirelles pode servir melhor como ministro do que como presidente.

Por fim, Ciro ainda divide parte da esquerda, mas seu discurso ainda é pouco cativante e alcançável. Já Marina Silva é uma incógnita, como sempre, assim como seu partido a Rede. E tanto a Rede, quanto o PSOL, mais à esquerda, sofrem da baixa representatividade política, o que se apresentará como uma baixa exposição à propaganda nas mídias em geral, reduzindo sua potência em comparação com os outros concorrentes. Marina que foi a terceira força em 2010 e 2014 corre o risco de ser apenas uma figurante em 2018, como sempre foi o PSOL. Para tanto seus objetivos devem ser outros além do Planalto.

Por fim, divide-se o pleito de 2018 ao redor de 3 grandes questões:

  • Lula e a decisão da justiça no dia 24 de janeiro. Caso seja favorável ao petista, resultado menos provável, a corrida fica mais franca, com todos contra Lula. Caso ele seja impedido de alguma forma, ele tem potência para catapultar um nome para o segundo turno, onde correm por fora nomes ptistas como o de Fernando Haddad e Jaques Wagner. E uma ampla frente de esquerda está descartada, acredito.
  • A potência de incógnitas como Bolsonaro e Meirelles. No caso do primeiro, este depende de suas futuras coligações, e a adequação de seus discursos e plano de governo aos anseios do eleitorado que ele ainda não tem e precisa. Para vencer, ele necessita conquistar uma parte significativa do país, e sua maior chance reside no voto de negação do outro dada a polarização atual. Já Meirelles teria suas chances aumentada a depender de suas decisões partidárias em 2018. Hoje o atual ministro da fazenda pertence ao PSD, partido criado por Kassab e outros como uma dissidência do DEM (ex-PFL), e que figura como uma espécie de PSDB mais ao centro, daí a tese de coligação entre os dois. O PSD possui uma representação considerável na política do país, e algumas coligações poderiam levá-lo a ser uma ameaça real. Meirelles ainda depende de outras candidaturas para se posicionar mais à frente na corrida presidencial.
  • E, por fim, Alckmin e o PSDB. Apesar de já ter garantido a corrida presidencial dentro do próprio partido, algumas questões precisam ser fechadas. A principal dela é o desembarque total do atual governo Temer, na qual seus 6% de aprovação risca manchar todos os seus atuais apoiadores. Isto vale para Meirelles também, apesar das tentativas de passarem uma noção de que política e economia estão separados, quanta ingenuidade (ou não). Os escândalos de corrupção paulistas e paulistanos também é um grande risco, podendo ser acentuado ou atenuado pela ação da mídia.

Por essas e outras que projeções não são fáceis. Ainda há diversas variantes no jogo eleitoreiro, sem contar que o imponderável sempre surge para bagunçar ainda mais esse meio. Nos resta apenas acompanhar os desdobramentos ao longo do ano, lembrando que temos Copa do Mundo em Junho, e que o calendário eleitoral foi reduzido de 90 dias, para 45 dias.

Quanto à economia para 2018, apesar de guardar estrita relação com a corrida presidencial, tratarei dela em um próximo texto.

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Filipe Possa Ferreira

Administrador, Mestre, Doutorando em Economia e Professor. Escrevo e publico sobre finanças, capitalismo, mercado, política e ciclismo (bem menos que gostaria).