entre dimensões, o teatro tedioso
Ingénue,
Sutilmente lívida,
Sintética, recém nascida.
Estou minúscula dentro do ovo.
Fragilizada, inerte, aflita e paralisada.
Alguém vai ter que abrir por fora e me arrancar.
Nada muito grosseiro, como um machado, senão morro.
Mãos rompendo delicadamente, assegurando-me que sairei viva.
Estou sufocando, revirando-me e repartindo-me; reconstituindo de novo.
Mas ainda não é hora! Os milênios à procura da liberdade devem esperar, ennui.
Cochichando, bem baixinho, comigo mesma “toska toska toska”.
Como se pudesse alcançar os espinhos presos à carne, soltar.
Assim, enquanto nada acontece, perduro nessa dor vã;
Pulsando em vidas que mal compreendo,
Como a irrealidade me alcança;
Suando frio diante do viver.
Insatisfeita, atroz.
Soturna.
Há flores inocentes que vivem dentro de mim desde o meu nascimento. Flor de Ameixa Branca. Chegam à garganta; ânsia de vômito doce e quente. O chão é imundo, instável. Sento-me no tapete de crochê e choro as lágrimas de orvalho, suor adocicado cintilante. Tudo é arrebatador, hesito em olhar, tamanha sensibilidade limitante. As olheiras, poços profundos de angústia petrificada, derretendo. Silêncio silêncio silêncio, apenas o chacoalhar das folhas nas árvores. Aproveitar as horas antes da morte, começo do êxtase. A adaga ficou presa no ventre quando, num impulso desinteressado, a pus a descansar lá (como é que posso me dar ao luxo de sentir, em um momento assim?). Sutil, sutil; todos os ossos quebrando, liquidificando, evaporando; solidificando em palavras, formas, movimentos (todos esses hesitantes, fora do ritmo, frenéticos). Preciso saborear meu próprio coração, antes que o mundo o engula. Há pouco tempo restando, até que o patético espetáculo da preexistência acabe. Antes de tudo, tédio amaríneo, acre-doce reminiscência prematura e miríades de sonhos já sepultados.