Catalunha silenciada

Gi L.
5 min readSep 21, 2017

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Faltando menos de duas semanas para o referendo de independência da Catalunha, agravam-se os ataques à democracia e às liberdades de expressão e imprensa

O Estado espanhol intensifica a sua ofensiva para impedir o referendo independentista na Catalunha — aprovado pelo Parlamento catalão e suspenso pelo Tribunal Constitucional espanhol, que acontece no dia 1º de outubro.

Inspeções policiais, visita da Guarda Civil espanhola a diversas redações para comunicar a proibição de veicular anúncios relacionados ao Referendo, fechamento de webs — incluindo a página oficial do referendo — advertência a diretores de meios de comunicação e proibição de atos públicos são alguns dos casos de limitação da liberdade de expressão e imprensa que vêm aumentando conforme se aproxima a data da votação.

No dia 9 de setembro, o semanário El Vallenc comunicou que agentes armados da Guarda Civil espanhola haviam inspecionado a redação do jornal durante mais de 5 horas em busca provas relacionadas à impressão de materiais relacionados ao referendo. O jornal qualificou a vistoria policial como “uma fiscalização sem precendentes”. A inspeção ocorreu no mesmo dia em que a Guarda Civil começou as vistorias nas gráficas para recolher quaisquer materiais que fizessem publicidade ao referendo.

A Guarda Civil também entrou na redação do jornal NacióDigital para entregar a interlocutória do Tribunal Superior de Justiça da Catalunha (TSJC). O diretor do canal de televisão TV3, Vicent Sanchis, também foi notificado.Os agentes militares também estiveram nas redações do El Punt Avui, Vilaweb, El Nacional, Racó Català. Os policiais inspecionaram os meios de comunicação que publicaram publicidade institucional do referendo e que receberam a notificação do TSJC. Todas as notificações se devem a que o referendo é considerado ilegal depois que que o Tribunal Constitucional espanhol o suspendeu.

Uma semana depois, no dia 15, a entidade Òmnium Cultural denunciou que os Correos não haviam feito a distribuição da edição de setembro de sua revista que trazia na capa a palavra “Democracia”, cujo tema deste mês era o Dia Nacional da Catalunha, celebrado no dia 11 de setembro. O presidente da entidade, Jordi Cuixart, assegurou que a entidade não dará nenhum passo atrás na defesa da democracia. “Podem confiscar a nossa revista, mas não a vontade de 70.000 sócios de uma entidade com mais de 50 anos de história que resistiu ao franquismo”, comunicou na página web da associação.

Capa da publicação da Òmnium Cultural de setembro

Poucos dias depois, a publicação Poble LLiure também denunciou que a empresa estatal de entregas havia bloqueado o envio da sua revista devido a “conteúdos relacionados ao referendo”.

Segundo uma circular interna, a direção dos Correos teria informado que, em cumprimento da lei, os funcionários deste serviço de entrega devem abster-se de tramitar qualquer tipo de envio relacionado com o referendo de independência. A empresa estatal de entregas é fundamental para o emissão de materiais relacionado a votação de outubro, como por exemplo de material publicitário, informativos e cédulas de votação.

Circular que informa sobre a proibição de envios relacionados ao Referendo

No dia 16, um redator do jornal Nació Digital teve o celular apreendido à força por policiais da cidade de Sitges — município catalão a 40 km da cidade de Barcelona — quando cobria um ato do Referendo. Os policiais obrigaram-no a se identificar e a deixar de gravar o evento.

Ordem de suspensão da página web do Referendo

Além das inspeções aos meios de comunicação, a justiça espanhola também impede a publicidade do referendo na internet. Uma ordem judicial emitida no dia 15 de setembro ordenou aos operadores de telecomunicações a inabilitação de acesso aos domínios utilizados para divulgar o referendo, incluindo a página web oficial. Imediatamente, o presidente do Governo catalão, Carles Puigdemont, anunciou que o sitio voltaria a funcionar em outro domínio. Pouco tempo depois, a nova página saiu do ar. A cada novo domínio criado pelo Governo catalão a Guarda Civil se apressava para fechá-los. Surgiram, então, domínios alternativos como www.referendum.party ou www.referendum.ninja que permanecem ativos

Mensagem encontrada na página web oficial do referendo

Diante dos bloqueios, o Governo catalão criou a conta no twitter @ref1oct, que também segue ativa e se dedica a informar como burlar os bloqueios para acessar às páginas do referendo.

Imagem da livraria vaporvell llibres

Mapa da censura

Uma iniciativa do Observatori Mèdia.cat mapeia os casos relacionados às limitações à liberdade de expressão. O mapa da censura visibiliza os casos de censura, agressões a jornalistas ou meios de comunicação e restrições a expressões artísticas ou acadêmicas na Catalunha e em outras regiões da Espanha. Os casos relacionados às restrições relacionados ao referendo de outubro foram destacados no mapa com uma estrela. Dos dias 9 a 15 de setembro, foram incorporados ao mapa 17 novos casos relacionados com a votação do dia 1º de outubro e, no total, já são mais de 50 casos notificados até hoje.

O Colégio de Jornalistas da Catalunha denuncia a dificuldade de exercer o jornalismo na atual situação jurídico-política que vive a região, já que “os últimos acontecimentos limitam ou condicionam a missão principal dos meios de comunicação: informar com plena liberdade e sem coações”. A associação também acrescenta a liberdade de imprensa “ é o principio básico de qualquer sociedade democrática e que não pode ser afetado pelos acontecimentos políticos e sociais do país”.

Manifesto a favor da liberdade de imprensa

“Pela liberdade de imprensa e por todas as liberdades”

Manifesto elaborado em defesa da liberdade de impresa e todas as liberdades já conta, até o dia de hoje, com mais de 2.000 assinaturas de jornalistas, entidades, organizações. A iniciativa foi criada pelo Grupo de Jornalistas Ramon Barnils junto com diversas associações e sindicatos de comunicação, jornalismo e publicidade.

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Gi L.

UX Writer, minimalista digital y consultora de comunicación empática y escucha activa. Amante de las historias y los paseos para tomar café.