No meio do caminho tinha uma mensagem

Gregório
3 min readApr 17, 2020

Ainda no colégio, nas aulas de português, somos apresentados às etapas da comunicação: mensagem, emissor, receptor, canal, código… Já no estudo da Teoria da Comunicação, disciplina obrigatória em faculdades de jornalismo, publicidade ou cinema, lemos autores que debatem os possíveis ruídos neste caminho. Breve resumo: eu falei, você não entendeu. Alguns autores defendem que a culpa é minha (emissor), outros que a responsabilidade é sua (receptor). Há quem fique no meio do caminho, sempre.

Como este texto não se pretende um trabalho científico para a academia, trata-se apenas de uma reflexão em primeira pessoa, reservo-me o direito de não citar um a um, assim como não tenho a pretensão de colocar um ponto final na discussão. Apenas a título de honestidade, quero dizer que até então me encontrava no primeiro grupo, dos que atribuem ao emissor toda e qualquer responsabilidade pela compreensão da mensagem enviada.

No entanto, com o tempo livre surgido durante o isolamento social imposto pela Covid-19, comecei a me deparar com certos questionamentos com relação a esta convicção. Alguns exemplos recentes me tiraram da zona de conforto que é ter certeza sobre algo. Vamos a eles.

Durante a quarentena, junto aos amigos próximos, retomei um vício curto da adolescência. Um jogo específico de computador no qual eu nunca fui muito bom, mas certamente já fui melhor do que agora. No grupo que se animou com esta empreitada juvenil há um expert no assunto, craque mesmo. Frequentemente, ele me dá instruções como “avança” ou “recua”, por exemplo. Claro que sei o que significam estas palavras, mas me vi perdido com relação a estes comandos. Não compreendê-los começou a me deixar inquieto.

Ainda nas ações para mitigar a quarentena, me peguei fazendo uma aula de yoga. Digo de antemão que adorei a experiência e pretendo segui-la, mas uma orientação básica até para os iniciantes me chamou atenção de novo para falta de compreensão de uma instrução: “mantenha a coluna ereta” dizia a professora. Mais uma vez, é óbvio que entendo essas palavras, mas aparentemente o meu corpo, não! Na verdade, já havia me deparado com esta dificuldade nas raras vezes em que tentei fazer musculação na vida. Se não fosse o instrutor me corrigir, a lombar já tinha ido para o espaço.

Estendo aqui a reflexão para algo que envolve minha atividade profissional. Trabalho com futebol e nos mais de 10 anos nessa área tive a oportunidade de conviver com técnicos das mais variadas escolas e estilos. Falo com propriedade que muitas das informações passadas para jogadores, jornalistas, torcedores ou mesmo auxiliares não são compreendidas. Tentar precisar o quanto seria leviano, mas entre os atuais “terço final”, “primeiro quadrante” ou os antigos “fazer o facão” e “pegar de chapa”, muita gente já correu errado, criticou sem sentido ou simplesmente ficou “a ver navios” (acho que essa dá pra entender).

Ainda no esporte, mas de volta aos exemplos pessoais, me recordo dos tempos de dedicação ao tênis na adolescência. Meu técnico entendia muito do riscado, jogava demais. Na hora de retransmitir a sabedoria, por vezes eu ficava perdido. Dentre vários exemplos, vou ficar com o que mais me marcou. Aliás, volta e meia ainda repito o tal bordão, seja sozinho ou então com os colegas da época. “Não draiva, porra”, dizia ele sempre que eu estendia demais o movimento ao realizar um voleio. Levei um tempo para entender que “draiva” era um aportuguesamento da palavra inglesa “drive”. Não sei se teria ganho mais jogos, provavelmente não.

Toda essa digressão é apenas para dizer que não tenho mais um certeza sobre o tema. O que consegui concluir é que em tempos de isolamento social, é melhor buscar a proatividade para entender as mensagens que são recebidas. Não tem instrutor para corrigir, o amigo não tem paciência para explicar, há o Google para ajudar e também um velho ditado popular: “perguntar não ofende”.

Portanto, sem ofender ou não compreender, gostou?

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