Gustavo Luzeti
3 min readFeb 28, 2020

A Personalidade de Michael Scott

The Office, uma das melhores e mais premiadas séries de comédia de todos os tempos, além de tudo, nos trouxe Michael Scott ​(Steve Carell)​, uma figura que a princípio pode ser considerada caricata, mas que guarda consigo uma profunda obscuridade, sem deixar de ser hilário.

Michael pode ser descrito como um personagem que enxerga apenas os seus próprios méritos, sempre pensando em benefícios que sejam bons para si, tão somente. Acredita ser o fio condutor de qualquer ambiente que esteja inserido, seja qual for a situação que julgue minimamente importante, deverás passar ou ter sua supervisão. Tudo, em absoluto, gira em torno de Michael Scott. Além disso, não mede esforços em se comportar de forma antiética para conseguir o que julga ser relevante, para ele, o importante mesmo é se sair bem, ou ao menos parecer. Ignorante por definição, nunca deixa de expor sua visão turva do mundo. Rodeado de clichês baratos e sem qualquer fundamento, se acha o dono da verdade absoluta, um guardião da sabedoria e dos bons costumes.

Mas o que impressiona no personagem é sua surpreendente complexidade. Veja, devido a sua baixa formação cultural e notável imaturidade, mostra-se frequentemente como um indivíduo ingênuo, com certas doses de purismo, sempre dando — ou querendo — a entender que de fato crê naquilo que faz. Quem sabe também por isso, não possua amigos, familiares ou qualquer relação honestamente próxima, seu anseio por atenção e status logo o coloca como uma figura indigesta e de difícil convívio, não estar próximo a Michael Scott é, no mínimo, um alívio. Sempre reagindo à espera de algum reforço, se apegando a qualquer coisa que transmita, minimamente, alguma positividade oriunda de suas atitudes. A priori, poderia ser descrito como uma visível crítica a um nicho da sociedade americana de sua época, ainda que veladamente.

Nos colocamos como Jim ou Pam, mas na verdade estamos a poucos passos de nos tornarmos um Michael

Não devemos deixar de salientar e reverenciar o trabalho de Steve Carell frente ao papel, sua dedicação fica evidente para quem assiste a série com atenção, o ator não mede esforços em entregar um personagem cheio de nuances, sem perder a excentricidade e demais características importantíssimas para o andamento de uma sitcom. O trabalho de uma vida se reflete em uma construção histórica, nível Walter White, Tony Soprano, Don Draper, etc. (Talvez eu esteja exagerando, ou não)

Por fim, Michael Scott é um reflexo de quase tudo que já pudemos presenciar em um ambiente social/profissional tóxico. Egoísta, centralizador, imaturo e preconceituoso, são algumas de suas características mais latentes. Porém, ao mesmo tempo, por algum momento, conseguimos gerar empatia por Michael, como se pudéssemos nos posicionar próximos a todas aquelas situações constrangedoras. Michael Scott é um homem triste e, acima de tudo, sem bases culturais, sociais e morais, tornando-se um paralelo terrivelmente bem feito a nossa realidade, com uma dose a mais de exagero.

Vivemos em um ambiente onde acreditamos possuir uma resposta para tudo, como verdadeiros paladinos da justiça, detentores da mais perfeita sabedoria, oniscientes por definição. Nosso oposto é visto como um ser menor, somos o Super-Homem que Nietzsche uma vez descreveu, ou pelo menos achamos isso. Podemos estar muito mais próximos de sermos um Michael Scott do que imaginamos.

Observação: Texto escrito e publicado pela primeira vez em 2018, em um falecido blog. Realoquei esse humilde e curto artigo por acreditar ser um bom modo de iniciar meu projeto dentro desta plataforma.

Gustavo Luzeti

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