Um Plano para levar o Brasil de volta ao Trabalho

Hélio Costa Junior
8 min readMar 24, 2020

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Este artigo foi citado pelo Dr. Ítalo Marsili, através de transmissão ao vivo no Instagram, nos dias 22 e 23 de março. Reúne opiniões dos principais epidemiologistas dos Estados Unidos.

Foi escrito por Thomas L. Friedman, publicado no New York Times.
Título Original: A Plan to Get America Back to Work.


Um Plano para levar a América de volta ao Trabalho.

Alguns especialistas dizem que pode ser feito em semanas, não meses — e que a economia e saúde pública correm disco.

Nestes dias cada líder é testado —prefeitos, governadores e presidentes. Cada qual forçado a tomar grandes decisões de vida ou morte, com neblina por todo lado, informações imprecisas, e o mundo berrando contra eles.

Meu coração se compadece. Sei pelo que passam. Mas enquanto empresas fecham as portas e dispensam funcionários, especialistas começam a perguntar: "Pera aí! Que raios estamos fazendo? Contra nossa economia? Contra a próxima geração?

Será a cura — mesmo que por curto período — pior do que a doença?

Compartilho destas questões. Nosso líderes não voam no breu completo: estão seguindo conselhos de epidemiologistas, especialistas respeitáveis.

Mesmo assim precisamos cuidar sobre o "pensamento de grupo", necessário, porém reação perigosa frente a uma crise nacional e global. Nossas decisões afetam todo o país e a economia — então, pequenos erros de navegação têm consequências enormes.

Não há dúvida, este vírus afeta muitos americanos de uma só vez, precisamos de mais camas hospitalares, equipamentos de proteção para enfermeiros e médicos que cuidam dos infectados. Isto é urgente! E devemos corrigir o fracasso em fornecer testes rápidos para o vírus. É urgente!

Precisamos questionar também — tão urgente quanto — como podemos diminuir cirurgicamente a ameaça do vírus aos mais vulneráveis, enquanto maximizamos as chances de levar o maior número de americanos de volta ao trabalho, em segurança, e o mais rápido possível.

Conversei com um especialista e ele disse que pode ser feito em poucas semanas — se pararmos por um momento e pensar melhor sobre o vírus.

Se minha caixa de mensagens representa algum indício, uma reação ponderada é a estratégia que o país precisa. E tropeços acontecem quando o presidente trata o coronavírus como uma farsa, para dois dias depois declarar situação de guerra.

Especialistas em saúde querem encontrar equilíbrio para as questões médicas, econômicas e morais que nos afetam ao mesmo tempo.

Dr. John P.A. Ioannidis, epidemiologista e co-diretor do Stanford's Meta-Research Inovvation Center, falou sobre um ensaio publicado pelo site statnews.com, em 17 de março. Nele, se vê que ainda não temos certeza sólida da taxa de mortalidade do coronavírus. Análises de algumas das melhores evidências disponíveis atualmente indicam que pode ser de 1%, ou menor.

"Se este dado é verdadeiro", diz Ioannidis, "colocar o mundo em quarentena, causando tremendas consequências sociais e financeiras, pode ser completamente irracional. É como um elefante que, atacado por um gato, frustra-se, e tentando fugir do bichano, aproxima-se e despenca de um penhasco. Morre acidentalmente."

Dr. Steven Woolf, diretor emérito do Center on Society and Health da Virginia Commonwealth University, compartilhou ideias que ele está trabalhando num ensaio: "A resposta da sociedade ao Covid-19, como fechar comércios e isolar comunidades, pode ser necessária para contornar o contágio comunitário, mas pode prejudicar a saúde de outras maneiras, custando vidas. Imagine um paciente com dor no peito, infartando. A velocidade é essencial para salvar a vida. Ele hesita em ligar ao 911 por medo de pegar coronavírus. Ou um paciente com câncer tendo que lidar com atrasos na quimioterapia pois a clínica está fechada. Ou o paciente com enfisema adiantado que morre por falta de ventiladores".

E imagine o estresse, as doenças psicológicas que virão —e elas já chegaram — por desligarmos a economia, causando demissões em massa.

"A renda é um dos preditores mais confiáveis em estudos de saúde — e expectativa de vida", disse Woolf.

"A perda do salário e demissões deixarão muitos trabalhadores sem seguro de vida, forçando famílias a abandonar convênios e medicações para pagar comida, aluguel e outras necessidades básicas. Pessoas negras e pobres serão as mais afetadas, e as últimas a serem assistidas. São as faxineiras de hotéis fechados e famílias sem meios de locomoção. Trabalhadores de baixa renda que, poupando dinheiro, chegam à mercearia e veem prateleiras vazias, deixam para trás comerciantes apavorados com a falta de dinheiro."

Há outra via?

Uma das melhores ideias que ouvi até agora, veio do Dr. David L. Katz, diretor-fundador do Yale University's C.D.C-funded Yale-Griffin Prevention Research Center, especialista em saúde pública e medicina preventiva.

Um artigo do Dr. Katz, no The Times, me chamou atenção.

Ele argumenta que agora temos três objetivos: salvar o máximo de vidas, garantir que o Sistema de Saúde não sobrecarregue — mas também asseverar que no processo para atingir os dois primeiros objetivos não tenhamos que sacrificar a economia, e por consequência, perder muitas outras vidas.

Por estas razões, ele diz, precisamos mudar da estratégia de "quarenta horizontal", — onde restringimos o movimento e comércio de toda população, sem considerar os riscos de severa infecção — para uma mais cirúrgica, a estratégia quarentena vertical".

Uma abordagem vertical focaria em proteger os que têm mais chances de morrer ou sofrer danos no longo prazo pela exposição à infecção do vírus — isto é, os mais velhos, pessoas com doenças crônicas e sistema imunológico comprometido — enquanto é dado tratamento básico ao restante da sociedade do jeito que sempre foi feito em relação à gripes. Isto significa que pediríamos cuidado e respeito aos que tossem ou espirram, que lavem suas mãos regularmente e, sentido-se doentes, que fiquem em casa e superem a gripe — ou procurem atenção médica caso não se recuperem.

Isto pela razão de que, como qualquer gripe, a maioria será contaminada. Mas um pequeno número precisará de internação hospitalar e uma porcentagem ainda menor, dos vulneráveis, tragicamente, irá morrer. (Dito isto, o coronavírus é mais perigoso do que a gripe típica que conhecemos.)

Como Katz argumenta, governadores e prefeitos, ao escolher a abordagem horizontal, estão basicamente mandando todos ficarem em casa por tempo indeterminado, isto pode causar mais danos aos vulneráveis.

"Conforme trabalhadores são dispensados, e colégios fecham dormitórios, mandando estudantes para casa," diz Katz, "jovens em estado de infecção indeterminado vão para casa e ficam no mesmo ambiente que suas famílias. E pela falta de testes, eles podem carregar o vírus e transmiti-lo a seus pais e avós com mais de 50, 70 ou 80 anos."

"O.K.," eu disse, conversando com Katz ao telefone após ler o artigo, "mas estamos como estamos agora. Muitos Estados e cidades comprometeram-se em alguma medida com o afastamento social horizontal, ordenaram a todos que fiquem em casa. Então, podemos fazer limonada deste limão — e não destruir a economia?

"Não vejo porque não deveríamos, ele responde. "Agora que fechamos quase tudo, podemos mudar para um estratégia mais direcionada. Até mesmo aproveitar o estado deste esforço horizontal e aproveita-lo em nosso benefício, mudando-o para a quarentena vertical.

Como?

"Use a estratégia de quarentena por duas semanas," disse Katz. Diga a todos para ficarem em casa por duas semanas, e não indefinidamente. (Insto inclui todos os estudantes irresponsáveis fazendo malas e indo para praia.) Se você está infectado com coronavírus, ele se apresentará dentro de um quadro de incubação de duas semanas.

"Quem tiver sintomas de infecção devem se isolar por conta própria — com ou sem teste, o que é exatamente o que fazemos quando estamos gripados," disse Katz. "Os que não estiverem, e pertencem ao grupo de baixo risco, devem voltar ao trabalho ou escola após do período de duas semanas".

Assim iríamos "resetar" nossa sociedade em duas ou mais semanas a partir de agora. "O rejuvenescimento afeta o espírito, e a economia, sabendo onde está a luz ao fim do túnel, não cometeria exageros, é difícil estimar. O risco não está em zero, mas o risco de algo ruim acontecer nunca é zero."

Enquanto isso, deveríamos dar o melhor em restringir contato com idosos, pessoas com doenças crônicas, imunologicamente comprometidas, a quem o coronavírus apresenta mais risco. E "poderíamos estabelecer subgrupos de profissionais de saúde, testados negativamente para o coronavírus, para atender preferencialmente aos que têm maior risco", Katz adicionou.

Assim, "os mais vulneráveis estarão protegidos até que a infecção corra seu curso— e uma pequena fração dos de risco baixo que desenvolvessem a infecção grave, ainda assim receberiam assistência médica especializada de um sistema não sobrecarregado. … Não estamos contando com contágio zero em nenhum cenário. Estamos contando com a minimização de casos graves, protegendo os mais vulneráveis da contaminação, seja por quem têm sintomas ou não".

É por isto que devemos usar este período de duas semanas (ou mais, se o C.D.C assim preferir), é um período de transição para estabelecer pela análise de dados o melhor critério para diferenciar os especialmente vulneráveis do restante. Por instância, algumas pessoas mais novas foram mortas pelo vírus. Precisamos entender melhor a razão. Há dados, afirma Katz, sugerindo que muitas delas tinham outras doenças crônicas graves, mas para afirmar é preciso de mais dados e análises. Quem exatamente está em alto risco deve se basear nos dados mais atuais e atualizados rotineiramente pelas autoridades de saúde pública.

Por esta razão, pressionar o Governo Federal a expandir a disponibilidade de testes rápidos é importante.

Katz criou um modelo para a estratégia de "duas semanas mais quarentena dos vulneráveis" e para pensar sobre a estratificação do risco do vírus, e diferentes respostas, está no site dele.

A abordagem é sóbria e esperançosa. Ele basicamente argumenta que neste estado não há meio de evitar o fato de que muitos, muitos americanos, serão infectados pelo vírus, se já não foram. O barco já está navegando.

"Perdemos a oportunidade de confinamento de toda população.", ele disse, "então devemos usar estratégias oportunas: deixar que pegue o vírus quem poderá se recuperar, e que volte ao trabalho o quanto antes. Enquanto isso, protegeremos os mais vulneráveis".

Durante este tempo, gostaríamos de ter equipamentos de teste e termômetros móveis — como os da China e da Coreia — para identificar quem não está cumprindo com o isolamento de 14 dias, ou por qualquer outra razão permanece ou ficou infectado. Confirmaríamos também que uma vez recuperado do Covid-19, você estará imune de pega-lo de novo ou espalha-lo por certo período de tempo. Muitos especialistas acreditam ser verdade, diz Katz, mas há relatos de reinfecção, a questão ainda não foi resolvida.

Confirmar que os indivíduos estão recuperados, realmente imunes e incapazes de transmitir o vírus, é elemento crucial para proteger nossos entes queridos mais vulneráveis a infecções graves", disse Katz.

Uma vez que as taxas de transmissão estejam perto de zero, e a imunidade do rebanho restabelecida, concluiu Katz, podemos pensar sobre dar "sinal verde" aos mais vulneráveis. Isto pode levar meses. O plano de Katz oferece à população expectativa de voltar à normalidade em poucas semanas, ao invés de quarentena por meses.

E o tempo todo, é claro, deve haver trabalho rápido em tratamentos e vacinas eficazes. Eles devem ser implantados — globalmente — o mais rápido possível.

Não sou especialista médico. Apenas repórter — que teme por seus entes queridos, vizinhos e pessoas de todos os lugares, de todo o mundo.

Compartilho estas ideias não porque elas são a cura mágica, ou que todas as variáveis foram analisadas. Compartilho porque tenho certeza de que precisamos de menos mentalidade de rebanho, e mais imunidade de rebanho — ao nos aproximarmos da escolha infernal:

Permitir que muitos peguem o vírus, se recuperem e voltem ao trabalho — enquanto os mais vulneráveis são protegidos. Ou desligamos tudo por meses para tentar salvar a todos deste vírus —independentemente do perfil de risco — e matar muitas pessoas por outros meios, matar nossa economia e talvez nosso futuro.

Traduzido por Hélio F. Costa Jr.
Fonte: https://www.nytimes.com/2020/03/22/opinion/coronavirus-economy.html

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