Garoppolo e Shanahan: vai dar match?

Henrique Bulio
6 min readNov 2, 2017

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É difícil se acostumar totalmente com a ideia de que a troca realizada por Jimmy Garoppolo na segunda-feira à noite foi realizada pelo San Francisco 49ers e não pelo Cleveland Browns. Primeiro porque sabe-se que a franquia de Ohio buscou trocar pelo quarterback em avanço do último Draft e, com toda munição disponível em formas de picks, foi surpreendente não ver a troca se consumar. Segundo porque havia a expectativa de Kirk Cousins sendo o líder dos 49ers em 2018 dada a conexão Cousins-Shanahan datada do início da carreira do atual quarterback do Washington Redskins.

O próprio Garoppolo, aliás, é um caso interessantíssimo. Escolhido na segunda rodada do Draft de 2014 pelo New England Patriots, havia o consenso geral de que o jogador seria o substituto ideal para Tom Brady quando este se aposentasse — sentimento este endossado, inclusive, por Bill Belichick, que declarou após a troca que o Patriots teve a melhor situação de quarterbacks em toda a liga nos últimos dois anos e meio. Com o maior da história na titularidade e um reserva que impressionou quando em campo, é difícil discordar dessa afirmação.

De toda forma, o futuro chegou. Garoppolo se encontra no fim de seu contrato de calouro e o Patriots não podia dar-lhe o tempo de jogo desejado — nem mesmo sendo pago como um quarterback titular, como o MMQB reportou que foi-lhe oferecido por New England durante a inter temporada. Essa era a última oportunidade da equipe de Foxboro obter alguma compensação alta pelo jogador, e é extremamente provável que San Francisco se utilize de seu imenso espaço disponível no salary cap para renovar contrato com o jogador muito antes do período de free agency. Na pior das hipóteses, o 49ers deve mantê-lo no elenco por meio da franchise tag.

O que se sabe sobre Garoppolo, o jogador?

Em 2014, eu começava a me interessar por quarterbacks e, por diversão, escrevi scouting reports sobre os nomes mais interessantes da posição para aquela classe. Garoppolo, em resumo:

“Um quick release de impressionar, assim como seu altíssimo Football IQ […] bastante preciso em passes intermediários, ainda que tenha seus problemas em passes longos; footwork inconsistente, mecânicas inconsistentes quando pressionado […] lembra Drew Brees passando a bola, com boa antecipação. Deve se encaixar na maioria dos ataques, mas seria ideal ir para um time no qual pode-se desenvolver como backup“

A bem da verdade, minha expectativa da época era de que o jogador fosse parar em New Orleans — Sean Payton, treinador da equipe, também foi quarterback por Eastern Illinois; além disso, Drew Brees já não era o mais jovem dos jogadores em 2014. Quatro escolhas antes do Patriots selecioná-lo com a pick 62, o Saints preferiu escolher Stanley Jean-Baptiste para reforçar a secundária.

Nos três anos com o New England Patriots, Garoppolo recebeu meaningful snaps durante um jogo e meio: @ Arizona (24/33, 264 jardas, TD) e vs Miami (18/26, 232 jardas, 3 touchdowns), quando Brady esteve suspenso pelo Deflategate em 2016. Não é preciso dizer que as estatísticas impressionam, enquanto que o film mostra exatamente o que se esperava de Garoppolo vindo à liga: o potencial é notável, mas existe sua quantidade de inconsistência: aqui, por exemplo, o quarterback erra um fácil touchdown para Matthew Slater no jogo contra o Dolphins, onde seu recebedor corria uma rota post e tinha imensa separação em relação ao cornerback.

O drive terminaria em touchdown, btw. Algum tempo depois, veríamos o fim do jogo para Jimmy, que sairia machucado da partida; Jacoby Brissett seria o titular nos dois últimos jogos sem o titular Brady.

No tempo em que se viu Garoppolo em real action, ficou claro o quanto ele pode funcionar num ataque balanceado, e isso é justamente o que ele terá no 49ers de Kyle Shanahan. O treinador de San Francisco emprega um sistema ofensivo recheado de stack formations e zone concepts, utilizando bastante os running backs no jogo aéreo em rotas variadas e não só no flat. Qual o primeiro time que lhe vêm à cabeça quando o assunto é utilizar seus corredores em jogadas de passe? Muito provavelmente o próprio New England. O ataque do 49ers também emprega bastante jogadas com motions e com foco na zona intermediária, aonde Garoppolo é bastante preciso. Por fim, o sistema ofensivo de Shanahan na maioria das vezes opera em single reads, o que facilita ainda mais o trabalho de um quarterback.

Shanahan/Garoppolo é um match com grandes chances de dar certo.

O que se sabe sobre os backups de New England?

De todos os jogadores que foram reservas de Brady durante a carreira, dois se destacam: Matt Cassel e Brian Hoyer. Os dois tiveram anos no sistema de Belichick e depois foram titulares em vários jogos por diferentes franquias. Saindo de Massachussets, contudo, o resumé dos mesmos não é de impressionar.

Matt Cassel: teve uma temporada completa como titular em New England pela lesão de Tom Brady que o fez perder toda a temporada de 2008. Foi 11–5 como titular, mas o Patriots incrivelmente não se classificou aos playoffs. Depois disso, foi trocado para o Kansas City Chiefs, liderando a equipe ao título da AFC West no ano seguinte. Nas temporadas seguintes, suas atuações despencaram de nível e Cassel tem perambulado como reserva por diversas equipes da liga.

Brian Hoyer: Draftado pelo Patriots em 2009, nunca teve qualquer chance de ser titular até 2013, quando jogou bem por Cleveland em dois jogos e rompeu o ligamento cruzado anterior no terceiro, encerrado prematuramente sua boa temporada. Também passou por vários times saindo de Boston, recebendo um número notável de chances como titular.

Em 2017, Hoyer assinou com o 49ers e foi apontado como o titular da equipe para o início da temporada. Seu péssimo desempenho não apenas o tirou de tal condição como, quando San Francisco consumou a troca, Hoyer foi o jogador dispensado para abrir espaço para Garoppolo no elenco.

Brian Hoyer assinou ontem um contrato de três anos com o New England Patriots. ¯\_(ツ)_/¯

O que se sabe sobre os termos da troca?

New England conseguiu uma escolha de segunda rodada por um jogador bastante cobiçado por diversos times em necessidade de um quarterback em toda a liga. O Patriots sabia que não conseguiria manter o jogador como reserva nem mesmo se pagasse-o como um titular, e o contrato de Jimmy estava perto do fim. Talvez não seja a compensação esperada por Belichick, mas a janela estava se fechando completamente.

San Francisco é quem realmente bateu um home run na troca. Primeiro porque o time está munido de um altíssimo espaço disponível no salary cap e pode oferecer um grande contrato ao jogador além da titularidade. Gastando apenas uma escolha de segunda rodada, o 49ers tem agora seu quarterback do futuro e não terá de gastar sua escolha de primeira rodada do ano que vem (que, muito provavelmente, estará dentre as três primeiras) na posição, podendo escolher um jogador que supra uma necessidade em outro setor — reporta-se que o front office em Santa Clara não se impressionou muito com a a atual classe de signal callers. Além disso, se o experimento falhar, o preço terá sido irrisório.

Dizer que o Patriots saiu perdendo na troca não é exatamente verdade: o time perderia um jogador de graça em março e a compensatory pick que viria em 2019 não seria tão alta quanto a pick recebida do 49ers. É correto, sim, dizer que San Francisco fez um excelente acordo no papel: um jogador com experiência na liga por um preço não tão caro.

John Lynch continua numa ótima trajetória no início de seu trabalho na organização.

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Henrique Bulio

Numa eterna cruzada contra o feijão por cima do arroz.