Falando sobre videogames em 2016

Hynx
6 min readJun 16, 2016

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Nós temos que encarar a verdade: o jornalismo de videogames odeia videogames.

Eu não sei como isso aconteceu, nem como as coisas chegaram ao ponto onde estamos, mas não dá pra negar que a grande massa do jornalismo voltado para videogames hoje odeia o seu próprio motivo de existência.

Alguém deve ter escrito um texto mostrando toda a subversão que algum entretenimento digital possuía e como isso deveria ser danoso para nossa sociedade em algum aspecto pouco explicado (e muito embasado em sensacionalismo) que serviu de musa para todos os infinitos subsequentes. Ou a beleza do falatório de todos aqueles que ganham muito dinheiro e fama problematizando a indústria e dramatizando as próprias vidas inspirou outras pessoas sem mais o que fazer a seguir o mesmo caminho. Eu não sei, estou apenas criando hipóteses aqui.

O que importa é que do dia para a noite (ou de forma menos metafórica, de um ano para o outro) virou moda odiar videogames dentro dos círculos que trabalham exatamente com isso. Todos os envolvidos começaram a tratar o assunto como se reportagens do “Aqui e Agora” tivessem transado com a visão de algum adolescente de cabelo colorido sobre direitos humanos, e dado à luz a infinitas baboseiras ilógicas que tem pouco a ver com o foco em si (videogames) e muito sobre qualquer reclamação social que a pessoa queira criar.

Não reclamo aqui que você não possa ligar videogames a qualquer outro assunto social, politico, ou até mesmo a coisas completamente fora do contexto, mas acredito que isso precise ser feito de maneira natural e com o mínimo de inteligência possível para tentar passar alguma relevância real para o que está sendo dito. Hoje em dia as coisas estão muito longe disso.

A massiva maioria das pessoas que escrevem sobre jogos digitais pararam de olhar para o palco principal do seu trabalho (novamente acho que preciso avisar que falo sobre os videogames), para ligar um radar e buscar qualquer coisa que possa virar uma reclamação social no meio do caminho. É uma pescaria eterna por uma próxima problematização acéfala. Um trabalho constante para gerar aclamação no meio da bolha cheia de zumbis que consomem esse conteúdo, todos eles sempre buscando uma maneira de “pensar certo” no nosso mundo cheio de julgamento.

É muito fácil fazer isso, não apenas tendo a justiça social como matéria prima, mas praticamente qualquer coisa poderia ser criada se você estivesse atento para criar um paralelo bem raso. “Novo Zelda propaga a saúde entre os jovens, mostrando habilidades de alpinismo no protagonista”, e pronto, eu tirei do cu uma ligação entre jogos e saúde. Eu sei que deve ser estranho para quem está lendo esse texto com ódio não ver paralelo entre o que eu fiz com o que os jornalistas andam fazendo por aí, pois todo mundo acostumou a ligar jogos apenas a coisas ruins. Novamente, é uma moda, o pessoal está curtindo odiar.

Mas espero que esteja claro, nada disso é sobre videogames. Pensam primeiro no tema e depois abrem as orelhas em busca de qualquer coisa meia boca que eles possam encaixar sua lógica para criar conteúdo e clicks. É feio, é desonesto, é ridículo. Mas acima de tudo fica claro que vocês não gostam mais de videogames. Vocês querem que videogames seja outra coisa, uma metamorfose completa do estado atual, que nem mesmo os defensores tem uma ideia concreta de como deva ser, agregando todos os seus valores e gerando uma cultura em prol de todos os seus ideais. O problema é que não é, e provavelmente jamais vai ser.

O único motivo de textos assim estarem em moda e de todo o modelo de ódio ser sustentável é por que existe toda uma galera fiel em volta disso, que está sempre a espera da nova regra ou da nova maneira bacana de se pensar. São seres que também não gostam de videogames, mas estão ligados nesse meio por algum percalço do destino, e agora anseiam por alguém que escreva palavras bonitas e pense por eles. Isso pois eles também se inspiram em toda essa ideologia paraplégica que só sabe falar e escrever (assim como seus ídolos devem ter se inspirado antes deles), e gostariam de ter esse vazio existencial preenchido de alguma forma.

Quer forma melhor do que criticar e escrachar algo que você supostamente ama? Sob o pretexto de todos amarem videogames, eles pensam estar fazendo um puta sacrifício em prol da sociedade. Deixar de lado seu passatempo predileto para pensar além do jogo, pensar em como deveria ser o jogo perfeito cheio de mensagens bonitas e representatividade, impulsionando todo o mundo em uma utopia social que somente os jogos digitais podem catalisar. Faz bem pensar que você abandonou uma paixão para pensar em algo maior que você.

Só que essa não é a realidade. Ninguém dentro dessa bolha consome videogames, ou se consome é de maneira mínima comparada com todo o resto de fora. O que antes era uma forma de entretenimento, agora se tornou uma mera ferramenta para se abordar outros assuntos. Videogames se tornou uma metáfora para algo ruim, um contraponto para mostrar como o outro lado é muito mais puro e mais correto.

Agora estamos na E3 e vemos, por exemplo, o novo God of War. O que deveria estar sendo falado por jornalistas de videogames? Quem sabe analisar a forma como os desenvolvedores fugiram da fórmula desgastada de antes e buscaram uma narrativa mais interessante e entremeada no fluxo do jogo; ou como eles aprenderam com diversos estilos e elementos de jogos importantes desses últimos anos para fazer essa transição. Entretanto, o que mais dá audiência é falar que o Kratos é patriarcal e passa uma masculinidade tóxica (seja lá o que isso signifique) no vídeo mostrado.

Sério. Foda-se.

Outro episódio conhecido desses dias é o diretor do Zelda sambando para explicar o porquê do Link não ser mulher. Apontam que a Nintendo odeia as mulheres tendo como motivo a explicação mal dada, sendo que ela é apenas um reflexo de toda essa pressão e obrigatoriedade que os próprios envolvidos na periferia da indústria criam ao exigir que as obras reflitam sua visão do mundo. Em um mundo mais honesto e sem essas idiotices ele provavelmente falaria que não queria fazer o Link mulher, e que jamais nenhum diretor da Nintendo vai querer. Falar que essa decisão é machismo é fazer pouco uso do cérebro pra poder chorar ibope ou atenção na internet.

Eu sei que o que vou falar agora é contraditório, mas nós também somos culpa de toda essa merda estar acontecendo. Eu estou aqui dando palco para todos esses idiotas com esse texto, e aplaudindo muitos loucos. Simplesmente reclamar ou causar em cima de qualquer conteúdo desses é dar mais combustível para o ciclo de bosta nesse tipo de “jornalismo”. A dica seria esse texto nem existir, e todos simplesmente pararem de reclamar sobre esse tipo de coisa, mas acredito que isso é apenas questão de tempo.

Como dito, essa galera não é a que consome jogos. Eles abandonaram o barco há muito tempo em busca do seu novo amor: o aplauso e aceitação por todos os outros dentro da bolha. Com o tempo, tenho certeza, outros irão ver que essa é a galera que não merece atenção: eles não geram dinheiro, não consomem, só reclamam, e nunca estão satisfeitos com absolutamente nada. O que um evento como a E3 tem a ganhar credenciando esse tipo de pessoa para seu evento? O que grandes desenvolvedores de jogos têm a ganhar criando conteúdo e representatividade para quem não gasta dinheiro com eles? O que as empresas que realmente pagam dinheiro para você escrever sobre videogames têm a ganhar contratando pessoas que não falam sobre isso?

Com o tempo essas ideias vão se assentar e todos realmente envolvidos com jogos digitais vão perceber que essa turma só gera problema e prejuízo onde eles encostam. Quem sabe essas pessoas façam algum bem mínimo para as causas que defendem sentados em suas casas usando a internet, mas com certeza não agregam em nada para os videogames.

Para onde rumamos até tudo isso explodir é um cenário onde apreciar videogames é sinônimo de misoginia, preconceito, racismo e outras acusações que possam encaixar no meio. Mas depois disso tudo eu realmente acredito existir um futuro sem todas essas pessoas presentes em nosso meio. Desejo a todos eles um grande futuro na militância de cada um de seus assuntos favoritos, mas que seja muito longe dos jogos digitais. Vocês odeiam tudo isso. O futuro vai ser bom pra vocês também.

Eu adoro videogames, pra caralho, a ponto de me deixar puto com um bando de babacas na internet. Eu amo videogames como eles são, e se isso faz de mim um desgraçado aos olhos de alguns, eu só tenho a agradecer, pois quero toda essa turma cada vez mais longe de mim. Até lá, quando nem estiverem mais trabalhando com o que não gostam, continuarei amando videogames, me surpreendendo, emocionando e empolgando com qualquer besteirinha que a indústria inventar e jogar para mim.

Acho que é mais ou menos assim que as pessoas que realmente gostam de videogames agem.

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