Ser carioca e turista no Rio de Janeiro

Igor Mariano
Revista Passaporte
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4 min readAug 27, 2017

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É engraçada essa coisa de ter nascido no Rio e logo em seguida ter me mudado Brasil afora. Com pai militar, acabei vivendo uma rotina de mudanças que, embora tenha trazido muitas coisas boas, me afastou da sensação de pertencimento a algum lugar. Ter saído do Rio tanto e tantas vezes fez com que hoje eu não sinta que sou de lá. Não sou de lugar nenhum, e portanto nenhum lugar é meu também.

O irônico é que, além de berço, o Rio foi também a cidade em que morei mais vezes. Entre tantos estados onde transformei caixas em quartos e depois guardei quartos em caixas, morei no Rio por 7 anos. Os primeiros 3 anos logo que nasci, depois 2 anos na infância, por volta da quarta série, e os últimos 2 na adolescência, saindo do fundamental para o Ensino Médio. E ainda assim, ser carioca não parece parte de mim.

Atestado de turista: Ipanema é sempre parada obrigatória.

A cultura carioca não se enraizou na minha personalidade. Algum gene da areia da praia, do chinelo Havaianas e do cheiro de mar morre ao se afastar do Corcovado. E eu deixei morrer. As culturas por onde passei se uniram para sufocar o carioca que deveria me habitar. Isso não quer dizer que passei muito tempo longe do Rio, não. Na verdade, por diversos motivos, a vida naturalmente me dá motivos para que eu volte. E quando não dá, eu volto mesmo assim.

Foi o que aconteceu agora em Agosto, quando uma grande amiga e eu decidimos fazer uma viagem e escolhemos o Rio como nosso destino. Eu viajei para o Rio também no ano passado e no ano retrasado. Todas as vezes, antes da viagem, vislumbrei os lugares que eu queria visitar e os programas que eu queria fazer, como é natural.

Embora existam programas que eu gosto de fazer sempre, para matar a saudade (como beber mate na praia ou andar de bicicleta de Copacabana até Ipanema), eu sempre enumero também os que quero experimentar pela primeira vez. Lugares que, embora eu seja “carioca” e tenha ido tantas vezes ao Rio, eu ainda não visitei.

E invariavelmente esses planos fracassam.

Sou capaz de cumprir todas as metas nostálgicas de coisas que eu já fiz — e amo fazer — mas repetidamente falho em tomar café da manhã no parque lage, fazer determinada trilha, pular de asa delta da pedra da gávea ou visitar mais museus do centro da cidade, entre tantos outros planos inéditos para mim. E eu nem sei ao certo diagnosticar como isso acontece. Quando vejo a viagem já acabou, estou entrando em casa, e mais uma vez perdi a chance.

Tentar ver o pôr-do-sol no Arpoador e ser frustrado pelas nuvens também acabou se tornando tradição.

Não acredito que isso seja inteiramente influenciado pelos meus parceiros de viagem, porque entre amizades e namoros que levei comigo para as terras cariocas, a maioria delas jamais teria se oposto caso eu tivesse dito que fazia questão de alguma coisa. Por outro lado, acredito que sim, a culpa é deles. Ou melhor, de tê-los comigo. E a razão, ironicamente, é minha certidão de nascimento carioca.

Embora eu me sinta um mero turista no Rio de Janeiro, uma parte de mim quer ser o anfitrião. Essa parte também ama turismo, entende de Marketing e quer impressionar, como o resto de mim, mas essa fração é apaixonada pelo Rio. Muito apaixonada. É uma paixão infiel, confesso. Ela dá sumiço por vários meses e só manda mensagem quando descobre que estou a caminho. Essa paixão vaidosa e nada ciumenta me pede que eu ensine todo mundo a se apaixonar pelo Rio também.

Viciadamente quero levar minhas companhias para os programas que eu conheço e gosto para que elas também sintam o que eu sinto. E quando preciso abrir mão de qualquer coisa — e sempre é necessário abrir mão de qualquer coisa em viagens — eu abro mão do que ainda não fiz. É mais fácil e mais seguro. Como sentir falta do que não conheço? Seria loucura arriscar um programa que eu nunca testei e que pode colocar tudo a perder.

E dessa maneira eu me torno cada vez mais turista na cidade onde nasci, por querer ser antes de tudo a representação de um nativo. Em minha defesa, me considero bem sucedido em criar novos apaixonados pela minha terra natal. Por outo lado agora eu entendo que, para conhecer melhor o Rio, preciso me permitir ser meramente um turista.

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Igor Mariano
Revista Passaporte

Brasileiro, gestor de marketing, apaixonado por viagens, café, cerveja, livros e tudo que nos distrai • www.instagram.com/igor_mariano