Acessibilidade e Daltonismo

Como pessoas daltônicas experienciam o mundo e como o UX pode tornar o mundo um lugar mais inclusivo e agradável de estar

Isabelle Oliveira
5 min readSep 9, 2021

Sempre que pesquisamos sobre usabilidade de um produto, também estamos falando da experiência do usuário, uma necessidade que precisa ser atendida, a resolução de um problema de forma simples e eficaz.

A acessibilidade é o que permite integrar de forma humana a experiência de uso para pessoas que costumam ser esquecidas, trazê-las de volta para um mundo que se apresenta como hostil, é retirá-la da margem e permitir que vivam da forma mais completa o possível atividades corriqueiras da vida social. No Brasil, 8 milhões de brasileiras e brasileiros são daltônicas/os, conhecida também como cegueira cromática, é uma deficiência muito comum entre homens e mulheres. Essas pessoas enxergam o mundo de uma forma diferente, então, como o UX pode facilitar a experiência para essas pessoas? O que ainda não foi pensado que pode começar a ser implementado para um uso acessível e satisfatório? Vamos conhecer um pouco sobre o daltonismo primeiro.

Há alguns tipos de daltonismo: uns mais raros como a acromatopsia é quando a pessoa enxerga tudo em preto e branco, sem distinção de cores, o daltonismo monocromático, quando dos três cones da retina apenas um deles apresenta sensibilidade e enxergam da mesma cor mas em intensidades diferentes sem fazer distinção das outras cores, o daltonismo cromático que pode ser dividido entre: pronatopia, deuteranopia e tritanopia. Como podemos visualizar na imagem a seguir:

Lápis de cores com variações cromáticas para mostrar como cada pessoa daltônica enxerga as cores de forma diferente

Com o uso da extensão ColorBlind — Dalton do Google Chrome consegui simular como pessoas daltônicas enxergam alguns anúncios:

Outdoor da cerveja Heineken indicando como uma pessoa com protanomalia experiencia as cores verdes

Um problema comum de planejamento em interfaces de aplicativos e na arquitetura de informação é quando as cores são um indicativo do que fazer na tela, funciona apenas para pessoas sem deficiência cromática, já que são as únicas que podem enxergar as cores originais escolhidas pelo designer, o que pode causar dificuldades e eventuais desistências em usar um aplicativo sem as adaptações necessárias, uma forma de contornar esse problema e manter a identidade visual da marca é priorizar o contraste em algumas funções principais e fazer uso de ícones que indiquem qual atividade deve ser feita naquela tela, isso facilita a visualização mesmo que não seja nas cores originais.

Cores experienciadas por uma pessoa sem deficiência cromática
Interfaces de um protótipo de aplicativo com cores experienciadas por uma pessoa sem deficiência cromática
Mesma interface, experienciada por uma pessoa com deuteranomalia

Para além da experiência com sites e aplicativos, pessoas daltônicas costumam sofrer com algumas dificuldades que passam pelo estigma desde a vida escolar quando professores recriminam uma criança que pintou uma árvore de azul ou na vida adulta quando há dificuldades na leituras de gráficos que dependem da distinção de cores para compreender os dados.

Em 2000, no Brasil, a falta de padronização no método de avaliação da capacidade de identificar cores do semáforo resultou em muitas negativas de renovação da habilitação de motoristas que já eram experientes, foram avaliados pelo Teste Ishiara, que não avalia situações contextuais de trânsito.

Situações como encontrar a linha de metrô correta para uma pessoa daltônica também se torna um desafio, sistema de direcionamento de alas de um hospital e estacionamentos, jogos corriqueiros entre amigos que dependem da identificação correta de cores ou a combinação de peças de roupa para uma boa apresentação se mostram atividades complexas se não contarem com nenhum outro indicativo de orientação.

Algumas estratégias foram criadas para contornar esses problemas que não necessariamente dependem do avanço da tecnologia, o designer Miguel Neiva desenvolveu um código universal para reconhecimento de um sistema de cores para daltônicos chamado Color Add. Desde sua criação, o código vem sendo utilizado em situações como: identificação de pulseiras em pacientes hospitalares, embalagens de comprimidos, linhas de percursos em hospitais, mapas de rede de metrôs, semáforos, embalagens, serviços postais e etiquetas de roupas

ColorAdd criado pelo designer português Miguel Neiva

Em UX, podemos pensar em mais algumas estratégias para trabalhar com cores de forma que consiga manter a identidade visual e que também garanta acessibilidade para pessoas daltônicas. Gradientes e cores com sobreposições semelhantes são um problema, pois a falta de contraste dos tons pode causar dificuldades em entender textos e símbolos ou mesmo de encontrar botões e links importantes para executar uma ação. O Contrast Ratio é uma ferramenta interessante para mensurar e avaliar a usabilidade e contraste das cores escolhidas para a aplicação.

É sempre complexo pensar em como contornar problemas com cores para que se torne acessível para pessoas com deficiência cromática, não há uma solução universal, pois mesmo as pessoas daltônicas possuem demandas diferentes entre si, elas não enxergam as cores da mesma forma. A WCAG 2.0 (do inglês Web Content Accessibility Guidelines) requer uma taxa de contraste de 4,5 para textos normais (14 a 18 pixels).

IMPORTANTE: Um contraste extremo também não é aconselhável, pois pode causar desconforto em pessoas idosas, com baixa visão e em alguns casos mais extremos desencadear crises em pessoas com epilepsia. Contraste na medida certa e brilho controlado é o ideal para manter uma interface confortável de ser usada para pessoas com e sem daltonismo.

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