O que aprendi com o NaNoWriMo 2017

(Sempre quis escrever um texto com esse título!)

Janayna Bianchi Pin
10 min readNov 29, 2017

Sim, esse momento chegou! Depois de três anos tentando — e, antes disso, mais alguns anos achando a ideia “maravilhosa, mas não exatamente pra mim” — eu ~venci~ o NaNo! Não curto muito essa expressão (embora entenda a lógica), mas o que eu quero dizer é que consegui escrever 50 mil palavras em 26 dias. Eu fui uma NaNoRebel, o que significa que eu não escrevi um romance de 50 mil palavras do zero: eu não só resolvi avançar na escrita do meu romance, que já tinha 16.700 palavras quando o mês começou, como também escrevi um conto de 5.430 palavras e incluí o rendimento na conta.

Não, ainda não tenho um título pro romance… Desculpa, mundo, vou resolver isso em breve!

Parei de escrever no dia 26/11 não porque tinha simplesmente alcançado a meta, mas sim porque tinha decidido parar assim que chegasse a um acontecimento específico do romance— e, por bruxaria, coincidência ou (mais provavelmente) auto-sugestão, eu alcancei esse ponto de virada só duas mil palavras depois da meta de 50 mil. Falo dos próximos passos com o romance mais pra baixo, mas antes queria comentar um pouco sobre o que aprendi com essa experiência maluca.

Uma meta diária de escrita me ajuda

Antes de mais nada, uma ressalva: a meta do NaNo, de 1.700 palavras por dia, é uma meta BEM desafiadora pra mim — mesmo estando em período sabático. E uma meta fixa pra mim é esquisito porque meus dias são diferentes e, portanto é de se esperar produtividades diferentes de acordo com a programação, mas por coincidência deu tudo certo em novembro e acho que é plausível assumir uma meta maior pro mês e tentar seguir metas iguais por períodos relativamente curtos de tempo, como esses 30 dias. Mas vamos ao ponto: uma meta diária de escrita me ajuda tanto por me forçar a sair da zona de conforto quanto por facilitar a compartimentação do meu dia de trabalho. Cheguei à primeira conclusão depois de alguns dias em que comecei a escrever, não alcancei a meta de primeira e parei por uma razão qualquer — estava tarde, tinha um compromisso, estava cansada. Em circunstâncias normais, eu provavelmente teria dado o dia de escrita por encerrado, mas a meta me fez tentar uma nova sessão mais tarde. Pra minha surpresa, quase todas as vezes não só bati a meta como descobri que ainda existia um pouco de gás pra superá-la. E achei mais fácil organizar meu tempo entre vários projetos paralelos tendo uma meta diária de escrita porque, ao batê-la, descobri que adquiro paz de espírito o suficiente pra deixar o romance de lado e ir cuidar dos meus outros projetos. Pra alguém que está em período sabático, aprendendo na prática como se trabalhar em casa sem pirar, esse foi um aprendizado muito valioso.

Não preciso de tanto tempo pra escrever

Sempre acreditei que precisava de longos períodos contínuos de tempo pra conseguir produzir, e também sempre repeti que sou bem lerda. Mas com o NaNo veio minha tentativa de escrever em sprints — períodos de 30 ou 60 minutos SEM INTERRUPÇÕES, só escrevendo mesmo — , e só com os sprints é que consegui contabilizar de verdade meu rendimento. Com redes sociais, celular e Paçoca trazendo a bolinha pra brincar (e fazendo aquela carinha fofa e irresistível), eu passava um tempão enrolando, fingindo que escrevia. Mas quando eu comecei a focar, descobri que consigo escrever até mil palavras por hora. Isso é pouco comparado ao que vejo por aí — ou seja, sou um pouco lerda sim rs — , mas foi incrível descobrir que eu só preciso de umas três horas efetivas de escrita por dia pra cumprir a meta desafiadora do NaNo. Isso me empolgou muitas vezes, tipo “vamos lá, uma hora de escrita e já um terço da meta”. O que também significa que sempre que eu tiver 30 ou 60 minutos livres, dá pra escrever e produzir bem, ao contrário do que eu imaginava.

Eu preciso de um outline

Bom, acho que o NaNoWriMo2017 só reforçou essa que foi uma das primeiras descobertas sobre meu processo criativo. Pra mim, é muito importante escrever sabendo o que vai acontecer, a médio e longo prazo. Meu outline é relativamente solto, só com grandes milestones e ideias que preciso incluir ao longo do texto ao invés de cenas detalhadas, mas eu preciso de um propósito claro pra continuar, tipo “chegar na cena X”. Fora que saber de antemão coisas de foreshadowing que eu preciso incluir na história inclusive me ajudam a determinar micro-cenas enquanto vou escrevendo.

Mas é bom confiar na história

Por outro lado, esse senso de urgência inerente ao NaNo me ensinou a confiar um pouco no desenvolvimento orgânico da própria história. Ao invés de ficar refletindo muito profundamente sobre as micro-cenas, tipo um dia inteiro pensando “os personagens vão ter aquela conversa importante tomando café na padaria ou correndo no Ibirapuera?”, eu experimentei deixar a história me levar e só coisas boas aconteceram. Inclusive revoluções consideráveis no outline, mas foram coisas tão apropriadas que na hora senti a certeza de que era o caminho certo a tomar. (Queria registrar aqui que minha protagonista adotou uma gata que simplesmente não existia na história e do nada ela assumiu papel fundamental, como se nada tivesse acontecido. Quando é assim, a gente só aceita, dá um nome pra felina e continua a vida… Será que é isso que é ser mãe de uma adolescente?)

Parar a sessão de escrita no meio de uma cena pode ser bom

Muitos escritores recomendam parar a sessão de escrita quando você está embalado em uma cena ou sequência legal. Isso parecia meio ilógico pra mim, porque minha ideia era aproveitar o ritmo pra escrever o máximo possível num fôlego, mas como minha ideia no NaNo foi bater a meta e parar de escrever — tanto pra ventilar quanto pra conseguir fazer outras coisas no dia, como já mencionei acima — , acabei experimentando meio que involuntariamente essa dica e… bom, simplesmente amei. Descobri que é pra mim sim. Muitas vezes fui dormir com a cabeça em polvorosa pensando sobre a cena interrompida, o que não só me fazia começar a sessão no dia seguinte com força total como também me ajudou a ter ideias bem interessantes.

Não consigo simplesmente deixar de pesquisar

Há quem diga que, pra bater a meta do NaNo, basta sentar e escrever à toda velocidade. Pra isso, você deve deixar toda a pesquisa pra trás e usar o máximo de placeholders possíveis: não tem nome pro personagem? Use “PERSONAGEM”, ou “Zé”, ou até “melancia” ou outra palavra qualquer pra preencher a lacuna, depois você arruma. Na teoria isso me parece interessante, mas eu simplesmente não consigo fazer isso em todas as oportunidades. Entendi que, pelo menos nesse romance, algumas informações são muito vitais pra cena pra que eu possa assumir esse compromisso de não pesquisar nada. Por exemplo: preciso escrever com o Google Maps aberto porque minha personagem está o tempo todo zanzando por São Paulo e algumas vezes a distância entre o ponto de partida e o destino dela define se na próxima cena ela vai estar de bike ou dentro do vagão do metrô. E tudo bem, sem crise. Foi bom assumir isso pra mim mesma.

Mas sou capaz de deixar pra resolver os problemas depois

Por outro lado, descobri que eu não sou tão neurótica quanto imaginava. Sim, eu sou capaz de deixar placeholders e furos que pra trás e continuar escrevendo sem culpa. Tem personagem que vai trocar de nome, personagem que vai sumir, um monte de coisa que deixei pra resolver depois e tudo bem, não morri. Uma das ferramentas que mais me ajudou nesse sentido, mais do que o próprio senso de urgência do NaNo, foi meu diário de escrita. Já mencionei isso aqui nesse texto sobre o diário, mas é muito útil pra mim ter um espaço pra anotar coisas que preciso resolver depois. Libera minha cabeça porque eu tenho certeza que não vou esquecer, então eu fico em paz e segue a vida.

Companheiros de escrita me fazem bem

A meta do NaNo se mostrou um estimulante muito eficiente, como já mencionei, mas escrever junto com outras pessoas é ainda mais empolgante pra mim. Isso — saber que muita gente está usando o mês pra escrever loucamente — já é uma das coisas que torna o NaNo legal como um todo, mas descobri que propor sprints com amigos ou simplesmente conversar sobre a meta do dia, sobre o desenvolvimento de uma cena ou sobre ideias novas não só me ajuda a manter a empolgação pra produzir palavras como também me ajuda MUITO a trabalhar o outline. Muitas coisas interessantes da história surgiram depois de conversas com amigos escritores. Eu já sabia disso, mas isso ficou ainda mais claro durante esse mês.

Compartilhar meu processo criativo também

De maneira bem análoga, postar os números e o andamento do dia nas redes sociais do dia me ajudou depois a manter o ritmo. Eu sempre separava uns minutos da noite pra tuitar se tinha batido a meta, qual era meu acumulado, e até sensações gerais sobre o manuscrito. É legal ver o pessoal comentando, falando sobre os próprios projetos e tudo. As redes sociais podem ser o inferno na hora de tirar sua atenção da escrita, mas elas não são de todo mal. A ideia é usar a bagaça a nosso favor.

Pra não perder o costume, deixa eu compartilhar aqui com vocês como ficou meu gráfico final!

Imersão total em um projeto é maravilhoso, mas exaustivo

Pra mim, novembro passou num piscar de olhos… mas também demorou um milênio pra passar. Não acho que foi só por causa do NaNo, mas acho que boa parte da intensidade do mês foi culpa desse projeto. Eu passei 26 dias dedicando pelo menos três horas do meu dia (muitas vezes mais) ao mesmo projeto, escrevendo pelo menos mil palavras por dia. Foram 26 dias convivendo com os mesmos personagens, sentindo a mesma atmosfera, exercitando a mesma voz (esse romance tá em primeira pessoa) e tudo mais. Foi maravilhoso porque passei tanto tempo dentro da história que ela tá me parecendo muito real e honesta, mas também foi bem exaustivo. Com certeza sei que sou capaz de manter esse ritmo de novo ao longo de novos meses, mas me parece que 30 dias nesse ritmo é meio que um limite. Eu preciso de um descanso.

O que me faz pensar em…

…o que vem agora?

A ideia do NaNo em sua vertente mais pura é você terminar o mês colocando o ponto final no primeiro rascunho de um romance curto de 50 mil palavras. Como eu já mencionei, eu já sabia que não seria assim. Eu estimo que esse primeiro rascunho do meu texto vai terminar com umas 90 ou 100 mil palavras, o que significa que eu parei mais ou menos em 65% da história. Como mencionei, parei nesse ponto específico não só porque bati a meta numérica do NaNo, mas também porque atingi um ponto de virada importante. Como muita coisa vai mudar daqui em diante, agora eu acho interessante ajeitar todos os furos e coisas que ficaram pra trás. Acho que essa é a hora de consolidar o tom da narrativa, acertar nomenclaturas, uniformizar a escrita desse pedaço inteiro pra seguir o ritmo certo nessa parte final. Fora que, como já disse, preciso de um descanso dessa rotina maluca.

Então meu plano é o seguinte: fazer uma triagem das quase 60 páginas de diário de escrita e consolidar uma lista de tudo o que anotei que precisa ser modificado. Talvez eu leia todo o texto numa leitura meio dinâmica e tente enxergar coisas que não foram capturadas ainda.

Imprimi o que já tenho escrito e meu plano é ir avançando pela lista e fazendo marcações no papel dos pontos que precisam ser modificados. Minha ideia não é mexer no texto em si, nem revisar nada, mas só formar a colcha de retalhos do que já tenho e do que precisa mudar/entrar/sair. Aí vou pro computador e faço essas mudanças, provavelmente das mais simples (mudar nome de personagem e alguns termos, reformular tamanho de capítulos) pras mais complicadas (adaptar tudo o que foi escrito pra dinâmica do sistema de magia que surgiu no meio da escrita, inserir uma característica da protagonista de modo que fiquei espalhado uniformemente pela trama, ao contrário do como está agora…). A meta é acabar isso até o fim de dezembro — pensando que nesse meio tempo, tenho um conto de umas 8 mil palavras pra escrever, com deadline, e projetos paralelos pra agitar.

Ah, também quero usar o mês pra criar um board no Pinterest pro romance, talvez fazer uma playlist, eventualmente encomendar uma ilustração da protagonista… cuidar de coisas divertidas que vão me manter envolvida com a história e potencialmente me darão muitas ideias pra segunda metade da escrita.

Olha o bichinho impresso! Cheio de errinho, coitado.

Se tudo isso aí der certo (socorro), pretendo mandar essa primeira metade do manuscrito “acabado” pros meus beta mais íntimos no finzinho do ano. Sei que o Stephen King diz que o primeiro rascunho a gente escreve de porta fechada, mas eu me beneficio demais dos inputs das pessoas e acho que a hora de corrigir algumas coisas fundamentais como tom da narrativa (algo que provavelmente não preocupa o Stephen King hahaha) é agora, e não quando já tiver as 100 mil palavras escritas e tudo ajeitado.

Em janeiro pretendo repetir a dose do NaNoWriMo — uma sessão particular, dessa vez — e escrever os 35 ou 40% restantes da história. Aí fevereiro fica pra fazer os mesmos ajustes macro nessa segunda parte do manuscrito e março fica pra cuidar dos ajustes indicados pelos betas. O começo de abril é pra revisar e chegar num manuscrito pronto para… não sei ainda o que farei com ele, mas sei que quero ele pronto. Meu prazo interno, que agora eu compartilho com vocês, é 20 de abril — meu aniversário. Quero chegar aos 29 anos e poder dizer que terminei de escrever um romance. :)

Claro que muita coisa pode acontecer aí pelo caminho, mas pela primeira vez eu sinto que meu manuscrito está andando com força suficiente pra se manter e chegar ao seu final como algo que pode ser trabalhado pra virar um romance. Não acho que foi o NaNoWriMo desse ano que resultou nisso, mas com certeza ele ajudou muito no processo.

E você? O que descobriu participando desse NaNo?

Eu também falo de escrita no meu Twitter e na minha newsletter, que você pode assinar clicando neste link. A partir de dezembro de 2017, serão duas edições por mês, uma logo no começo e uma duas semanas depois.

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Janayna Bianchi Pin

Escritora, engenheira, viajante e passeadora de lobisomens. Autora de Lobo de Rua (bit.ly/lobojana).