Em tempos de crise, prepare-se

João Dias
6 min readMar 29, 2020

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Aproveitando esse tempo de quarentena para repensar as aulas de 50 minutos

Bom dia a todos, eu voltei a ler e era inevitável que eu voltasse a escrever. Fico feliz que a vida tem alguns ciclos e movimentos naturais que estão me satisfazendo nessa época de crise sanitária. Hoje, eu gostaria de falar um pouquinho sobre o livro que estou lendo, ele é bem grande, mas é muito gostoso de ler, recomendo a quem puder: “How the Brain Learns” do David A. Sousa. Até a página 85 foi uma revisão de conteúdo básicos para se entender as discussões no livro e, finalmente, estou chegando nas partes que mais me chamam atenção: aprender como otimizar o tempo de sala de aula.

Já na Grécia antiga, 400 A.C, Dialexeis dizia o seguinte recorte: “Repeat again what you hear, for by often hearing and saying the same things what you have learned comes complete into your memory”. Bom, essa fala está incorreta em partes, no entanto para algumas tarefas que não demanda a formação de memórias de longo prazo, ela funciona, pois usaremos somente a memória de curto prazo. Vamos entender um pouquinho de cada tipo de memória para depois voltarmos à fala e ao modo de lecionar de alguns professores atualmente.

Memória de Longo Prazo vs. Memória de Curto Prazo

A diferença entre essas duas é muito claro: enquanto a memória de curto prazo são para situações específicas e que logo depois a informação adquirida pode ser descartada, a memória de longo prazo tem o objetivo de formar uma rede de neurônios e fazer com que eles pulsem ao mesmo tempo quando você pensar em certa informação. Esse pulsar se chama: memória, quando queremos buscar alguma informação que já tivemos certo contato, um grupo de neurônios, não necessariamente na mesma área do cérebro, pulsa com o objetivo de transmitir as informações.

Agora, se pensarmos na fala de Dialexeis, a repetição, em muitos dos casos, pode fazer com que certa informação dure por um período considerável, pois a repetição é a chave da memória, no entanto uma repetição sem significado, sem motivação e, principalmente, sem emoção envolvida não fará diferença, pois continuaremos tratando tal informação com memória de trabalho, ou seja, após o uso será descartada.

Dito isso, pensemos em como alguns professores lecionam: Eles chegam na sala, acalmam os alunos, fazem chamada e começam a falar com pequenas interações perguntando para os alunos algumas perguntas e fim. 50 minutos, uma hora-aula se passou. Depois da aula, eles costumam dar alguns exercícios para que os alunos possam praticar.

>>>> IMPORTANTE Considerando que esse professor falhou na hora de passar a importância desse tópico e também considerando que esses alunos não costumam estudar logo no dia que viram a matéria. IMPORTANTE <<<<

Fazendo essas duas considerações, esses alunos depois de um período de 18h a 24h terão esquecido 90% daquilo que o professor passou na sala de aula. Assim, se eles forem fazer o exercício depois desse período encontrarão grandes dificuldades e terão que reaprender boa parte daquilo que o professor acredita ter ensinado.

Saindo o pior cenário relatado acima, vamos para o melhor cenário com a ajuda de um graficuzinho do livro:

Legenda antes de falar sobre o gráfico:

  • Prime-Time: É quando o aluno tem disposição cerebral para receber e reter novas informações. Em uma aula de 40 minutos, ele tem dois picos, o primeiro de 0 a 20 e o segundo, de 30 a 40.
  • Down-Time: É quando o aluno diminui consideravelmente sua capacidade de reter informação e está começando a trabalhar na seleção das informações.

Agora, vamos pensar em como uma aula de 50 minutos, no Brasil, é planejada:

Assim, em qualquer um dos cenários, o professor estará dando a informação nova ou ensinando a nova habilidade para esses alunos justamente no momento de DOWN-TIME, ou seja, que a capacidade do aluno de retenção de informação do aluno está reduzida. Isso não significa que ele não consegue aprender mais nada, no entanto indica que o mais inteligente a se fazer nesse momento é trabalhar o que o aluno já sabe para consolidação de conhecimento, não introduzir novos assuntos.

Vamos pensar na mudança sutil das ordens para respeitar aos tempos de Prime-Time e Down-Time:

Repare na simplicidade da organização do tempo de sala de aula e na liberdade que o professor tem para passar o conteúdo programado para aquela ela. Vamos falar um pouquinho de cada etapa:

  1. Novo Conteúdo (Prime-Time1): Você está usando justamente do melhor momento para explicar o novo conteúdo e, provavelmente, na próxima aula os alunos lembraram de boa parte do conteúdo, caso ele seja trabalhado de forma inteligente após a aula.
  2. Descanso (Down-Time): Esse descanso não é exatamente um descanso, ele é um tempo para descanso da forma de estímulo que estava se usando para passar o conteúdo. Por exemplo, se você, professor, decidiu por dar o Prime-Time1 para de forma auditiva (falando na maior parte do tempo). Use esse tempo para dar um exercício (para exercitar o tático), ou dê um vídeo explicativo curto (para exercitar o visual), ou incentive os alunos a trocarem informações entre si e ande pela sala para certificar que eles estão realmente trocando ideias sobre a matéria. Por fim, se você usou um meio ou uma combinação de meios de estímulos, nesse tempo de descanso utilize o outro para que tenha mais neurônios estimulados e uma rede mais forte na hora de acessar essa memória que está sendo formada.
  3. Novo conteúdo (Prime-Time2): Passado o tempo de descanso, é hora de voltar a falar sobre o novo conteúdo ou introduzir algum tópico novo. No entanto, a grande questão por detrás desse segundo tempo para trabalhar novos conteúdos é levar essa aula para um fechamento, ou seja, fechar o conteúdo e indicar para os alunos onde encontrar mais sobre ou que fazer para que eles possam conhecer mais sobre. Essa segunda parte nunca deve deixar assuntos pendentes de forma incorreta. Por exemplo, estou em uma aula de Física explicando sobre a gravidade e me perdi no tempo, assim tive que parar a aula quando estava explicando sobre a história da maçã caindo na cabeça de Newton, não falei sobre a fórmula envolvida, não falei o que essa maçã representa, não expliquei os conceitos que vieram depois dessa queda da maçã, entre outros. Deixei um tópico totalmente aberto.

Agora, se eu consigo explicar esses conceitos e indicar exercícios, textos, vídeos, entre outros, para os alunos praticarem em casa. Assim, terei alcançado o sucesso nessa aula.

Uma grande observação a ser feita é que, no livro, ele diz que devemos sempre priorizar aulas de curta duração em vez de aulas com grandes tempos. Quanto menor o tempo, menor será o tempo de Down-Time da Aula. Por isso que uma aula de 50 minutos tem dois tempos para novos conteúdos e um para descanso. Repare na tabela abaixo:

O tempo que apresenta maior tempo de prime-time é justamente as aulas de 20 minutos, pois a atenção do aluno, em média, 20 minutos. Então, é bem provável que poderá reter boa parte do conteúdo passado. Agora, se a aula tem um ritmo único, quanto mais tempo de aula você der, menos conteúdo seus alunos guardarão e não adianta ficar bravo que eles não lembrarão, caso não estudem em casa pelos seus próprios meios.

Aqui apresentei uma estratégia para uma aula de 50 minutos, sem levar em consideração o retrospecto dos alunos que você, professor, está lidando, ou seja, cometi um erro que só você pode corrigir, pois somente você conhece a realidade dos seus alunos e como adequar sua linguagem ou postura para conquistar a confiança deles. Lembre-se o ser humano é um ser social, emocional e histórico. Nunca, por hipótese alguma, negue esses três aspectos do ser humano. O meio que ele está inserido interfere em parte das suas ações, o emocional que ele está/tem afeta sua capacidade de aprendizagem e sua história afeta como ele dá atenção para os estímulos ao seu redor. Muito cuidado sempre com seus alunos queridos.

Obrigado pela leitura e boa sorte com suas aulas! Vou continuar estudando para ver se sai mais tempos legais.

Att,
João Dias — Faísca.

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