Certos estão os incertos

Juliano Zimmermann Freitas
4 min readJan 26, 2018

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Muito cedo, ainda aos 12 anos de idade, tinha claro qual seria meu futuro.

Tudo começara em uma divertida aula de História, na qual a professora comissionara dois grupos para um mock trial acerca da Guerra de Canudos.

Sempre tive opiniões fortes, muitas das vezes pouco populares. Some isso a uma capacidade razoável de argumentação e gosto pelo desafio.

Passo seguinte, me vejo conduzindo a defesa da recém instalada República (éramos 3 defensores para cada lado) e, ao lado de meus colegas, manejando um improvável empate na votação feita pelos demais integrantes da 6a série E.

Courtney Cook, Midlothian Heritage High School, Texas (http://www.nationalmocktrial.org/courtroom-artist-contest/)

Chego em casa e, naquela noite, anuncio meu definitivo porvir: “Estudarei Direto e serei um advogado”!

Passados mais de 25 anos e uma infinidade de experiências, encontro que meu “eu” de 12 anos ficaria surpreso com as voltas que a vida dá.

Às vésperas de completar 10 anos como executivo corporativo e, portanto, indiretamente distante da advocacia, continuo o trabalho diário de reconstrução e evolução.

Quanto mais busco conhecer a mim e ao mundo, claro fica que esta tarefa hercúlea se valerá pelo esforço, e não quanto ao resultado.

O conhecimento humano baseia-se na capacidade que adquirimos de questionar e, tal qual a um Julgamento, emitir valores e opiniões a cada passo dado. Assim, em momentos de profundas mudanças é perigosa a certeza.

Mais e mais nos deparamos com a dicotomia que correntes de pensamento insistem em classificar a tudo e a todos. O revanchismo, as rusgas e inconformidades trabalham para criar um artificial “nós versus eles”.

Neste cenário, a oposição de pensamentos passa a ser, portanto, uma mácula ou chaga que deve ser extirpada. Bastante, ao crédulo, sua certeza professada.

Usando Descartes como um ponto à certeza, este indica em seu Princípios da Filosofia, que advém daquilo que não duvidados e que diz respeito às condutas da vida. Você só teria, assim, de não exercitar o primeiro aforismo desta mesma obra.

Apesar de certeza e verdade não serem sinônimos, a busca pela última (ainda que sua e exclusiva), pode vir deste ensinamento.

“Para examinar a verdade é necessário, pelo menos uma vez na vida, pôr todas as coisas em dúvida, tanto quanto se puder”.

Duvidar! Questionar! Não se acomodar! São ações que contribuem ao que acredito seja o máximo da humanidade: evoluir.

René The Red Pill Descartes

Em que ponto um indivíduo perde a capacidade de filtrar a informação que recebe? Deixa de pesar este produto com seus valores? Perde a empatia para, ao menos, conceber que o interlocutor tem o direito a opinar contrariamente?

Chamo a isso de futebolização de vida.

Tão presente em nossa realidade, o futebol naturalmente opõe adversários em campo, ambos buscando um único fim: vitória. Esta afirmação, o sobrepujamento do outro, é a única escolha feita antes do apito inicial.

Passados os 90 minutos, porém, você tem de lidar com as consequências do resultado. Não sem antes ter de enfrentar os avanços dos que ocupam as 4 linhas e, presumidamente, tem o mesmo objetivo.

Vejo uma tendência idiossincrática, porém, de que se está adotando para o dia-a-dia somente o resumo da rodada. Você só se interessa pelo seu time de coração e com a vitória deste. Todos os demais são inimigos, percalços que devem ser eliminados.

Parece insano! Ninguém espera que o time adversário entre em campo sem atacar. Seria loucura esperar vencer um campeonato por W.O.

Por que então não se suporta o pensamento contrário?

No campo da política, filosofia e sociologia, o que vemos é a sanha em unificar discursos e eliminar o pensamento contrário. Pouco importa qual a corrente de eleição, a tendência de demonizar os contrários é exercitada diariamente, nas redes sociais, nos encontros de amigos, na tomada de decisões…Como se criar um campo estéril fosse a solução para vida!

Ao cercar-se dos que pensam igual e sequer tentar entender o que há do outro lado do muro, o indivíduo assegura sua certeza, na mais das vezes, deixando de se importar com qualquer verdade e, sempre, sacrificando a evolução.

Aqueles alunos da 6ª E fizeram possível um empate de valores entre Antonio Conselheiro e Prudente de Morais. Por que você não poderia considera-lo em outras áreas? O que lhe separa do respeito a todos os outros?

Minhas certezas cada vez diminuem mais. Em cada dia vivido, cada experiência passada, desejo conhecer mais. Para isso, uso como mantra uma frase que cunhei alguns poucos anos depois daquela aula de história: amadurecer é poder olhar para traz e, em qualquer época de sua vida, ter a certeza de que você foi um completo idiota.

Talvez por sobrevivência, esta certeza ainda me acompanha.

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Juliano Zimmermann Freitas

Advogado por formação, executivo por eleição, libertário, amante das boas coisas da vida e agitador cultural de um grupo de 6 pessoas (8 no máximo).