Por que abandonei o Patreon do Jogabilidade (e você deveria também)

Pedro Kauan
6 min readMar 30, 2016

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Sempre fui um grande fã do site Jogabilida.de. Acompanho André e Rick desde a época do saudoso Nowloading, continuei acompanhando no Jogabilidade, e fiquei muito empolgado quando eles anunciaram uma campanha no Patreon.

A meta era ambiciosa: arrecadar fundos suficientes para produzir uma avalanche de conteúdo, mas não só isso: eles pretendiam VIVER O SONHO. Sim, o sonho de que toda a equipe morasse junta em uma “Jogabilicasa”, de que eles pudessem se dedicar integralmente ao site e a falar de videogames e recebessem pra isso. Muitos de nós já sonhamos com isso, mas para o Jogabilidade esse sonho se tornou realidade já no primeiro dia de campanha no Patreon. Campanha INCRÍVEL, aliás, cheia de boas promessas, cheia de tudo que um fã poderia querer, mas também cheia de coisas das quais o cenário brasileiro de games precisava. Autenticidade.

Sete meses depois de ter contribuído para o Patreon, eu hoje abandonei o Jogabilidade. E você deveria abandonar também.

Promessas não cumpridas

As metas do Patreon pareciam ambiciosas, mas não tanto para quem se programava para viver daquele conteúdo e se dedicar a ele com uma equipe de 4 pessoas. Vamos analisar as promessas e o que foi entregue desde que as metas do Patreon foram atingidas:

  • Podcasts Linha Quente, Fora da Caixa e Vértice quinzenais: esta foi a única promessa integralmente cumprida pela equipe, mas não é difícil entender o porquê. Os 3 podcasts são no estilo bate-papo, em que os participantes conversam sobre o que estão jogando, fazendo, ou assistindo (ou simplesmente falando besteiras). Por mais que seja um conteúdo interessante, não exige preparo e estudo (e, por ser um bate papo, não exige muito esforço de edição).
  • Podcast JACK mensal: em 7 meses, foram entregues 5 episódios.
  • Série Construindo Mundos: em 7 meses, foram produzidos 5 vídeos, sendo 1 deles com um integrante da própria equipe.
  • Série de vídeos Do que se Trata (2 por semana): em 7 meses, dos 56 vídeos prometidos, foram entregues 40.
  • Série de vídeos Durabilidade: foram entregues alguns vídeos, ainda que esporadicamente.
  • Séries de vídeos Retrocompatibilidade e Conquistadores: nenhum vídeo foi entregue nos últimos 7 meses.
  • Podcast DASH quinzenal: em 7 meses, dos 14 episódios prometidos, apenas 6 DASHs viram a luz do dia.

Temos, portanto, a seguinte situação: o carro chefe do Jogabilidade, o podcast DASH, foi o produto a que eles menos se dedicaram. O conteúdo que recebemos foi basicamente aquele que exige pouca produção. Sem contar as séries que sequer viram a luz do dia, como Retrocompatibilidade e Conquistadores (que exigiram metas altas do Patreon!).

É possível entender que uma equipe de pessoas que leva o site ou podcast como um hobby deixe de cumprir suas promessas. Mas não é esse o caso.

A meta do Patreon não era justamente poder se dedicar integralmente ao Jogabilidade? Não era profissionalizar a produção de conteúdo? Desde 27 de agosto, quase R$ 100.000,00 foram pagos ao Jogabilidade. Isso seria o suficiente para abrir um negócio. Mas os Jogabilideiros não foram capazes de produzir o conteúdo prometido, mesmo se dedicando integralmente a ele e recebendo pra isso?

É claro que eu assisti os episódios do Responsabilidade — bem divertidos, bem engraçados, mas muito evasivos quando as perguntas eram referentes aos atrasos e aos compromissos. Cheguei a ouvir que “Não deu pra fazer x e y porque o trabalho me consumiu muito tempo”.

Bom, pelo menos na minha visão, o Jogabilidade deveria ser visto como trabalho, já que a equipe toda recebe aproximadamente R$ 10.000,00 por mês pra se dedicar a isso. Dividindo por 4, é um salário de R$ 2500,00 pra cada um, coisa que muito jornalista de games não ganha no mercado. “Ah, mas tem os gastos com a casa, com os jogos, com os equipamentos”… exatamente, os gastos que uma pessoa normal teria pra viver e jogar videogame, mas que pra vocês se tornou um trabalho.

Outra razão para o atraso foi a “Jogabilicasa”. Antes o motivo era “não dá pra produzir o conteúdo sem estarmos morando juntos”. Ué, e os 55 episódios do DASH anteriores ao Patreon foram produzidos como!?

Depois de Janeiro, quando finalmente a “Jogabilicasa” foi alugada, o motivo passou a ser “estamos nos acostumando à casa nova, não sabíamos direito como ia ser”. Bom, isso soa ou como falta de planejamento ou como mentira. Por acaso o plano não era justamente morar junto e produzir conteúdo? É preciso mais de 2 meses pra decidir como será gravar um podcast com os 4 morando no mesmo teto!? É preciso mais de 2 meses pra “acostumar” a morar numa casa e se dedicar a um conteúdo que já produzem há anos?

Transparência, Responsabilidade e Recompensas

Fazer um Patreon não é como pedir uma esmola. O Patreon prevê metas a serem atingidas e recompensas a serem concedidas de acordo com sua contribuição.

Como já vimos, uma parte substancial das promessas não foram entregues, sem que houvesse uma justificativa pra isso. É claro, isso me faz pensar: no que foram gastos os quase R$ 100.000,00 que o Jogabilidade já recebeu desde que o Patreon foi pago?

Vamos pensar em números. Desde o Patreon em 27 de agosto, se passarem 7 meses. Aproximadamente 130 dias úteis. Se os 4 membros da equipe se dedicassem 4 horas diárias ao Jogabilidade apenas nos dias úteis (afinal, não pretendiam transformar em trabalho?), seriam mais de 2000 horas de dedicação. Parece bem mais do que suficiente para atender as metas prometidas. É como pagar salário a um funcionário que simplesmente não atinge nenhuma meta da empresa.

E tem a questão dos investimentos. Em que esse dinheiro foi gasto? Boa parte em um apartamento millionaire, em uma zona nobre de Sâo Paulo, que de acordo com o mercado imobiliário deve custar no mínimo 6000 reais mensais (será que não havia opções menos luxuosas?). Outra boa parte com a sobreivência de cada um, o que seria justo, caso as metas fossem cumpridas…

E pra terminar, as recompensas. Foram prometidas keys de jogos, agradecimentos em podcasts e vídeos, participações, desconto em lojinhas…. mas NADA disso foi entregue até agora, 7 meses depois. Era de se esperar que, com mais de R$ 10.000,00 por mês, fosse possível comprar um ou outro jogo para sortear entre os ouvintes, ou produzir um vídeo agradecendo aos colaboradores. Mas nada foi feito.

Decepção

Eu não fico feliz de escrever isso. Eu acreditei no projeto do Jogabilidade, na dedicação que eles prometeram, nas metas que foram atingidas. Acreditei que eles queriam viver o sonho — sonho, aliás, que muitos de nós já tivemos um dia, e nunca acreditamos ser possível. Bom, para o Jogabilidade foi possível viver o sonho, mas esse sonho não foi o que nos prometeram.

É como emprestar dinheiro para alguém comprar livros e esse alguém gastar tudo em bebida.

É como contratar alguém que não cumpre suas obrigações porque “tem outras preocupações”.

É como comprar um ovo de páscoa esperando pela surpresa dentro, mas ele vir vazio.

A equipe do Jogabilidade está, sim, vivendo um sonho. Um sonho de meninos. Um sonho deles. Um sonho sem responsabilidades, sem comprometimento. Um sonho sustentado pelas mãos de centenas de fãs que aceitam suas desculpas esfarrapadas, a demora na entrega do que foi prometido, e a irresponsabilidade, porque gostam deles.

Bom, eu gostava deles, mas eu não gostei de me sentir feito de trouxa e ouvir a equipe cochichando entre si na minha imaginação: “Ah, deixa pra lá, se a gente não entregar o pessoal vai continuar pagando. Fã é assim mesmo”.

É por isso que eu abandonei o Patreon do Jogabilidade, e você deveria abandonar também. A não ser que a equipe acorde para a responsabilidade que tem nas mãos e mostre alguma mudança. Do contrário, seremos apenas 700 trouxas que caíram no conto do Patreon…

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