Da árvore até a mão.

Trazendo uma proposta econômica de conscientização, aplicativo permite localizar árvores frutíferas e hortas comunitárias no mundo todo

Laura Romero
6 min readAug 22, 2016

Com mais de 600 mil usuários e mais de 1 milhão de locais registrados, o Falling Fruit é um aplicativo que dá acesso a um mapa colaborativo que permite localizar diversas frutas e plantas comestíveis, bem como compartilhar e registrar informações sobre elas e foi criado em 2013 pelos estudantes estadunidenses Ethan Welty e Caleb Phillips, na cidade de Boulder, Colorado (EUA). A iniciativa partiu no momento em que Ethan começou a preparar a sua própria cerveja. Com o seu pé de maçã esgotado, ele começou a buscar frutas em outros lugares, usando o “Inventário de Árvores de Boulder” (mapeamento de terras aráveis de sua cidade) levando consigo sua câmera, bloco de notas e GPS que o permitiu criar uma pequena base de dados pessoal. Tempos depois, percebeu que não precisava mais comprar frutas no supermercado e se perguntou como essa emoção de “caçar” alimentos poderia ser compartilhada com as outras pessoas. “Fiquei espantado que ninguém mais parecia notar como muitas frutas estavam crescendo acima de suas cabeças e pela porta afora, enquanto nos dirigimos para os supermercados para comprar alimentos enviados do mundo todo”, conta Ethan.
A iniciativa incentiva moradores urbanos a se engajar com a procura e o consumo de alimentos naturais e frescos. “À medida que deixamos de reconhecer as árvores frutíferas uma vez plantadas, elas são esquecidas. Essa Consciência Ambiental está muito em falta, pelo menos aqui na América do Norte. Toda vez que vou para a rua para procurar alimentos, alguém de passagem fica maravilhado com o que estou fazendo. Eles não conseguem acreditar que a árvore que foi plantada há anos produz o mesmo fruto que compram no supermercado. Às vezes é uma planta rara que ninguém ao menos conhece”, acrescenta.
O Falling Fruit despertou atenção do público para a abundância de comida e seu enorme potencial de crescimento. “Por exemplo, dos 690 mil arvores publicas em Toronto, Canadá, apenas 10% tem o uso comestivel, incluindo bordos de açúcar, tílias, maçãs pomar e nozes persa. A decisão é nossa se vamos utilizar nossas florestas urbanas e suas deliciosas comidas frescas como uma fonte de abastecimento”, explica o norte-americano.
Ethan diz que sua plataforma impõe uma ideia de partilha, possibilitando compartilhar conhecimentos, colheitas e colaboração entre as pessoas, uma vez que elas o usam para alimentar moradores de rua da comunidade. Donos de terras são incentivados a doar suas produções excedentes para caridade com ajuda de organizações locais, evitando o desperdicio por apodrecimento.

“Trabalhando em um projeto tão próspero, eu sinto que estou fazendo uma boa ação para o mundo!” FOTO: Divulgação, Ethan Welty.

Dos EUA ao Brasil

O site já possui 2.565 usuários brasileiros desde a sua criação, ainda que tenha sido traduzido para o Português somente em abril de 2015. A plataforma vem se popularizando por aqui desde o início de 2016, quando começou a ganhar destaque na imprensa brasileira.
Apesar das perspectivas, o Falling Fruit ainda não é tão popular em nosso país, mas ele está presente: são 73 registros, espalhados por 9 estados, com a maioria concentrada em Goiás, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Seus usuários, em geral, são pessoas que também fazem parte de associações e grupos não-governamentais sem fins lucrativos voltados ao meio ambiente.
Leandro Pagnoncelli, 37 anos, Gerente de Marketing, faz parte de muitos projetos relacionados à sustentabilidade; um deles é a Horta Comunitária do Grajaú, localizada no Rio de Janeiro e registrada por ele recentemente na plataforma. “Conheci o Falling Fruit através do compartilhamento em grupos nas redes sociais que tem a sustentabilidade como tema e a ideia é excelente! Acredito em projetos colaborativos e em como as redes reais e virtuais podem potencializar iniciativas”, elogia a ferramenta.

Moradores da região cuidando da Horta do Grajaú. Foto: Divulgação, Leandro Pagnoncelli.

Segundo Leandro, a horta é cuidada pelos moradores da própria região, que têm acesso livre, independente da presença ou permissão dos participantes do projeto. Ele considera a atividade como algo muito benéfico para a comunidade: “Cuidar da horta serve também como terapia ocupacional para alguns, como reinserção de pessoas em situação de risco social, como método pedagógico para crianças e idade escolar ou simplesmente como hobbie” — afirma.

Para saber se o alimento está adequado para ingerir, a horta adota o uso de placas informando espécie e suas características, data do plantio, cuidados e data esperada para a colheita.
Sobre o uso do aplicativo, Leandro diz que a quantidade de registros ainda é pequena, mas as consequências serão positivas. “Espero em algum momento realizar o meu sonho de fazer refeições enquanto ando pelas ruas, colhendo por onde passo”.

Da esquerda para direita; manjericão, tomate e coentro. Foto: Divulgação, Leandro Pagnoncelli.

Ele acredita que a baixa popularidade do aplicativo no país se deve pela falta de divulgação, “Num primeiro momento, a responsabilidade é dos desenvolvedores, mas conforme os usuários utilizarem e constatarem os benefícios, farão isso espontaneamente”.
Essa visão também é compartilhada por Renata Leite, 41 anos, servidora pública, fotógrafa. “Conforme as pessoas começarem a explorar o mapa, tomarem conhecimento e se interessarem em conhecer e colaborar, a divulgação será feita”. Foi a mineira quem registrou a Horta Comunitária chamada “Quintal Mimoso”, localizada na região de Betânia em Belo Horizonte.
Ela conheceu o aplicativo pelo site do Ciclo Vivo, e logo se interessou quando viu que se tratava de conectar pessoas e tornar mais fácil a busca por hortas comunitárias no mundo todo. Segundo ela, a iniciativa é importante para a troca de experiências, transformando a prática de plantio e colheita em uma rede colaborativa. “Lá registrei urucum, pitanga, abacate, mamão e goiaba”, conta.
A fotógrafa faz parte de um grupo chamado “Coletivo 1207”, união de voluntários, parceiros e sociedade, com objetivo de realizar ações artísticas e urbanísticas em prol do desenvolvimento social, cultural e urbano em seu bairro e vizinhos, de forma apartidária e sem fins lucrativos. O “Quintal Mimoso”, é uma das ações do grupo. A horta está localizada em um terreno desocupado à margem de um córrego, onde era frequente o depósito de lixo e entulho, atraindo ratos e insetos. O plantio teve como finalidade amenizar a ação dos roedores e do mosquito transmissor da dengue, promover encontros e trocas entre moradores e melhorar o bairro. Nos mutirões, já foram cultivados goiaba, abacate, melancia, hortelã, pimenta, maxixe, babosa, banana, folhagens e flores de diversos tipos.

Moradores atuando na preservação da horta, no bairro de Betânia, Belo Horizonte. Foto: Divulgação, Renata Leite Fotografia

“O retorno tem sido muito positivo. Vários moradores contribuem, doando mudas, grama, pneus, aguando, capinando, recolhendo lixo. Hoje, no lugar de ratos, temos pássaros e borboletas”. O Quintal Mimoso é aberto para toda a comunidade. “Infelizmente há pessoas que fazem a colheita fora da hora, mas conscientização é a saída”, conclui Renata.

Na Grande Metrópole

“Eu era responsável pelo ‘Criando Terra’, um projeto que trabalhava com agricultura urbana e agroecologia. No espaço onde se desenvolviam as atividades, já haviam algumas árvores frutíferas e plantas cultivadas e as registrei no Falling Fruit, auxiliando em sua divulgação”, conta o paulista Jordano Roma, 30 anos e autônomo.
Ele também conheceu o aplicativo pelo Facebook, em um grupo sobre agricultura urbana. Já registrou produtos como mamão, manjericão e batata doce. “Não notei efeitos do registro, mas deve-se considerar que a horta está inserida em um Instituto da USP, onde não é permitido a livre circulação de pessoas vindas de fora”, aponta.

Horta localizada no Campus da USP, em São Paulo. Foto: Criando Terra / Facebook

Jordano ressalta que a popularização da ideia incentiva pessoas a cultivarem, interagirem entre si, conhecendo a origem de seu alimento e facilitando a identificação de espaços de produção de alimentos nas cidades, tornando a população consciente e saudável.
Embora estes ambientalistas lamentam da pouca adesão dos brasileiros, eles torcem pela popularização e acreditam que o problema seja a falta de divulgação. Jordano diz que “anterior a isso, falta incentivo às iniciativas de desenvolvimento da agricultura urbana que existe no Brasil, especialmente em termos de política pública”.
Para o criador do aplicativo, a falta de popularidade do app na America do Sul implica na falta de cobertura da imprensa. “Não temos um orçamento para a propaganda, por isso contamos com cobertura de imprensa e do boca a boca.”

Visite o site www.fallingfruit.org e colabore com o mapeamento!

Reportagem finalizada em: 03 de Julho de 2016

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Laura Romero

Entusiasta da Comunicação, graduanda em Rádio e TV, apaixonada por escrever e fã do The Smiths. :D