Castlevania Lords Of Shadow 2 — Level Secreto #66 EXTRA

Roteiro: Erick Oliveira

Level Secreto
8 min readAug 17, 2022

Castlevania Lords Of Shadow 2 foi lançado em fevereiro de 2014 para Playstation 3, XBOX 360 e PC. Ele é considerado uma decepção ou só piorou o que estava ruim, na opinião de quem já não curtia o primeiro. A questão é que existia uma expectativa para a sequência de Lords Of Shadow, pelo Gabriel Belmont se revelar o Drácula no epílogo do jogo anterior, que acontece nos tempos atuais, gerou uma curiosidade no mínimo, como é que vai ser?

Em Lords Of Shadows 2 confirma que o jogador continua controlando o Gabriel, só que como Drácula. Tem um começo muito empolgante que o seu castelo está sendo atacado, um segmento que reúne tudo de bom que o jogo anterior fez de forma condensada. É o momento de Drácula demonstrar todo seu poder e encerra com a aparição do Alucard, não tinha como não ser mais instigante.

Aí corta para aquele período nos tempos atuais, o ano é 2006, o Gabriel dormiu por 500 anos e acordou bastante debilitado. Ele havia recebido a visita de Zobek, seu antigo companheiro, que lhe informou que Satã iria voltar e precisaria da sua ajuda para derrota-lo mais uma vez. Gabriel aceita ajuda-lo porque acredita que pode de certa forma recuperar de sua maldição.

Gabriel rapidamente recupera sua força, a sua aparência imponente como Drácula, assim, partindo para a tarefa de derrotar os três acólitos de Satã, que estão preparando um ritual para sua volta.

O jogador parte para a sede de uma instalação farmacêutica com Drácula tendo que se infiltrar em modo stealth, transformando-se em rato e evitando um certo inimigo que assim o vê, num instante pode mata-lo. Em certo ponto ele vai para o passado numa distorção da realidade, o seu castelo está em perfeitas condições. No decorrer do enredo, algumas de suas memórias e o tempo atual se confundem, aparecem uns personagens que já tinham morrido, e Lords Of Shadow 2 é isso aí sabe?

Os momentos de furtividade voltam acontecer no meio do jogo, o jogador já até reuniu certas habilidades. Esse é um elemento que até hoje nunca entendi porque que colocaram, e segundo alguns relatos, os próprios da desenvolvedores da MercurySteam também não entendiam a inserção desse elemento no Lords Of Shadow 2.

Quando joguei na época fiquei possesso que tava esperando o momento que poderia enfrentar de igual para igual aquele inimigo indestrutível do começo, e ele some, os locais que estava antes, simplesmente puf, parece que nunca existiu. Simplesmente o maior inimigo que o Drácula já teve em todas as mídias que já foi adaptado.

Agora é a parte que vou elogiar o Lords Of Shadow 2. O combate evoluiu, os poderes de luz e sombras se tornaram armas específicas que contribuíram para uma maior diversidade de combos, porque é todo um conjunto de novas animações e alcances diferentes de ataque. Aquele fator estratégico do primeiro foi aprimorado.

Para aprender novos golpes e evoluir no combate, o jogador adquire habilidades em uma árvore de combos. Outro acerto de Lords Of Shadow 2 foi o visual de alguns personagens, conseguindo criar um meio termo que remete a Castlevania quanto roupagem mais ocidental do jogo anterior.

Os cenários de Lords Of Shadow 2 são interligados, dando uma certa sensação de Metroidvania, porém, mesmo com a beleza do castelo, não há muita variedade. Há poucos ambientes que realmente são memoráveis. Com Drácula nos tempos modernos é aí que as coisas complicam: pessoalmente me senti jogando um outro jogo, tanto os cenários quanto o visual dos inimigos me desencantavam, pois, são bem genéricos.

Passeando pela cidade e enfrentando demônios, por certos momentos me senti jogando o Spawn Armaggedon do Playstation 2 com gráficos melhorados. Apesar dos combates contra os chefes serem divertidos, essa falta de personalidade dos inimigos também vale para eles, com a exceção de um ou outro.

Falei da mudança das memórias do Gabriel para os tempos atuais, não é só isso que confunde, mas, tem umas certas situações que são só jogadas e eventos sem nenhum peso. O primeiro Lords Of Shadow dava para sentir uma jornada, que aqueles eventos, mesmo com desvio ou barrigas, aquilo tava indo para algum lugar. Aqui é só um monte de retalho.

Por fim, a conclusão épica da saga Lords Of Shadow anunciada pelos trailers ficou em aberto, a grande revelação do jogo que envolve a aparição de Alucard é impactante no momento, mais por conta do fanservice mesmo, porque quando se reflete os acontecimentos já se enxerga outro furo. Mesmo que haja a tentativa de usar o personagem mais famoso da franquia para salvar os acontecimentos do enredo, não é o suficiente.

A história que tenho com Lords Of Shadow 2 é o oposto da anterior, que comecei detestando e depois adorado. Para sua sequência comecei com expectativa e depois, antes mesmo de lançar, já estava decaindo.

O meu primeiro motivo de desconfiança foi a afirmação de que Lords Of Shadow 2 fecharia essa saga. Uma série de perguntas veio a minha mente: o quanto de elementos clássicos da série Castlevania seria incorporado após o primeiro jogo? Ou se a história de Gabriel seguiria um rumo totalmente diferente.

No meio do caminho, Mirror Of Fate, título para o Nintendo 3DS em 2013, foi lançado. Deu para notar rapidamente uma intenção da Konami quanto da MercurySteam em atrair os fãs da franquia que não curtiram o primeiro Lords Of Shadow.

O jogo, dentro das limitações de um portátil, buscou trazer a mesma dinâmica de ação de um hack n’ slash para uma perspectiva em 2D, e apesar de possuir um caráter exploratório, não é um Metroidvania. Em relação a seu enredo, Mirror Of Fate tentou encaixar três personagens clássicos da série no mesmo jogo, e nisso definiu que Alucard seria Trevor Belmont transformado em vampiro. Essa é uma decisão que, antes mesmo de lançar o jogo, eu já considerava errada, pois esses dois personagens são entidades dentro da franquia. E já demonstrava um certo desespero e falta de planejamento.

Apesar da narrativa de Mirror Of Fate ser até interessante, sobretudo o ponto de virada que ocasiona a transformação de Trevor em Alucard, percebe-se que o pessoal se preocupou mais em tentar agradar os fãs do que estabelecer a história com a mesma naturalidade que foi com o primeiro Lords Of Shadow.

Aí partindo para o jogo que tô falando aqui. O que pude perceber, comparando informações e entrevistas prévias com as impressões que tive com o produto final, é que cada mudancinha feita para Lords Of Shadow 2 foram baseadas inteiramente nas reclamações das reviews e dos jogadores, mesmo as pequenas.

Na maioria das entrevistas se falava que a câmera não seria mais fixa, o jogador poderia girar a câmera em 360 graus. O intuito de se distanciar de God Of War é válido, mas supervalorizaram muito algo banal e perdeu aquela parada que tanto elogiei no podcast anterior.

Algumas críticas sobre o primeiro jogo falavam da escalada: era pouco intuitivo saber onde Gabriel poderia agarrar. E, em Lords Of Shadow 2, colocam um auxílio visual muito paia que polui visualmente esses trechos de gameplay. Reclamavam dos loadings no primeiro jogo em cada fase, mas em Lords Of Shadow 2 existem salas que você fica um tempo considerável parado enquanto o outro cenário carrega, bem melhor ficar ouvindo a voz do Patrick Stewart narrando.

Parece que a MercurySteam e a Konami não souberam absorver as críticas, levaram todas à risca, sem um filtro, e implementaram as mudanças apenas para cumprirem esses requisitos. É importante e é algo básico mudar a partir de feedbacks, mas aqui é como se pitacos fossem mais significativos que proposta mais abrangente que se tinha, a parte de direção criativa, de planejamento no geral.

Dois dias depois do lançamento já jogaram sujeira no ventilador, funcionários revelando o ego do diretor do projeto, Enric Alvarez, que não havia uma comunicação interna dentro da MercurySteam, que o jogo tava sendo um Frankenstein, todo inconstante. Há relatos que o Kojima mal participou do projeto, e inclusive até do primeiro Lords Of Shadow. E fofoca espalhada na imprensa vai e vem né? Aí o diretor do jogo deu sua versão, que o desenvolvedor que falou dele fez isso por vingança. O mais importante é que ele afirmou que faria diferente a parte narrativa, algo mais semelhante ao primeiro sendo maior e melhorado, o que dá a entender do Lords Of Shadow 2 ter sido linear, porque ele fala de cada fase ser um novo ambiente. O diretor também afirmou que desde o início o jogo era planejado para ser o fechamento dessa saga.

Falei no podcast anterior que o Hideo Kojima auxiliou o projeto de revitalização de Castlevania a encontrar um rumo, isso, o próprio produtor, o Dave Cox afirma, ele que era o responsável pela ponte entre a MercurySteam e a Konami. Após o primeiro Lords of Shadow ter sido lançado, o Mirror Of Fate e o 2 estavam nas mãos do estúdio espanhol.

Diante do que a gente viu da Konami nessa época, os jogos que davam certo, tinham uma coisa em comum, a participação do Kojima. A Konami desde lá do meio da primeira década de 2000, passou a terceirizar a produção de jogos de suas franquias, Silent Hill foi assim e o título dessa franquia que tinha tudo para estourar na opinião geral foi o Silent Hills, que o P.T, o Playble Teaser, foi muito recebido gerando expectativas e advinha, teve a participação do Kojima, e aí depois foi cancelado. Hideo Kojima saiu da Konami depois do conturbado desenvolvimento do Metal Gear Solid V, e deixou de investir em jogos grandes. Até tem notícias de que voltaria a fazer AAA de suas franquias mais famosas, porém, tudo fica só nos rumores.

A informação concreta é que a Konami teve seu ano mais lucrativo da história de 2021 para 2022, que o valor bruto tirando taxas é equivalente a 3 bilhões de reais, o dobro do balanço anterior. Isso tudo passa por investimento em jogos de menor custo.

Enquanto isso, a MerceurySteam seguiu seu rumo e, aparentemente, o que ela entregou no Mirror Of Fate para o 3DS, atraiu a atenção da Nintendo. Em 2017, esse estúdio nos entregou o Metroid Samus Returns, a volta dessa série a uma gameplay em 2D, depois de 13 anos. E em 2021 lançou o Metroid Dread, que aí é um jogo totalmente novo da franquia, não um remake, que dá sequência a sua história principal.

Curioso como o mundo dá voltas, depois do que aconteceu no Lords Of Shadow, a gente olha a MercurySteam, um estúdio que trabalhou em Castlevania e Metroid, nessas duas séries clássicas e tem relações muito fortes entre si e são muito importantes para os videogames. Olhando agora, depois do tempo passado, de todos os desastres, é total uma mudança de visão desse estúdio atualmente.

E o último lado da história, que é Castlevania, ainda existe, confesso que mal prestei num último jogo que lançou, vi e achei um negócio estranho. Só que o nome Castlevania alcançou um sucesso pela sua série de animação da Netflix, que começou meio devagar e se uma ótima adaptação nas temporadas seguintes. No podcast anterior falei que a revitalização da franquia com o Lords Of Shadow visava ampliar a fanbase de jogadores, e é que essa série da Netflix acabou fazendo. Se me falassem em 2014 que algo assim aconteceria, diria que é loucura total, diante de toda incerteza que Lords Of Shadow 2 deixou após seu lançamento.

Apesar dessa saga ter sido curta, com apenas 3 jogos, bastante controversa, ela fica marcada. Serve de exemplo do contexto de sua época, das empresas japonesas ainda perdidas no cenário que havia nos videogames naquela geração de consoles, onde produções ocidentais haviam tomado um protagonismo. Essa saga é um estudo de caso de como fazer ou não um reboot de uma franquia de tanta história, como lidar com fãs e a relação com direção criativa, proposta de jogo, que acaba se tornando uma disputa de forças.

Castlevania Lords Of Shadow é um jogo que adoro, o Mirror Of Fate sou meio indiferente e o 2, na parte de combate é muito bom, só é um negócio todo inconstante, e, infelizmente, é isso que fica de impressão no final.

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Level Secreto

Transcrições dos episódios do podcast Level Secreto.