Castlevania: Lords Of Shadow — Level Secreto #66
Roteiro: Erick Oliveira
Castlevania Lords Of Shadow foi lançado em outubro de 2010 para Playstation 3, XBOX 360 e PC. Como havia feito com Silent Hill, por exemplo, a Konami terceirizou a produção desse Castlevania, pelo estúdio espanhol MercurySteam.
Mas é importante falar um pouco do contexto uns anos antes do lançamento. Na Tokyo Game Show de 2008 surgiu um teaser misterioso de um novo Castlevania em 3D, só aparecendo umas imagens do Alucard, prometido para PS3 e XBOX 360. Parecia ter o envolvimento do Koji Igarashi que a pessoa por trás dos jogos da franquia na época, tanto os títulos dos portáteis da Nintendo quanto os 3D que saíram para o Playstation 2. Só que esse novo Castlevania tão do nada surgiu quanto do nada sumiu, nunca mais se ouviu falar dele.
O que se sabe é que a Konami tinha a intenção de fazer um reboot da série para aumentar a fanbase dos jogadores, e nessa época havia alguns projetos em paralelo, talvez esse Castlevania do teaser fosse um deles. O que a MercurySteam estava desenvolvendo era uma nova IP e só depois que se revelou ser um Castlevania. No início, o projeto foi paralisado, o produtor foi ao Japão mostrar o que tinha sido feito e aí que surge o nome do Hideo Kojima na história, para ele dar uma orientação para esse projeto.
Com isso mudou o visual do protagonista, tinha uma ideia inicial de ser o Simon Belmont, que tem um visual bárbaro, e isso mudou, a partir disso humanizando mais o personagem que viria a ser o Gabriel Belmont. O Kojima deu uma liberdade para a MercurySteam até mesmo de definir o tom do jogo, mais sombrio e fugindo de uma temática que acreditavam ser juvenil.
Existe uma incerteza da real contribuição do Kojima nesse título, mas acho que não dá para negar que a narrativa mais cinematográfica é um dos indícios mais fortes de sua colaboração.
Castlevania: Lords Of Shadow é uma nova linha do tempo. O jogador assume o papel de Gabriel Belmont, membro da irmandade da luz que protege os inocentes de perigos sobrenaturais. A história se passa num período conhecido como O Fim dos Dias, no ano de 1047, no qual o equilíbrio entre a Terra e o Céu está instável. Além de provocar a ameaça de monstros, esse desequilíbrio impede com que as almas dos mortos encontrem paz, permanecendo eternamente presos no plano terreno. Entre essas almas está a esposa de Gabriel, Marie, que havia sido brutalmente assassinada.
Eventualmente, ela consegue entrar em contato com o marido, avisando que deter os Lords Of Shadow, os Senhores da Sombra, é o meio de salvar o mundo. Zobek que é outro membro da irmandade da luz, conta a Gabriel sobre uma profecia de que um guerreiro de coração puro poderia reivindicar os poderes dos Senhores da Sombra e trazer de volta o equilíbrio e, com isso, a esperança de trazer Marie de volta.
Aqui a gente tem a tentativa de trazer uma história épica, um personagem cuja redenção é trazer seu grande amor de volta da morte. Esse tom está presente em todos os cantos, desde metáforas na narrativa à mudança completa da trilha sonora em relação ao que se tinha anteriormente. Ela atua na ambientação quanto em retratar o próprio Gabriel, os seus sentimentos diante daquela jornada.
Os cenários de Castlevania Lords Of Shadow é algo que sempre achei incrível, é tudo muito caprichado, a todo momento o jogador é apresentado a uma ambientação diferente, não dá para dizer que é qualquer coisa e que não houve um esforço criativo consciente.
Engraçado como o passar do tempo nos deixa mais lúcidos, no lançamento desse jogo, o mais comum era observar críticas a câmera fixa, geralmente que ela limitava a visão do jogador. E no futuro passei a ver um ou outro falando que sente falta desse tipo de jogo, onde a escolha da câmera era um modo da direção artística ditar a narrativa, entregar subtextos, afinal como se diz, o jogador, no geral, é menos habilidoso para dirigir uma cena do que é especialista como um diretor.
E não digo nem só a questão cinematográfica da coisa, quem me conhece sabe que me atento muito a parte lúdica. Tem um trecho nos primeiros capítulos de Lords Of Shadow, que a câmera é bem distante do Gabriel, pegando um caminho de um precipício para o outro, e aí o jogador tem que ficar passando de umas formações rochosas tipo umas colunas irregulares até chegar do outro lado, escalando em volta delas, acho que tô falando os termos tudo errado, mas minha intenção é deixar a imagem mais clara possível. Esse pequeno trecho, poderia se feita com câmera livre, mas aí ia perder tanto esse senso de direção, essa ideia desse cara pequeno diante do ambiente, na sua aventura solitária contra o destino. Fora a questão de que a câmera fixa mascara imperfeições né, o jeito que a gente enxerga esse cenário é mais bonito do que seria se a gente visse mais coisas em volta, tal como uma fotografia quer dar destaque para um aspecto de um lugar, de uma coisa.
A câmera em Lords Of Shadow costuma chamar atenção intuitivamente ao objetivo do jogador, dando um prenúncio da ameaça que você pode encontrar, de uma forma bem sutil. Inclusive, em momentos de gameplay, o jogo te dá uma pista para uma situação importante que você vai vivenciar no futuro.
Porém, nem todas as qualidades narrativas são tão bem-feitas. Como deu a entender, Lords Of Shadow é dividido por capítulos, nos quais cada fase tem narração inicial de Patrick Stewart (professor Xavier nos filmes dos X-Men), que interpreta Zobek. A jornada de Gabriel é narrada como um livro, inclusive a própria interface de menus é como manuseio de páginas, isso ocorre também na seleção das fases. Muitos reclamaram que isso quebra o ritmo do jogo, pois envolve constantes loadings, e algumas fases são segmentos onde Gabriel sequer tem algum confronto.
As reclamações que vieram no lançamento do Lords Of Shadow, e isso até hoje, muito tem a ver com a sua diferença em comparação com os outros Castlevania. Uma delas que sempre achei ridícula é não estar ambientado em um castelo, de ter fases de dia, a pessoa que usa esse argumento não conhece nenhum pouco a série.
Mas algo muito destacado é as mudanças de ritmo, porque tem os momentos de ação, mas alterna nos segmentos de quebra-cabeça e nesses de calmaria, de só escalar, de ir para um lugar ao outro, e talvez seja isso que faça com que Lords Of Shadow seja um dos meus hack n’ slash favoritos, não é só ficar apertando botões e fazendo combo.
Porém, a maior crítica ao jogo é o fato de ser pouco autêntico para uma série tão clássica, pois se pode notar inspirações claras em God Of War, no combate; em Prince Of Persia, nos quebra-cabeças e escalada e em Shadow Of The Colossus, na luta contra chefes gigantescos. Só que, apesar disso, o jogo tem sua dinâmica particular. Em seu combate, Lords Of Shadow tem um fator estratégico além de esmagar botões, sua maior qualidade nesse aspecto não desempenhar os combos, mas em alternar entre os poderes da luz e das sombras.
O primeiro quando ativado permite com que Gabriel recupere sua vida ao atingir os inimigos, o segundo permite maior dano. Essa dinâmica força o jogador a tomar riscos, saber o momento certo para usar seus poderes, tanto para assumir uma postura mais cautelosa quanto que para ser mais agressivo, enquanto que para recarrega-los, tê-los novamente à disposição sempre necessário evitar danos.
Uma coisa bem simples que me faz gostar do combate dele é que o desvio é no gatilho e não no analógico da direita como God Of War e o Dante’s Inferno. E, assim, tirar o dedão dos botões de ataque para levar ao análogo sempre foi uma parada que perdia a fluidez, e desviar no RT e R2 para continuar atacando, para mim sempre foi muito mais gostoso. Então assim, tem diferenças na experiência do Lords Of Shadow, seja mais sutis, quanto na progressão do jogo, de passar de fases e ter capítulos, a mistura dos outros segmentos. A critica ao jogo é validar nisso e não só ficar apontando como cópia mal feita de uma ou outra inspiração que a MercurySteam se baseou.
O jogo oferece um enredo surpreendente, que quebra algumas convenções básicas de uma jornada do herói. Mesmo possuindo furos e ambiguidades que deixam a narrativa inconsistente em alguns momentos. Num todo a história é ótima, sobretudo se comparando com os outros jogos da série Castlevania. Alguns reclamam que Lords Of Shadow possui mais horas do que um jogo do gênero hack n’ slash precisa. Eu não me incomodo com isso, acredito que os momentos de quebra-cabeça, que o Gabriel tá indo de um canto a outro acompanhado da bela ambientação, oferecem um balanço bem orgânico com os segmentos de batalha.
Quem me ouve falando assim, soa como se eu sempre fosse um defensor de Lords Of Shadow, e assim, a minha primeira impressão não poderia ser pior. Eu tava de boa jogando um Zelda Twilight Princess, meu primo me chamou, que tinha o jogo no PS3, já sabia da existência dele, tinha lido em revistas, fui curioso para ver qual era. Aí me incomodei muito com tudo, de realmente não parecer um Castlevania, de olhar o visual e ver algo genérico, uma parada mais ocidental e quebrando a identidade. As minhas opiniões foram seguindo o padrão, é uma cópia do God Of War não sei o que.
Mas, tinha uma coisa muito importante nesse contexto. Quando você liga o jogo, ele começa da fase que tá salva. Eu comecei de umas das últimas, uma fase que é um quebra-cabeça supercomplexo, e o Gabriel já tinha uns upgrades, tava muito perdido. Lords Of Shadow permite com que você visite fases anteriores, até para completa-las com essas habilidades novas. Aí fui indo de uma para outra, totalmente desconectadas e a tendência realmente foi achar uma experiência estranha.
Aí quando comprei meu Xbox 360, que o jogo veio junto, que pude jogar do início, aí clicou melhor comigo. Nenhum outro jogo me ensinou tanto a perder preconceito com uma obra quanto o primeiro Lords Of Shadow. Como fã da franquia Castlevania, com a experiência de dezenas de jogos zerados, passei da decepção a entender qual era o objetivo em revitalizar essa série. A saga Lords Of Shadow começou com um jogo bem avaliado pela crítica, controverso especialmente pelos fãs da série, mas, tinha um terreno ali para germinar alguma coisa boa por um tempo. Ainda mais pelo que o final do jogo apresentava.
Só que, como vamos ver no episódio extra do Level Secreto, ela encerrou de uma forma bastante rápido e totalmente confusa. Afinal, por que a saga Lords Of Shadow não deu certo?