Ender Lilies: Quietus Of The Knights — Level Secreto #78 (Transcrição)

Autor: Erick Oliveira

Level Secreto
5 min readAug 12, 2023

Ender Lilies Quietus Of The Knights foi lançado em junho de 2021 para PC, Switch, Xbox One, Series S e X. No mês seguinte lançou para Playstation 4. De início adianto que o considero o melhor metroidvania que joguei pós Hollow Knight, ou seja, depois de 2017. E não é porque vamos falar de um título revolucionário, Ender Lilies pega referências básicas desse gênero, constrói uma estrutura refinada e acrescenta um ou outro elemento diferente. O lance é que Ender Lilies é tocante e instigante devido a sua atmosfera de fantasia melancólica.

O jogo se passa no “País do fim”, um local onde uma chuva passou a cair eternamente, ela foi transformando todos os seres em mortos-vivos violentos, conhecido como corrompidos. Sem nenhuma solução para lidar com tal tragédia, o reino acaba sendo destruído.

Nas ruínas, uma garota acorda. Seu nome é Lily e ela aparenta ser a única sobrevivente do lugar. Logo em seguida, surge o espírito de um cavaleiro, que passa a acompanha-la, protegendo-a das ameaças.

Essa garota está sem memórias, e junto com o jogador, ela busca entender seus objetivos e seus poderes enquanto explora esse território. Lily é uma sacerdotisa branca, que tem o poder de purificar os corrompidos e é isso que será feito ao longo do jogo, apesar da fragilidade de sua aparência e personalidade.

Tudo vai ficando mais claro, tanto a função da personagem, quanto o reino e sua corrupção. O jogador desvenda os mistérios através de documentos, descrição de habilidades, posicionamento de elementos do cenário, entre outras coisas.

Como já havia dito, o clima de Ender Lilies é melancólico do início ao fim, isso é muito sentido pela sua trilha sonora, que geralmente conta com o piano. As músicas que escalam mais, como as de alguns chefes, possuem um tom muito trágico.

Sobre o combate do jogo, não é a Lily que executa as ações, mas sim os espíritos que são invocados. Ela mais se movimenta pelo cenário, andando e pulando. O cavaleiro que citei realiza os ataques básicos. Ao longo do jogo, a garota adquire novas habilidades, vencendo mini chefes espalhados pelo reino, que ao serem purificados se juntam a Lily.

Essas criaturas nada mais são que versões aprimoradas de inimigos comuns, e além de fornecerem suas habilidades, também revelam um pouco de suas histórias. O mais interessante dessa coleta ser pelos mini chefes, é que evita a necessidade de farmar essas habilidades dos inimigos, como ocorre em alguns Castlevania.

Há três botões disponíveis para encaixar essas habilidades, de acordo com a preferência do jogador. Esse uso livre de botões é uma característica usada de forma semelhante no Ori And The Will Of The Wisps, por exemplo.

Há espíritos purificados que oferecem ataques que são contados, existindo um limite para seu uso. Em certo ponto de Ender Lilies, o jogador pode utilizar um golpe especial com o espírito principal, consistindo em um dano de muitos hits e que abrange uma área maior, além de visualmente impactante.

O jogador pode evoluir essas habilidades, pode ter durante a gameplay 2 arranjos com 3 espíritos equipados, que podem ser alternados. Esse sistema permite diferentes combos para personalizar a Lily conforme a preferência de cada jogador. A diferença entre as habilidades é mais evidente nos espíritos dos chefes principais, que alteram o ritmo e dano do ataque base.

O combate de Ender Lilies começa lento, contido, horizontal, e parte para algo mais ágil, dinâmico e vertical, como ocorre em outros metroidvanias. Uma forma prática e visível de reforçar a evolução da personagem. No entanto, há a falta de um peso maior nos golpes, a falta de feedback do acerto pelo som ou de efeito visual é uma lacuna que, pessoalmente, me impede achar satisfatório o combate de Ender Lilies.

Um elemento que soa meio deslocado é a evolução da Lily por níveis, porque a evolução de outros aspectos do jogo, dos espíritos que falei anteriormente, consegue comunicar com mais eficiência o quanto a garota está se tornando mais forte.

Mas como Ender Lilies é um metroidvania, preciso falar da parte exploração. O seu mapa é algo que chama atenção instantaneamente, pelo menos no meu caso. Ele é um monte de retângulo que se conecta por linhas. Quando a Lily encontra todos os segredos de uma área, ela muda visualmente de azul para amarelo.

Esses retângulos são as representações dos ambientes, mesmo que um cenário seja bem vertical, essas formas no mapa têm uma constância de padrões.

A escolha desse jeito de representar o mundo tem seus prós e contras. O lado bom é que o jogador vai focar mais sua atenção no que a Lily tá interagindo, mesmo que haja um mini mapa no canto da tela. Não há a necessidade de ficar conferindo se o personagem foi preenchendo os quadradinhos, como acontece nos metroidvanias convencionais.

O lado ruim disso é que o mapa é muito abstrato, aí quem é menos familiarizado com esse tipo de experiência de exploração, tende a ficar perdido, mesmo com o jogo informando de modo eficaz se uma área foi totalmente explorada ou não.

Como de regra em metroidvanias, explorar cada vez o mundo garante que o jogador vá tendo descobertas que o permita acessar finais diferentes e que sejam mais recompensadores.

Nesse gênero tão saturado nos dias de hoje, Ender Lilies é competente ao apresentar um mapa organizado de modo a instigar uma relação mais direta com o espaço explorado, fora o fato de o jogo não fornecer os objetivos claramente.

Apesar de utilizar conceitos comuns na sua narrativa, o tom melancólico que paira sobre os momentos-chave da trama, brinca com emoções que, na teoria, são conflitantes com a construção da fantasia de poder, algo tão fundamental na proposta dos metroidvanias.

A vitória nos jogos comumente está em realizar ações com sucesso num contexto de competição, e é curioso observar uma garota resolvendo conflitos utilizando a reconciliação como um de seus principais verbos.

Ender Lilies é um jogo que me capturou muito fácil pelas suas qualidades estéticas, e foi me cativando cada vez mais conforme eu ia observando quão redondinho são seus sistemas, favorecendo um sentimento de exploração do desconhecido, dentro do contexto que seu mundo foi apresentado.

Dito isso, a partir do ano seguinte, quando jogava os metroidvanias que vinham sendo lançados, só fui sentindo cada vez mais a falta desse cuidado na construção de uma experiência realmente memorável. De não só ir e voltar em salas, matando bichos, pegando itens, por simples instinto de jogador.

Durante essas experiências meio frustrantes fui lembrando dos jogos que me marcaram, e no meio deles veio a memória de Ender Lilies, vindo junto a sua atmosfera e, sobretudo, suas músicas.

Esse relato é uma prova que esse título só foi cada vez mais crescendo para mim. Não é a toa que é um dos metroidvanias, e jogos indies de maneira geral, que passei a recomendar com muita veemência, querendo que mais pessoas possam sentir o que senti de especial nesse mundo. Uma jornada tão triste, mas, que tem um porquê de tudo e deixa um otimismo agridoce no fim.

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Transcrições dos episódios do podcast Level Secreto.