A vacina anti-regresso

Lígia Oliveira
3 min readJan 6, 2019

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2018 acabou, mas a segmentação da esquerda que acredita na dicotomia de pautas identitárias e a política tradicional parece estar intacta. No meio desse fogo amigo há muitas certezas, pouca reflexão e nenhum diálogo.

Em dois dias de governo foram lançadas diversas pautas bomba, fim do Ministério do Trabalho e Ministério da Cultura, diminuição do aumento estimado do salário mínimo, integração da Coaf ao governo, ente outras. Dentre a esse caos a pauta carro-chefe foi a afirmação da ministra Damaris dizendo que: “Na nova era, meninas vestem rosa e meninos vestem azul”.

O que para alguns foi muito óbvio — para outros nem tanto — a fala da ministra indica os caminhos que a presidência irá trilhar; as pautas identitárias não terão vez e o conservadorismo será a nova lei.

Mas afinal, esse tópico tem importância em uma país onde os índices de fome, mortes, violência e analfabetismo têm um crescimento exponencial?

Metade da autodeclarada oposição apontou que sim, enquanto a outra metade que acredita que não. Essa guerra expôs uma realidade cruel — não sabemos lidar com um governo ultraconservador.

A roupa não importa, o discurso sim.

As pautas que correspondem a identidades foram negligenciadas por muitos anos durante as revoluções populares, e se tornaram um assunto apêndice das políticas públicas. Hoje, criar um binarismo em torno de economia e identidade é deslegitimar o trabalho de movimentos políticos que tiveram um aumento exponente no cenário brasileiro.

Precisamos aprender a separar o joio do trigo e entender que pautas identitárias é uma parte importante da luta da oposição, mas não podemos deixar que ela se torne cortina de fumaça.

O enfraquecimento desses movimentos, já acenado pelo novo governo, pode resultar não apenas na negligência para comunidades como LGBT, mas também na perda de direitos adquiridos — por mais irreal que isso pareça. Além disso, questões políticas são inseparáveis de questões sociais. Há uma gama de data que as questões identitárias como machismo e racismo interferem de modo significativo na economia e segurança pública.

Por esses motivos, cheguei à conclusão que este debate não é apenas importante como crucial para prevenir que problemas como violência, fome, etc… agravem-se. Porém, ele está sendo feito de modo equivocado, por causa da surpeficialidade em torno das discussões.

Qual é a receita?

Precisamos deixar a liquidez do discurso e aprofundar naquilo que ele representa. É preciso entender os motivos e as ideias por trás do discurso da Damaris, do sumiço do Queiroz, do populismo barato, da guerra contra imprensa do atual governo e outras questões que ainda estão por vir. A partir daí combater a doença e não os sintomas.

Agora, mais do que nunca, precisamos ser mais profundos no diálogo e compreender sobre o que estamos falando. Estamos em um momento em que pessoas estão soltando conceitos ao léu sem a menor consciência do que ele representa, fazendo de tudo para ganhar o argumento– vide Kéfora falando sobre mainsplaning.

É importante entender a estratégia da Situação e jogar o jogo de forma justa, tirando os muros da academia e aproximando o conhecimento teórico a práxis.

A oposição não deve deixar de lado as pautas que ferem as minorias. A receita é saber dialogar e lutar contra toda e qualquer opressão.

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