A história de um conselho que fez tudo mudar

Luana Reis
A arte de fazer dar tempo
7 min readMay 12, 2019

Você já recebeu um conselho de alguém, ou teve alguma conversa que te impactou profundamente e provocou uma grande mudança de perspectiva? Bem, não sei qual sua história, mas imagino que eventos como esse não aconteçam com frequência, não é mesmo?

Como breve apresentação, para contextualizar, sou estudante de Medicina da UFMG, hoje estou no 10º período. Essa história que irei contar se passou na transição entre o 5º para o 6º período do curso, no início do ano de 2017.

Agora que já nos situamos no espaço-tempo, vou te contar uma coisa marcante sobre mim: a minha principal área de interesse na medicina é a psiquiatria! Antes mesmo de entrar para o curso de medicina ou ter certeza de que era esse caminho que eu iria trilhar em minha vida, eu já sabia que eu gostava de estudar e entender sobre psicologia, comportamento humano e saúde mental. Pois bem, nesse momento, eu havia acabado de passar pela disciplina de Psiquiatria do 5º período. Imagine só a expectativa com a qual eu iniciei essa disciplina? Exatamente, muito alta! E o impressionante é: a experiência atendeu às minhas expectativas! Ufa, não é mesmo? E um dos principais fatores responsáveis por isso foi o professor da minha turma (em breve revelarei sua identidade, mas não agora). Eu não era a única a pensar assim em minha turma, de fato a relação professor-alunos foi bem construída, potencializando o aprendizado de todos, mesmo daqueles que não tinham grande interesse pelo tema.

E qual foi o resultado disso? Logo que a disciplina terminou eu pensei: “Nossa, eu não posso perder a oportunidade de entrar em contato com esse professor e buscar pela participação em algum projeto com ele!”. Dito e feito. Procurei pelo professor, conversamos e logo ele me ofereceu uma oportunidade de participar em uma pesquisa muito legal! Sim, era legal. Seria exatamente o que eu queria? Não totalmente, e eu sabia que não, pois envolvia análises em bancada de laboratório, biologia molecular e, devido à minha experiência na primeira iniciação científica, eu já sabia que eu não gostava tanto. Mesmo assim, eu pensei: “Não posso desperdiçar essa oportunidade agora!”. E aceitei, para início imediato das atividades.

Eu só não contei um detalhe bastante relevante: eu estava de férias! Cronologicamente, estávamos em janeiro de 2017, e as aulas só retornariam em março na faculdade. Você pode ter pensado: “Por que você não estava descansando, viajando, dormindo e se divertindo?”. Esse é um grande ponto, mas em breve aprofundaremos melhor, pois para você entender a gravidade da situação, eu vou lhe contextualizar de como estava minha vida nesse momento do curso: eu já estava em uma série de projetos! Eu ainda fazia parte de uma iniciação científica (sobre genética da obesidade, a qual estava prestes a concluir), coordenação de liga acadêmica (especificamente a Liga Acadêmica de Práticas em Saúde baseadas em evidências), coordenação de grupos de estudos (do GEDAAM — Grupo de Estudos em Didática aplicada ao Aprendizado da Medicina, instagram @gedaam_), entre outras coisas que não me lembro agora.

É, eu sei. Se já estava intenso antes, imagina agora. O ponto é: eu percebia isso? Não! Bem, parcialmente. Eu pensava: “Quero aproveitar as oportunidades boas, construir um bom currículo e, assim, serei uma boa médica! Acho que vou dar conta!” É isso mesmo? O que precisamos para sermos bons profissionais? No caso da medicina, o que de fato é essencial para sermos bons médicos?

Pois bem, eu tentei. Realmente tentei fazer dar certo. Eu me dava uma série de justificativas mentais e aparentemente racionais do porquê aquilo valia a pena. Até que… percebi que não valia! Eu estava em pleno início de ano e já estava cansada! Nas férias! Foi aí que caiu minha ficha e, dolorosamente, tomei a decisão: tão rápido quanto começou, já vai terminar, e vou marcar uma reunião com o professor para avisá-lo que, apesar do meu interesse genuíno, não poderei participar da pesquisa proposta.

E, como gosto de dizer: dito e feito. Reunião marcada. Aviso-lhe que o clímax da história está pra chegar!

Chegando na sala do professor, sentei e expliquei a minha situação (um resumo de tudo que acabei de contar para vocês) e contei que não poderia continuar no projeto que ele havia me convidado. Ele ouviu calmamente, atento, e então me falou: “Luana, onde você quer chegar com tudo isso?”

Meu primeiro pensamento foi: “acho que ele não entendeu que eu to dizendo que vou sair…”. E respondi: “Bem, estou tentando dizer que, infelizmente, não poderei continuar na pesquisa porque estou sobrecarregada…”.

E então ele me disse: “Não, não é isso. Onde você quer chegar fazendo todas essas coisas?

“Hum… eu estou buscando fazer a melhor graduação possível, construir um bom currículo, depois quando eu formar, poder fazer uma boa residência, enfim, ser uma boa profissional. Eu gostaria de poder olhar pra traz e ficar satisfeita por ter aproveitado o período de minha graduação…” — Respondi, um tanto quanto intrigada.

Entendi… e quantos anos você tem?” — perguntou ele, com um olhar que eu não consegui decifrar.

“23 anos…” — eu disse.

“Então, quando eu tinha mais ou menos a sua idade e estava também no 6º período, minha situação era parecida com a sua: eu estava fazendo parte de monitorias, projeto de extensão, liga acadêmica… enfim, estava envolvido em um monte de coisas também! Nessa época, em um diálogo semelhante que eu tive com meu tio, ele me perguntou a mesma coisa que eu lhe pergunto agora, e adivinha só: minha resposta foi igual a sua! Muito parecida mesmo!

Agora, eu vou te dizer o que meu tio me disse naquela época, e hoje eu vejo que é verdade.

Quando na sua vida você vai ter a oportunidade de ser jovem, viver sob o sustento dos pais, não ter que cuidar da casa, dos filhos, preocupar com trabalho e tantas outras coisas? Muitas vezes nós nos matamos por coisas que achamos que vai valer a pena, vai ser legal, produtivo e que aprenderemos muito, mas… às vezes chega lá na frente e nem faz tanta diferença assim, apesar do grande sacrifício. Quantas coisas você tem deixado de fazer? E tantas outras você tem deixado de lado? Você já parou para pensar que esse momento em sua vida é único? E não volta mais?! Por isso, eu vou lhe dizer: vá se divertir, vá ao teatro, ao cinema! Vá viajar, ler livros, conhecer o mundo que existe por aí para além da medicina!

E quando for um melhor momento, você poderá voltar aqui pra a gente conversar, as portas estarão sempre abertas.”

Nesse momento, eu só consegui olhar fixamente pra ele, na tentativa de conter tantas as emoções e os pensamentos que me vinham na mente. Uma mistura de alívio com “Oh meu deus!”. Como posso ter deixado tanta coisa de lado? O meu querido violão e minha paixão por música? Foi sendo abandonado aos poucos desde o início do curso. E os livros que gostava tanto de ler? Já não lia mais. E os momentos com a família? Às vezes abria mão pra poder estudar. E aí? Onde quero chegar com tudo isso? Exato. Eu voltei a pergunta pra mim mesma. Aquilo me tocou fundo. Me fez rever todos os parâmetros, todos os paradigmas.

Agora, como prometido: o nome desse professor de Psiquiatria é Frederico Garcia (Instragram @fredgarciabh) e, após essa conversa, passei a ter grande admiração e gratidão por ele, por tantos ensinamentos, tanto acadêmicos quanto para a vida, pois boa parte do meu percurso que se seguiu foi completamente modificado a partir dessas reflexões, em torno das prioridades em minha vida e sobre a valorização do momento presente.

A partir daquele momento, daquele ano, decidi que muita coisa iria mudar. E mudou. Por meio de estudos sobre produtividade, gestão do tempo, principalmente junto ao GEDAAM (o qual foi mencionado acima, um grupo o qual faço parte até hoje e também teve grande impacto em minha vida), e de reflexões internas sobre o que é de fato essencial para mim, pude, aos poucos, adequar as minhas escolhas às minhas prioridades. E qual foi o principal aprendizado que levei de tudo isso e que gostaria de compartilhar com vocês:

“É preciso dizer NÃO para aquilo que não é essencial para que possamos dizer verdadeiramente SIM para aquilo que realmente importa.”

Você pode ter se perguntado: “Quais foram essas coisas que mudaram?” Bem, vou colocar aqui algumas fotos de momentos que foram recuperados em meu dia a dia!

De toda forma, vou enumerar aqui algumas das principais mudanças: Eu voltei a tocar violão e cantar, voltei a ler livros, fiz da atividade física um hábito fixo na minha rotina, passei a valorizar os momentos em família e com os amigos, busquei estar plenamente presente. E até hoje, essa busca se mantém! De tempos em tempos, eu me recordo disso, e dessa conversa. Algumas vezes compartilhei com alguns colegas, na intenção de proporcionar para eles o benefício que eu tive. E agora estou compartilhando aqui, com o propósito de amplificar ainda mais esse insight:

“A felicidade é aqui e agora. Ela não está no amanhã!”

Gostou dessa história e gostaria de trocar alguma ideia sobre? Seguem meus contatos: @luana_reis_m (instagram); luanareism@gmail.com.

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Luana Reis
A arte de fazer dar tempo

Releituras da vida. A arte da busca pelo equilíbrio entre o que importa e o que é necessário.