Foto tirada durante a palestra pela assessoria de relações públicas da Concentro

Quebrando o status quo

Como as EJ’s podem ser inovadoras

Lucas Lo Ami

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No final de 2014 tive o prazer de falar sobre inovação para a galera da Nação Concentro. A equipe da federação me propôs o desafio de fazer a palestra magna do último Sábado Júnior do ano com o seguinte direcionamento: “Sem medo de inovar”. Desafio dado é desafio aceito e acredito que pudemos ter um excelente momento juntos. Nesse texto vou revisar rapidamente os pontos que abordei na apresentação adicionando alguns detalhes, dicas para vocês que querem começar a utilizar as metodologias apresentadas no evento (gamification, canvas, design thinking) além de referências que possam ajudar as empresas juniores (EJ’s). O texto vai ser grande, então prepara um lanche antes e fica confortável na cadeira.

A apresentação “Quebrando o status quo” possuía três objetivos: trazer um conceito simples e compreensível do que é inovação, listar os elementos necessários para ela acontecer no seu ambiente de trabalho e como identificar as dores dos usuários para criar uma solução inovadora. Acredito que esses três pontos foram muito interessantes para não apenas compilar, mas interligar o conhecimento que os participantes do evento ganharam durante o mesmo (workshops, apresentação de cases, etc.).

O que é inovação?

O conceito de inovação sempre foi um tanto quanto obscuro pra mim e quanto mais eu converso com as pessoas mais me parece que existe um quê de subjetividade em torno desse conceito (já parou pra pensar que às vezes o que é inovador pra você não é inovador para o seu amigo?).

Nas minhas leituras descobri um vídeo do David Brier chamado “What is innovation?” que explica de forma simples o que é inovação. Esse conceito foi o que utilizei na apresentação.

Ademais, diria que inovação está relacionada a criar soluções que sejam simples e repetíveis. Acredito que a simplicidade está relacionada a facilidade de compreensão/aprendizado (ex: o iPhone, quando foi lançado trouxe consigo uma experiência de usuário excelente, que tornava o uso do mesmo quase intuitivo). Repetível quer dizer que a empresa consegue reproduzir essa solução (produto ou serviço) sem depender de algum elemento específico que possa deixar a empresa (ex: depender de um membro mais experiente para executar a solução). Para as empresas juniores, diria que esses dois conceitos são um must have.

Para aqueles que se interessarem em outras definições, características de inovação e também estudos de caso eu recomendo a leitura do blog do Matt Hunt ou ler alguns materiais do Clay Christensen, que fala de inovação disruptiva.

Três elementos necessários para haver inovação

Na apresentação também abordei três pontos necessários para acontecer inovação: abertura a novas ideias, experimentação e tolerância à falha.

A abertura a novas ideias está muito relacionada a postura (que deve ser evitada) do matador de ideias. Sabe quando você está numa reunião discutindo sobre o futuro da sua EJ, ou sobre um produto ou serviço, ou até mesmo quando você está fazendo um trabalho em grupo na universidade e na hora em que você dá uma ideia nova e que você sente que é construtiva vem alguém e fala: “Não, não acho que isso esteja certo, porque o planejamento não fala isso, porque não acredito que seja assim, porque as coisas já acontecem dessa forma, …”. É exatamente isso que é matar uma ideia. Ao fazer isso, você mitiga as possibilidades de inovação, pois nas ideias mais “malucas” pode estar uma grande solução.

Experimentar significa colocar suas ideias na prática. E neste quesito, expus duas palavras-chave: protótipos e MVP’s (minimum viable products). A ideia principal por trás das mesmas é criar a versão mais básica possível da sua solução e que te permita gerar valor ao seu cliente e ainda receber um feedback do mesmo. Talvez ela seja um pouco feia, não represente tudo aquilo que você gostaria de mostrar, mas lembre-se que o mais importante é aprender sobre seu cliente. Vou explorar mais detalhadamente esse ponto na seção “Experimentando com Build — Measure — Learn” abaixo. Por hora, indico a leitura desses dois textos do Paul Graham: The Hardest Lessons for a gStartup to Learn e Do Things that Don’t Scale. Também recomendo a leitura do texto No One Cares About Your Perfect Plan, da Laura Wadden

Por fim, temos a tolerância a falhas. A explanação desse quesito pode ser feita através de um exemplo bem simples. Imagine que estão no mercado de trabalho, talvez em uma grande empresa. Não se esqueça de que estamos inseridos em um contexto de grande competitividade, dinamismo e pressão por resultados e lucro. Neste cenário, a falha é sinônimo de ________? Provavelmente você pensou em coisas como: erro, demissão, perda de credibilidade, ser mal visto pelas pessoas, etc. Talvez você mesmo enxergue situações semelhantes na sua realidade. Quando você tem essa intolerância à falhas ou uma cultura que penaliza severamente as mesmas, você gera um medo grande nas lideranças e nos membros da empresa para tomar riscos. A inovação está bastante ligada à tomada de riscos e não necessariamente à gerência dos mesmos (vide livro Change By Design do Tim Brown).

Vale frisar aqui que não se deve errar por errar ou simplesmente usar o mindset de tolerância à falhas para fazer besteiras atrás de besteiras na empresa. É preciso que suas falhas te conduzam a um aprendizado e te levem a dar um próximo passo. Nesse quesito, recomendo a leitura desse texto do Mat Hunt: Innovation Excelence — Using the Innovation Pipeline to Drive Growth and Address Failure.

Primeiros passos no Design Thinking

Se você se identificou com o Design Thinking, curtiu o workshop que o Gabriel ofertou no Sábado Júnior mas ainda está com dúvidas em relação a como aplicar a metodologia na sua EJ no dia-a-dia, vou apresentar algumas dicas aqui que eu utilizei no passado.

Evite criar um processo super rígido e demorado. Quando eu utilizei o Design Thinking na minha (falecida) startup pela primeira vez, optamos por realizar o double diamond em uma tarde. Dividimos igualmente o tempo para cada metade do processo. Com o tempo, percebemos que o formato de uma tarde não estava mais atendendo às expectativas, então remodelamos o tempo dedicado à metodologia. Começar pequeno e aos poucos lhe permite aprender e adaptar gradativamente a metodologia à sua realidade.

Use elementos de papelaria para tornar o processo mais visual. Post-its, quadros brancos (ou negros), pincel e lápis de cor são bem vindos nesse momento. Escrevam suas ideias em pequenos post-its, colem-nos na parede ou nos quadros. Dessa forma as ideias de todos ficarão em um lugar no qual todos possam ver e a mistura das mesmas ajudará você a não se prender apenas à sua própria ideia. Desenhos e/ou esboços também são bem vindos para ilustrar sua ideia.

Colocar-se no lugar do cliente é o segredo da coisa. Imaginar como é a realidade do cliente, como ele se sente, o que faz, como sua realidade vai mudar a partir da utilização da sua solução, achar a maior das dores do mesmo, etc. são alguns dos pontos que ajudam você a compreender mais sobre quem é o seu cliente. Lembre-se que a abordagem do Design Thinking é user-centered (focada no usuário final), então para compreendê-lo é preciso desenvolver empatia com o seu cliente. Algumas ferramentas podem ajudá-lo nesse momento: Mapa de Empatia (vejam também esta referência) e Jornada do Herói (sim, é aquela do Joseph Campbell).

Quem tiver interesse em se aprofundar na temática do Design Thinking, recomendo a leitura do livro Change By Design, já citado anteriormente nesse texto.

Experimentando com Build — Measure — Learn

Alguns parágrafos acima eu falei que a inovação está muito relacionada à experimentação. Para isso, o Build — Measure — Learn (BML) e seus princípios aparecem como uma forma de auxiliar nessa atividade. Mas afinal, o que é esse tal BML? Que novidade é essa? Bom, não há novidade alguma, é apenas o método científico explicado de outra forma. Sabe quando você vai escrever/ler um artigo científico ou escrever sua tese de graduação, mestrado? Lembra que esses documentos científicos são divididos geralmente em: introdução, objetivo, metodologia, experimento e conclusão? Pois é exatamente assim que funciona o BML. Para ilustrar esse conceito, vou utilizar o case do Dropbox (recomendo que leiam o texto do link antes de seguir para os próximos parágrafos).

O primeiro passo pra começar a experimentação é definir o objetivo do seu experimento, as hipóteses que deseja validar e suas métricas (indicadores). O objetivo do Dropbox era responder a pergunta (hipótese): será que as pessoas gostariam de um serviço de armazenamento na nuvem com uma excelente experiência de usuário? Em suma, diria que hipóteses são as perguntas que desejam responder em relação ao seu negócio (ex: o segmento de cliente que escolhi é correto? Meu mercado é suficientemente grande? As pessoas estão dispostas a pagar pelo meu produto? etc.).

Depois, é preciso elaborar um experimento simples e efetivo. Por simples, entenda “de fácil preparação”. Por efetivo entenda “que responda às minhas hipóteses”. O Dropbox criou um vídeo muito simples que explicava como a plataforma funcionaria para atrair os early adopters. Essa versão de experimento, que pode ser rapidamente criada e dar-lhe feebacks em relação aos seus clientes é o que chamamos de Minimum Viable Product. Esta é a etapa de Build (construção).

Agora é hora de mensurar os resultados de seu experimento. Coletar dados é um passo crucial neste ciclo, pois ele vai permitir a você verificar se suas hipóteses foram validadas ou não. No caso do Dropbox, uma das métricas utilizada pelo mesmo foi o número de cadastros na lista de espera pela aplicação. Aqui é válido ressaltar que as métricas utilizadas devem ajudar a responder suas hipóteses definida na primeira etapa. Esta é a etapa de Measure (mensuração).

Por fim, é hora de aprender com os resultados do seu experimento. No caso do Dropbox, houve cerca de 75 mil cadastros na lista de espera pela plataforma. Isso é uma métrica que demonstra o interesse das pessoas na solução proposta pela empresa. A partir desse interesse, os fundadores da empresa puderam ter certeza para dar um passo adiante, de construir efetivamente a plataforma do Dropbox. Essa é a etapa de Learn (aprendizado).

Este ciclo pode ser executado diversas vezes dentro da sua EJ. A ideia é que você execute-os no menor intervalo de tempo possível, para que tenha sempre um processo de aprendizado rápido. Além disso, diminuir o espaço de tempo para os experimentos ajuda a focar apenas no que é mais importante para o experimento. Recomendo começar com experimentos que durem no máximo um mês ou um mês e meio dentro de suas EJ’s. (mesmo mindset que expliquei no Design Thinking -> começar pequeno e ir crescendo aos poucos).

Caso queira se aprofundar na temática, recomendo muito a leitura dos livro The Lean Startup, do Eric Ries e o Running Lean, do Ash Maurya. O Experiment Board é uma excelente ferramenta que lhes ajudará a desenhar cada um de seus experimentos.

O Canvas sem Bullshitagem

Nesses últimos dois anos e meio tive oportunidades de utilizar o canvas (seja o Business Canvas, seja o Lean Canvas) nas iniciativas nas quais me envolvi. Das vezes nas quais utilizei a ferramenta e também naquelas em que ajudei as pessoas com o seus, o principal aprendizado que tive foi que o canvas é uma ferramenta de prototipação do seu negócio. Pode parecer algo bobo, mas isso implica em diversas ações.

Não perca um tempo gigantesco tentando deixar seu canvas perfeito. Construa um canvas que represente a ideia principal do seu negócio. Quando tiver uma visão geral de todas as áreas do canvas, get out of the building, execute um experimento que lhe permita aprender se o seu modelo de negócios é válido ou não. Lembre-se, você está construindo um protótipo que vai ser testado e lapidado e não um plano de negócios definitivo.

Para as EJ’s que estão criando um produto ou serviço novo para lançar ao mercado, esta é uma excelente ferramenta para ter uma visão de negócios em relação a solução que estão desenvolvendo. Ademais, esta visão é melhorada também a partir da compreensão de alguns modelos de negócios já existentes, que podem se aplicar à sua realidade. Nesse sentido, recomendo a leitura rápida deste artigo.

Descobrindo Unk Unks

O último ponto que abordei na minha apresentação é uma sugestão de primeiro passo pra você empresário júnior que está querendo inovar. Muitas empresas falham não pela falta de profissionais qualificados ou infraestrutura, mas sim por não compreenderem as necessidades de seus clientes. Acredito que uma empresa que precisa inovar deveria solucionar problemas reais das pessoas e não necessariamente empurrar um novo produto goela abaixo nelas.

Há mais ou menos um ano e meio, o Roberto Mascarenhas (por sinal, um pós-júnior) me indicou a leitura do texto Discoreving Unk Unks, que me ajudou muito a compreender os clientes da minha (falecida) startup. O texto explica por que técnicas como formulários ou grupos focais não conseguem identificar as necessidades escondidas dos clientes (aquelas que guiam a inovação). Também apresenta uma técnica chamada Long Interview que ajuda a identificar tais necessidades. Eu resumiria ela em três pontos principais que me ajudaram bastante:

  1. Sua mãe não conta: procure não entrevistar pessoas conhecidas ou muito próximas a você. Elas tendem a dizer sim quando querem dizer não. Isso não lhe ajudará a validar sua ideia
  2. Perguntas abertas: evite perguntas cuja resposta seja sintética demais, como “sim”ou “não”. Use perguntas abertas, que permita ao entrevistado falar como se sente e age em situações nas quais a sua solução será utilizada. Assim você entenderá onde estão as necessidades do cliente ou se elas realmente existem.
  3. Linguagem corporal: em alguns momentos a linguagem corporal dará a resposta verdadeira a você. Às vezes seu entrevistado dirá “sim” fazendo uma cara de “er…talvez”, Observar o comportamento do entrevistado é importante.

Conclusões

Bom, espero que esse texto sirva como um complemento e um direcionamento para você empresário júnior que quer fazer da sua EJ uma empresa inovadora. Revisei neste texto o conceito de inovação, os elementos básicos para que ela aconteça, dei dicas sobre como utilizar algumas técnicas e fechei abordando o Unk Unks.

Nesse singelo texto busquei explorar um pouco das experiências que tive no passado, além de elementos que aprendi nas minhas leituras. Acredito que toda empresa júnior tem um potencial imenso de impactar positivamente na sociedade. Espero que minha contribuição potencialize sua atuação.

Caso ainda tenham dúvidas, não hesitem em perguntar por Facebook ou por email.

Se sentiram falta de algum ponto, basta comentar aqui que abordo em um novo texto.

Slides da apresentação “Quebrando o Status Quo”

Valeu Nação Concentro, vocês são FODAS DEMAIS!

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Lucas Lo Ami

Cientista de dados, apreciador de fanta uva, jogador noob de CS2 nas horas vagas. Busco ciência para explicar o mundo.