Entrevista com Rodrigo Lopes

Luiza Soares
7 min readJun 9, 2016

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Rodrigo Lopes é atualmente o coordenador de produção do jornal Zero Hora, também atua como correspondente internacional do jornal e comentarista da Rádio Gaúcha. Formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 2001, o jornalista tem especialização em Jornalismo Literário pela Academia Brasileira de Jornalismo, e em Jornalismo Ambiental pelo “International Institute for Journalism”, de Berlim.

Começou no jornalismo como auxiliar de Redação (“Office boy”), no jornal Zero Hora, em 1996. Mas após três anos, se tornou o redator da editoria Mundo do jornal, e em 2008 assumiu a apresentação do programa Camarote, da TVCOM, emissora com transmissão em UHF e TV a cabo do Grupo RBS.

Rodrigo Lopes já ganhou diversos prêmios com suas coberturas internacionais, como a eleição na Argentina, em 2003, que lhe rendeu o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei da Espanha, e em 2006 foi o único jornalista brasileiro a testemunhar guerra na Líbia pelos dois lados do front, sua série de reportagens foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo, daquele ano. É autor do livro “Guerras e Tormentas”, editado pela Besouro Box, que em 2012, a obra foi finalista do Prêmio Jabuti na categoria Reportagem.

Durante a nossa entrevista, Rodrigo mostrou a redação do jornal ZH e apresentou onde fica cada editoria do veículo. Na mesa central, é o local em que trabalha junto com outros editores-chefes e, onde controlam o índice de visitantes no site do jornal, quais matérias atraem mais leitores, se é acessado por meio das redes sociais, entre outros. O jornalista deu alguns conselhos para pessoas, assim como eu, que querem seguir a carreira do jornalismo internacional.

Repórter: Como foi que você chegou ao Grupo RBS?

Rodrigo Lopes: Eu entrei na RBS como “Office Boy” da redação, no primeiro semestre da faculdade em 1996. Eu vim fazer um trabalho que tinha que escolher três jornalistas para entrevistar, eu entrevistei o Silvio Martins, o Diogo Olivier e o João Borges. E aí no meio da conversa eu vi que tinha uns estudantes que trabalhavam aqui e ai perguntei “Como faz para trabalhar aqui?” então me disseram para fazer uma ficha, daí no dia seguinte me convidaram para fazer um teste aqui. E era legal, eu gostava, então foi meio que trocava a tinta da impressora, papel. Era bem braçal, mas eu vi aquilo já como uma maneira de começar na profissão, então depois de seis meses fui para o controle de Baixamento de Fotos, que era recortar negativo de foto para mandar scanear, já que não era digital ainda.

Repórter: Qual foi a sua primeira reportagem?

Rodrigo Lopes: Quando me formei, me convidaram para trabalhar como tradutor da editoria de Mundo, que já era mais ou menos o meu sonho, ser correspondente, viajar pelo mundo, cobrir guerras. Daí como tradutor era simplesmente traduzir as reportagens que vinham do “The New York Times” e do “El País”, mas eu não me contentava só com aquilo, eu queria fazer reportagens também. Então sempre que podia eu oferecia umas matérias, como eu fiz quando eu fui para Bariloche de férias, e voltei e disse “Me deixa fazer uma matéria para o caderno Viagens sobre isso”, então essa acabou sendo minha primeira reportagem, uma matéria de turismo para o caderno Viagem, sobre Bariloche.

Repórter: Quantas línguas você fala?

Rodrigo Lopes: Eu só falo Inglês, Português e Espanhol, mas eu acho que é fundamental para alguém que quer ser correspondente, que quer viajar pelo mundo, aprender outro idioma além destes, estes são básicos.

Repórter: Tem alguma outra que gostaria de aprender?

Rodrigo Lopes: Eu gostaria de aprender, por exemplo, Mandarim, que é muito difícil, Francês que é muito importante, principalmente na área internacional, pois a diplomacia passa pelo francês e o Árabe, que hoje cada vez mais o Oriente Médio é o centro das atenções dos conflitos.

Repórter: Você viaja sozinho ou acompanhado de um cinegrafista?

Rodrigo Lopes: Em geral, eu viajo sozinho, porque eu acabei desenvolvendo essa técnica de fotografar, gravar em vídeo, gravação por telefone, escrever o texto, fazer o blog. Eu gosto muito da questão da imagem, gosto de fazer isso, mas eu não sou um profissional da imagem, então eu sinto falta de ter um fotógrafo comigo, um cinegrafista comigo, ás vezes não apenas pela técnica, mas por que tu precisa de um companheiro em situações de crise.

Repórter: E quando você viaja acompanhado, é você quem escolhe o cinegrafista?

Rodrigo Lopes: Em alguns momentos eu viajei acompanhado e eu escolhi os colegas com quem eu gostaria de trabalhar. Eu fui pro Haiti com o Fernando Heck, cinegrafista da RBS TV, eu cobri a morte do João Paulo II com o ele, mas poucas vezes eu acho. Porque acaba sendo economicamente mais viável pro veículo de comunicação mandar um profissional que faz tudo.

Repórter: Teve alguma cobertura internacional em que sentisse mais medo, sentiu mais tensão?

Rodrigo Lopes: Sim, primeiro, acho que o jornalista que diz que não tem medo está mentindo, porque isso é natural do ser humano e precisa esta nas matérias. Por exemplo, o momento de forte tensão foi em 2006, na Guerra do Líbano, entre Israel e Líbano. Na fronteira, o grupo terrorista extremista lançava foguetes pro lado de cá e o exército israelense lançava pro lado de lá, e eu estava no meio de tudo, foram uns 15 minutos de bombardeio.

Repórter: Como lidar com a adrenalina de estar no momento do acontecimento?

Rodrigo Lopes: A adrenalina te leva a querer ver mais, mas é aquela coisa, tem que pensar assim “Quero ver mais? Preciso estar justamente no local onde as coisas estão acontecendo? Ou eu posso ver de uns 200 metros de uma forma mais segura?”. E eu acho saudável essa relação, em que tu tem medo e ao mesmo tempo a adrenalina te leva a querer ver mais, é esse equilíbrio que eu acho que é saudável.

Repórter: É importante o repórter estar no momento do acontecimento?

Rodrigo Lopes: Eu acho que todo jornalista internacional quer estar onde as coisas estão acontecendo. O prazer de testemunhar a história acontecendo na tua frente, isso é o mais legal, pode ser uma história pequena ás vezes. Então testemunhar a história acontecendo na tua frente, isso ninguém vai te tirar, é uma coisa que quando tu volta, tu pensa “eu não acredito que tenha vivido essas histórias”, é muito legal. Então é o que dá mais prazer, mais do que dinheiro, mais do que conhecer países, é quando tu vê a coisa acontecendo na tua frente.

Repórter: Em 2003, você ganhou o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei da Espanha, por cobrir as eleições da Argentina e foi finalista do Prêmio Esso em 2006. Hoje, você cobra mais de ti mesmo para ganhar mais prêmios?

Rodrigo Lopes: Eu acho que jornalista não faz matéria para ganhar prêmio, pelo menos eu não faço matéria para ganhar prêmio. Fui finalista do Esso com a cobertura do Líbano, gostei de ter ganhado, óbvio. Perdi para um parceiro meu, que hoje é o editor chefe do Diário Gaúcho, Carlos Etchichury, meu amigão. Mas é muito bom ganhar prêmio, é muito legal pela tua carreira profissional, ver que tu fez um trabalho bem feito, que também é bom pro jornal, dá credibilidade. Mas eu prefiro muito mais ter feito todas essas matérias que eu fiz, ter conhecido o mundo e testemunhado a história e não ter ganho tantos prêmios, do que ficar ganhando prêmios e não ter viajado tanto.

Repórter: Você foi o primeiro jornalista de uma rádio brasileira a transmitir ao vivo a guerra na Líbia. Conte um pouco dessa experiência.

Rodrigo Lopes: Foi no auge da Primavera Árabe, a gente não conseguia entrar na Líbia pelo lado que eu estava que era o lado da Tunísia. Todos os veículos estavam cobrindo pelo lado do Egito que era fácil de entrar, tu atravessava a fronteira e entrava, mas a Zero Hora decidiu ir para a fronteira com a Tunísia, porque acreditava que o regime do Kadaf iria cair dentro de uma semana. Então eu fui até a fronteira e estava fechado, não dava para atravessar, e eu ouvi que um colega do Estadão, o Andrei Netto, conseguiu entrar mais ao sul da Tunísia pela cidade de Nalut, que era uma entrada clandestina, não passavam posto de fronteira, não pediam o passaporte lá e era no meio do deserto. Então no outro dia eu fui para a região, eram seis horas de carro até o sul da Tunísia para tentar entrar, e já estavam chegando os outros repórteres por ali, daqui a pouco vieram uns carros com os rebeldes e eles disseram “A gente leva vocês até Nalut e depois traz de volta” e o meu acordo com eles era esse, porque eu não queria ficar lá, eu achei que não tinha transmissão, não tinha como transmitir matéria, era muito perigoso, não tinha hotel para ficar. Então a minha estratégia era essa: entrar e sair. Eu e vários colegas do grupo entramos nesse comboio e fomos indo até Nalut, no meio do deserto, uma viagem de uma hora mais ou menos, só que eu sabia que ia ficar incomunicável e no caminho até Nalut o meu celular ainda estava pegando sinal por um tempo, até perto da fronteira. Quando eu passei a fronteira, liguei para a Gaúcha, aí comecei a fazer o relato e depois perdi a comunicação, fiquei umas seis ou sete horas incomunicável. Na hora de voltar, os rebeldes disseram “A gente não têm combustível, a gente não têm como voltar”, então eu disse que o nosso acordo era voltar, e os outros jornalistas também começaram a se revoltar. Decidimos entrar numa caminhonete e dissemos que não íamos sair dali até nos levarem, então nos levaram embora.

Repórter: Então para finalizar a nossa entrevista, que mensagem você deixa para os jovens que cursam jornalismo? Que dica você dá em como se tornar um grande jornalista?

Rodrigo Lopes: A mensagem é essa: ser apaixonado pelo o que tu faz. Porque se tu não é apaixonado, tu vai ser um jornalista medíocre. Se tu for apaixonado, tu vai fazer um bom jornalismo onde você estiver, independente do veículo. O jornalismo tem a possibilidade de mudar o mundo, acho que tu muda o mundo com a tua profissão e isso é muito legal. Testemunhar a história seja local, regional, nacional ou internacional e, ao mesmo tempo, mudar a sociedade, fazer as pessoas refletirem.

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