"BLACK MIRROR" ESTÁ DIANTE DE VOCÊ

Marcelo Janot
2 min readFeb 4, 2016

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Imagine um mundo onde, se você tem problemas para “se dar bem” na noite, pode contratar o serviço de um expert em sedução que, através de um chip implantado em sua cabeça, vê e escuta o que você está vendo e ouvindo, e consegue te dar conselhos em tempo real sobre como agir.

Imagine um mundo onde você pode implantar um cookie em seu cérebro que irá armazenar informações suficientes para que, uma vez retirado, seja uma espécie de alter ego/serviçal eletrônico capaz de, através de comandos internos de dentro de um aparelhinho, preparar sua comida, organizar sua agenda, entre outras tarefas que muitos são incapazes de fazerem sozinhos sem uma empregada ou uma secretária.

Imagine um mundo em que, se você brigou com sua mulher ou namorada, pode ser bloqueado por ela, como num Facebook da vida real, impossibilitando que os dois interajam e sequer se vejam, pois a pessoa bloqueada se torna um borrão à sua frente.

Esse mundo, que em tempos de Google Glass e outras geringonças tecnológicas parece estar cada vez mais perto, é o tema da série inglesa BLACK MIRROR, criada por Charlie Brooker (atenção a esse nome), produzida entre 2011 e 2014 e disponível no Netflix (estão prometidos novos capítulos para 2016). Seus sete episódios independentes (podem ser assistidos em qualquer ordem), com atores diversos, tratam de situações que há alguns anos poderiam ser rotuladas como ficção científica. Não mais.

Se você ainda não viu nenhum episódio e quer uma dica, comece pelo último. “White Christmas”, estrelado por John Hamm (“Mad Men”) e Rafe Spall (“A Grande Aposta”). Os dois estão numa cabana onde tudo é analógico. Não sabemos o motivo de estarem ali, mas parecem estar fugindo de algo ou alguém. Através de flashbacks, o personagem de Hamm vai contando para o de Spall sua atividade, que envolve as situações descritas nos três primeiros parágrafos desse artigo. Não dá pra contar mais, apenas que o resultado é sensacional (os demais episódios não ficam muito atrás), a melhor coisa que vi na TV desde que passei meses embasbacado com “Breaking Bad”.

A diferença é que se nos deleitamos com a impecável e antológica construção narrativa de “Breaking Bad”, nos divertimos com a nostalgia trazida por “Downton Abbey” ou “Mad Men”, entre outras boas séries que vem surgindo, “Black Mirror” nos coloca bem próximos da realidade assustadora que seus episódios oferecem. Já vivemos um pouco de tudo que é mostrado nela graças ao voyeurismo excessivo combinado perigosamente com a evasão de privacidade trazida pelas redes sociais, pelos reality shows e tudo o mais que consumimos pela simples necessidade de inclusão tecnológica, com pouco ou nenhum senso crítico.

Talvez tenha chegado a hora de refletir sobre isso. “Black Mirror” dá uma forcinha. E que forcinha.

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