Desculpa, eu preciso falar da Taylor Swift

Michele Contel
5 min readAug 25, 2017

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Era 2014, o ano em que eu fui diagnosticada com ansiedade generalizada, que eu vivia um relacionamento abusivo, que eu fui demitida, que cursava o último ano da faculdade e estava vivendo o terror do tcc. Eu estava literalmente pirando e, talvez por isso, me agarrava mais do que devia em coisas que me traziam sensações boas. Foi assim que me apaixonei pelo Beyoncé, da Beyoncé (duh) — e até hoje atribuo a ele o fato de ter conseguido desenvolver meu teste de conclusão de curso — , e que a Taylor Swift entrou na minha vida.

Eu já a conhecia e gostava de meia dúzia de músicas, mas nada arrebatador, não. Até o 1989. Quando eu ouvi Shake It Off, pela primeira vez, eu quase chorei de emoção — e acredite, isso não é exagero. Eu estava nessa fase horrorosa e ouvir Taylor Swift mandando todo mundo ir à merda da forma mais fofa e divertida possível me fez muito bem (até escrevi sobre isso no meu blog). Quando, enfim, saiu o 1989, eu me apaixonei e, até hoje, talvez tenha sido o álbum que ouvi com mais frequência em toda a minha vida, perdendo apenas para o Wonderland, do McFLY e White Album, dos Beatles.

Welcome To New York foi a música tema do meu vídeo de TCC e a que, anos depois, embalou minha mudança para São Paulo da forma mais romântica e hollywoodiana possível. Blank Space foi a minha primeira favorita do álbum que, logo em seguida, foi substituída pela delicada Style. All You Had To Do Was Stay foi a música que mais ouvi quando meu namoro acabou e Clean virou o meu mantra, antes de New Romantics virar meu hino.

Estava extasiada. O álbum incrível + a nova postura feminista e empoderada da Taylor Swift me provocou uma identificação absurda: a mina branca magra que reproduzia machismo porque foi ensinada que era o que deveria fazer para ter sucesso e que usava suas experiências amorosas como material de trabalho. Não tinha como não me apaixonar. A cada nova entrevista que ela falava sobre feminismo, mais eu gritava e batia palmas. Estava cega, louca e apaixonada.

Até que saiu o clipe de Bad Blood.

Foi a primeira vez que a lanterninha vermelha do “Epa” foi acesa. Durante toda a divulgação do álbum, ela falou muito — muito mesmo, quase incansavelmente — sobre feminismo, então, não fazia nenhum sentido ela fazer uma música que claramente compôs para uma rival (que no caso, descobrimos ser Katy Perry) e, em seu clipe, reunir várias mulheres e colocá-las umas contra as outras. Foi aqui que eu percebi a primeira incoerência de Tay-tay e quando, pra mim, o castelo que construímos juntas em New Romantics, começou a desmoronar.

Comecei a ficar meio incomodada com seus discursos. Tudo parecia muito superficial e, quando aprofundavam a discussão — como aconteceu com a Nicki Minaj — ela automaticamente se colocava na posição de vítima injustiçada. Não estou falando, aqui, sobre a forma que Nicki falou com a Taylor, mas sim do ponto levantado pela rapper: ela quis falar sobre representatividade negra na indústria musical. Taylor quis bater, de novo, na tecla do feminismo.

Feminismo estava na moda e além de ser um discurso legal, vendia.

Finalmente a divulgação acabou e a ex-cantora country quis dar uma descansada na imagem. Coincidentemente ou não, foi quando Kanye West, considerado um verdadeiro vilão pela fanbase da loira — e que já foi considerado um idiota, por essa que vos escreve — lançou a polêmica Famous, em que ele fala que Taylor deveria ter feito sexo com ele porque “he made dat bitch famous”. Ela deu declarações, escreveu, gritou, enfim, sobre o ultraje que foi ter seu nome citado na canção.

Mas ela tinha aprovado a letra.

Não vou entrar aqui no mérito sobre Kanye West de fato ter letras misóginas ou da cultura do hip hop ser machista. Estou falando sobre o recorte “Taylor Swift e sua facilidade em tornar quem se opõe a ela, em vilões”.

Ali, em meio a sua encenação de princesa incompreendida e injustiçada pelo lobo mal agressivo e desequilibrado, Taylor Swift mais uma vez ganhou pelo coitadismo. Não bastava o microfone arrancado anos atrás, Kanye West estava obcecado em acabar com a carreira da pobre cantora que a única coisa que fazia era cantar sobre seus ex-amores e levantar a bandeira feminista.

Aham.

Quando Kim Kardashian expôs a cantora e mostrou que ela sabia sobre a música, sobre a letra e tinha autorizado, a internet quebrou. E um verdadeiro trabalho CSI foi feito sobre a carreira da cantora que, por fim, decidiu descansar mesmo a imagem.

Dali pra cá, várias outras coisas rolaram: treta com o Calvin Harris, Katy Perry expondo caso das duas, briga com fotógrafo, enfim. Um bafo atrás do outro, porém, um tempo e uma limpa nas redes sociais depois e, pei.

Ela vai lançar um novo álbum.

Com uma fonte que lembra a usada pelo Kanye em sua identidade visual. Com moletom que lembra uma roupa da Yeezi. Com um teaser usando a cobra, apelido que ganhou da Kim. Com lançamento um dia depois do clipe da Katy Perry.

O que eu quero dizer, desde o início desse texto, é que não tem como defender Taylor Swift na qualidade de mocinha ingênua. Deu, acabou. 2017, a gente já sabe a “cobra criada” que a cantora é. E ISSO NÃO É UM PROBLEMA.

Ou pelo menos, não deveria.

Chega do papel de princesa injustiçada contra o mundo opressor — meu sonho é que ela assumisse o puta mulherão profissional que ela se tornou. Chega de procurar culpados — manda um Shake It Off e aproveita esse Blank Space, sabe?

Taylor Swift é, sim, uma das maiores artistas da atualidade e eu acho realmente uma pena que seu talento seja, por vezes, ofuscado por tanta picuinha. Cansa ver cada notícia sobre sua vida ser mais acessada do que sou (ótimo) trabalho. Cansa ver seus equívocos em redes sociais sendo mais comentados que algo legal que ela fez por trás das câmeras. É tanto burburinho que quando aparece alguma coisa nova sobre a cantora, a gente já tá com sono.

Cansa, não cansa?

Eu tenho certeza, como 2 e 2 são 4, que Reputation será mais um trabalho incrível e que vamos ouvir incansavelmente por anos. Eu tenho certeza que sua divulgação será incrível e eu espero por um comeback inesquecível e que me torne tão apaixonada quanto fui, naquele 2014. Só que espero uma Taylor mais autêntica, sem teatro ou posição de coitadinha, afinal, a gente tá falando da indústria musical e não do conto da Cinderela. Eu espero que a gente conheça uma Taylor Swift de verdade e que ela, em vez de se passar (mais uma vez) por vítima de todas as histórias protagonizadas, lide com elas. Até porque band-aids don’t fix bullet holes.

Né?

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