A realidade de quem vive na extrema pobreza

Julio Hanauer
3 min readSep 14, 2018

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Mesmo com as dificuldades, casal mantém a felicidade como aliada na sobrevivência

Como seria se você ganhasse somente R$ 2,58 por dia? Dezenas de famílias que moram na Vila Santa Marta estão enquadradas neste perfil e batalham por uma vida digna. Pequenas construções em madeira de dois ou três cômodos abrigam esses brasileiros. As dificuldades fazem com que esses cidadãos adotem uma rotina de sobrevivência.

Conversamos, em um banco, debaixo da sombra das pequenas árvores, com Fátima Maria Ramos, beneficiária do Bolsa Família, e José Cláudio Vieira, catador de resíduos recicláveis. Juntos, ganham R$ 155,00 mensais do programa social do Governo Federal para sobreviverem. A casa deles fica ao lado de uma estreita rua de terra, numa área invadida. Segundo eles, juntaram o que tinham, e compraram o terreno com uma casinha de madeira. Quarto, cozinha e banheiro são os cômodos da residência. Há, também, um galinheiro e um galpão para depósito, onde fica o fogão a lenha utilizado para cozinhar.

Dias difíceis, mas sem tristeza

Durante um longo tempo, Fátima trabalhou com carteira assinada em restaurantes e fez faxinas, ganhando um salário suficiente para pagar o aluguel e despesas habituais. “Era bem melhor quando tinha serviço. Agora, chego para oferecer faxina e não consigo, porque desconfiam da gente”, revela. José Cláudio cata garrafas pets, latas, papelão e jornal para vender na cooperativa de reciclagem da Santa Marta. “Eu tento ganhar um dinheiro extra com os materiais que encontro na rua”, afirma. Porém, tem vezes que o catador demora para conseguir montar uma carga suficiente que seja comprada pela cooperativa.

Parte da comida que vai à mesa vem por meio da ajuda da Cáritas, entidade ligada à Igreja Católica, responsável pela atuação social na defesa dos direitos humanos, da segurança alimentar e do desenvolvimento sustentável solidário. “Aqui o pessoal sempre ajuda, principalmente os mercados que dão pão para nós”, diz a dona de casa. A solidariedade é comum na vida do humilde casal. Agasalhos sempre são bem-vindos no guarda-roupa da família. Dona Fátima afirma: “Ganhamos doações de vizinhos e nos vestimos com o que achamos na rua”.

Mesmo vivendo em condições de poucas oportunidades, ela procura cuidar da saúde e se informar sobre assuntos relacionados. Isso é feito no posto de saúde da Campestre, comunidade vizinha. Lá são realizados exames de sangue e outros atendimentos. “São muito atenciosos comigo no posto da outra vila. Aqui na Santa Marta parece que a gente vive no fim do mundo, porque não temos atendimento e um lugar bom para isso”, reclama.

A gratidão é reforçada a todo o momento pelos companheiros, mas não negam que são excluídos da sociedade. “Sempre somos os últimos da fila. Quem tem dinheiro é o primeiro, quem não tem é o último”, desabafa Vieira, emocionado. Nos olhares de sofrimento percebe-se a rotina difícil, mas não deixam que isso os abale. “Esperança nós temos. Lutamos e vivemos com o que temos”, diz José. As palavras são reforçadas pela companheira: “Eu tenho ele e não fico sozinha. Sou feliz da maneira que vivo e a tristeza não cabe dentro da gente”.

Os números da pobreza

Em 2017, o Brasil tinha mais de 50 milhões de pessoas na categoria da pobreza, as quais fazem parte famílias que ganham menos de R$ 387,07 por mês. Os números foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no final do ano passado.

Mesmo com o menor índice de pobreza, a região Sul do país abriga 12,3% da população nessas condições. Não existe um levantamento específico do número de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza na Vila Santa Marta. Segundo a secretaria de Desenvolvimento Social de São Leopoldo, os dados são calculados a partir do cadastro de todas as comunidades do bairro Arroio da Manteiga. Portanto, destacamos os principais dados da pobreza no bairro em que a Santa Marta se inclui, analisando o Diagnóstico Socioterritorial, disponibilizado no site da prefeitura.

A renda média familiar mensal total do público com cadastro atualizado no Cadastro Único por bairros, que residem na região referida, é de R$ 629,00. Já a renda média por pessoa é de R$ 200,00, bem acima do que ganham Fátima e José Cláudio. A renda individual dos dois não chega aos R$ 80,00 por mês. As residências do bairro são construídas da seguinte forma: madeira aparelhada (15%), madeira aproveitada (25%), alvenaria/tijolo sem revestimento (20%), alvenaria/tijolo com revestimento (30%). A casa do casal entrevistado se enquadra no segundo tipo citado.

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Julio Hanauer

Estudante de Jornalismo na Unisinos. Assessor de Imprensa da Prefeitura de Maratá-RS.