Dicas para um criativo e inovador ministério infantil

Compartilhando ideias sobre um bom ministério para crianças.

Gabriel Morais
6 min readOct 11, 2017
Dicas para ministério infantil. Gabriel Morais

Não faz tanto tempo que deixei de ser criança.
Lembro dessa época com muito carinho e gratidão por considerar que tive uma infância feliz.

Sou um daqueles que “nasceu” na igreja. Graças a minha família, sempre engajada na comunidade, eu frequentava da escola dominical ao culto de oração das Assembleias de Deus da região e nunca faltava nas festas com gincana bíblica recheadas de prêmios e cachorros-quentes que aconteciam de vez em quando.

Muito do que sei de Bíblia hoje foi graças ao ensino de muita gente boa e comprometida que se esforçava para transmitir as histórias bíblicas da melhor maneira possível diante das circunstâncias. Serei eternamente grato as “professoras” (sempre mulheres) da EBD e, ouso dizer, que aprendi mais ali do que nos quatro anos de seminário teológico.

Ainda assim, aqueles que me conhecem mais de perto sabem do acirrado e exigente senso crítico que me persegue desde pequeno e mesmo com pouca idade já percebia as falhas de cuidado oferecido pelos departamentos infantis. Escassez de recursos, falta de preparo e estrutura precária eram a tríade dos problemas recorrentes em praticamente todos as igrejas que percorri.

Nesse período, é impossível enumerar a quantidade de vezes que sofri com cadeiras quebradas, falta de material, salas mofadas e cheias de pó; além dos problemas mais sérios como didática ultrapassada, linguagem impositiva e ensino teológico incoerente. Mas o ápice de tudo foi em 2000, quando presenciei atos de violência física e verbal incentivados por monitores em um acampamento de temporada onde estava participando.

Com todas essas anotações gravadas na mente, decidi ainda criança fazer um pacto comigo mesmo: ao crescer, me esforçaria ao máximo para não repetir os mesmos erros e tratar todas as crianças com o devido respeito e dignidade que mereciam.

Eu só não esperava que a vida fosse levar minha promessa tão a sério.

Em janeiro de 2010, assim que acabei o colégio e esperava o início das aulas na universidade, decidi ser voluntário em um acampamento de férias como monitor de crianças e adolescentes. A identificação foi tão grande e gostei tanto do trabalho que a partir dai decidi mergulhar nesse mundo e dedicar boa parte do meu tempo a trabalhar com essa galera.
Comecei como voluntário e acabei me tornando pastor.

Nos últimos dois anos, topei o desafio do ministério em tempo integral e fui cuidar de um grupo de 200 pré-adolescentes na igreja batista de água branca, dentro de um ministério infantil enorme que reúne aos domingos mais de 900 crianças no total. Foi uma experiência e escola incrível, dando a oportunidade de pensar, conviver e imergir nesse universo infanto-juvenil que ainda é tão subestimado por boa parte das igrejas.

Entre meus erros e acertos, fui aprendendo muita coisa valiosa que foi me ajudando a traçar o perfil de ministério que melhor agradasse a crianças e voluntários, de maneira que tudo facilitasse o objetivo principal: amar Jesus e amar pessoas.

Então, como acredito na importância do aprendizado através de experiências compartilhadas, decidi colocar nas linhas abaixo aquilo que já assimilei nesse tempo para, quem sabe, ajudar pessoas na elaboração de ministérios mais humanizados, sensíveis e dignos desse grupo tão importante que Deus coloca sob nosso cuidado.

Claro que ainda sei muito pouco, mas aí vão algumas das características que considero ser de extrema importância em um bom ministério infantil:

#1. EMPATIA

Ok. Ninguém aguenta mais essa palavra, concordo.
É uma daquelas que, de tanto falarem, acabou se banalizando; e, mesmo assim, pouca gente entende o que de fato significa.

Daniel Goleman, no livro “O Foco triplo”, coloca que empatia é uma forma de “compreender como o outro se sente e seu modo de pensar acerca do mundo”.

Toda pessoa que já trabalhou mais de perto com crianças sabe bem que cada uma possui uma história de vida diferente e muito interessante. Algumas até surpreendentes e inimagináveis. E, sendo assim, é impossivel achar que o ensino pode ser unilateral e chegará a todos da mesma maneira.

É extremamente importante se colocar primeiro no lugar da criança, conhecer sua história, buscar entender seu contexto e suas opiniões, para então propor algo que a alcance em todas suas necessidades. Ouvir a criança é tão necessário quanto ensinar algo.

Exemplo: Sempre que alguém volta de uma ação ou projeto com crianças, solta aquele discurso do “eu fui para ensinar/abençoar e acabei sendo ensinado/abençoado”. Isso é ótimo e tenho certeza que mudou a vida dessa pessoa, mas não deveria ser nenhuma surpresa que é possível aprender algo com elas.

#2. CRIANÇA NO FOCO

Parece óbvio.
Depois de se colocar no lugar da criança, é natural que o foco do ministério infantil se concentre nela.
Não é.

Em muitos lugares que passei quando criança, por mais que fosse dito sobre a importância das crianças, percebia que o foco estava em outro lugar. Algumas vezes na Bíblia, no formato didático ou na diversão da própria equipe de trabalho. Sem contar quando o investimento no ministério era apenas uma estratégia para agradar os pais e atrair mais membros.

Não são necessárias justificativas para o cuidado com ministério infantil.

Ele deve existir única e exclusivamente pelo simples fato de que crianças são parte do corpo de Cristo, estão na comunidade e são dignas da mesma atenção dada aos adultos. Seja com uma boa programação, um local agradável ou uma justa alocação de verba.

A partir disso, precisamos estabelecer que tudo dentro do departamento precisa ser pensado para a criança.

Se focarmos na Bíblia, corremos o risco de uma apresentação descontextualizada, chata e obsoleta.
Se focarmos na estrutura didática, teremos um ensino de massa sem sensibilidade para necessidades individuais ou temas que possam aparecer de última hora.
Se focarmos na equipe, criaremos um programa super divertido para nós, mas nem sempre com sentido para elas.

Quando o foco central é colocado na criança criam-se programas e maneiras de ensinar que agradem, divirtam, atendam e levem cada uma delas a um encontro com Deus e senso de pertencimento à comunidade.

#3. DIVERSÃO E RELACIONAMENTOS

Igreja não é escola.
E não precisa ter o mesmo formato de aula/sala/professor/etc.
Por isso, é fundamental a importância da diversão atrelada ao ensino no trabalho com crianças.

Certa vez, ouvi de um dos pastores da Hillsong Kids que sua maior referência de trabalho era a Disney. Achei aquilo incrível e, desde então, passei a olhar com mais atenção para seus produtos pois, deixando de lado toda a discussão acerca de conteúdo e capitalização do entretenimento, não existe hoje uma fonte maior de fascínio e que preencha tão bem o imaginário infantil quanto a dona dos super parques de Orlando. Temos muito o que aprender com eles.

Nosso déficit não esta no conteúdo ( já possuímos, é valiossísimo, imutável, e tem material para mais de ano), mas sim em como o expressamos e transmitimos.

Em um mundo onde Youtube e Netflix se tornaram os principais meios de consumo para cultura e entretenimento, não podemos continuar nas mesmas ferramentas e métodos usados há décadas. Elas precisam ser revistas.

Se posso dar um pitaco aqui, digo o seguinte:
um ministério infantil focado na criança terá um programa com ênfase em diversão e relacionamentos.

Toda vez que for preparar algo para seu grupo, pense: como posso fazer com que isso seja divertido para eles/as?

Crianças aprendem brincando e experimentando. Se você conseguir associar o prazer da diversão à experiência com Deus, a atividade com certeza será muito mais agradável e marcante para elas.

Além disso, incentive relacionamentos. Em muitas de nossas comunidades as crianças se vêem por poucas horas e somente aos domingos. Assim, não se tornam amigas e, muito menos, criarão vínculos com aquele lugar, E Igreja, com I maiuscúlo, sem pessoas conectadas não faz o menor sentido.

ETC

De maneira beeem resumida, coloquei acima os pontos mais importantes que venho aprendendo nesse trabalho/missão/vocação. Foquei em questões práticas, fugi das teóricas e teológicas e, obviamente, deixei de falar muita coisa importante que também merece atenção, mas pode ficar para outra hora.

Resumão:
Seja você um profissional ou voluntário, lembre-se que seu aprendizado nunca acabará e nossa principal missão é deixar que as crianças cheguem até Jesus e se relacionem com Ele.

Não seja como os discípulos que as bloquearam por acharem que poderiam incomodar.

Por fim, em meio a toda discussão sobre os cuidados com as crianças que estamos vendo nas redes sociais, gostaria de incentivar você a continuá-la em sua comunidade, mas indo além da superficialidade desse debate.
Junte pessoas interessadas, pense em novas maneiras de propor espaços mais acolhedores com acesso a arte/cultura/esporte/vida para as crianças e se esforcem em implementá-los.

Afinal, elas merecem um trabalho bem feito.

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Gabriel Morais

Vivendo o Eterno no agora. 26, teólogo, pastor, cientista social em formação.