Critica ao ensino de História da África

Mário Rezende
3 min readOct 31, 2016

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Gostaria de expor aqui minha crítica à maneira como nos tem sido ensinado a matéria de História da África, no meu caso, na graduação. Não gostaria de me aprofundar em um sentido acadêmico neste texto, portanto, não pretendo fazer uso de autores, gostaria de ficar restrito a uma crítica simples.

A princípio, gostaria de demonstrar uma breve insatisfação ao que chamo de “apologia da África”, em que durante a introdução do curso somos apresentados a quase uma ótica tacanha de como o continente em questão sempre foi detentor de meios de produção iguais ou superiores ao do resto do mundo, assim como, o mesmo continente sempre possuiu cidades tão grandes quanto a de seus futuros “colonizadores” europeus. Por enquanto, nada de novo sob o sol. Creio que tal argumento carrega em seu âmago sua crítica destruidora: utilizar uma ótica restrita aos meios de produção não levanta a própria questão do “por que então foram conquistados?”. Para isso, gostaria de pensar tanto na supremacia bélica europeia, que como um maremoto varreu e massacrou os continentes do mundo; também gostaria de propor uma outra hipótese mais simples: a ausência de um desejo de conquista por parte dos povos que habitavam o continente africano. O tamanho geográfico, cultural do continente leva a um comércio quase ensimesmado, assim como nos outros continentes durante muito tempo, sendo apenas quebrado (in)felizmente (1) pelos europeus. Em suma, talvez não fizesse parte do arcabouço de ideias desses povos (assim como da maior parte dos povos, incluindo europeus) a expansão pelo mundo. Apresentar o tema utilizando estes argumentos, focados e engrandecendo meios de produção que não foram capazes de sobrepujar os de seus vis conquistadores soa como um algo limitado, no mínimo, como um grito de “nós também eramos bons, tão bons quanto eles, não os expulsamos porque não quisemos”, todos sabemos que foi mais brutal que isto.

Outro elemento que gera críticas seria o do recorte. Ao sermos apresentados ao curso de História da África somos levados a estudar durante um semestre o período de nove séculos. Estamos tratando de um continente. Diversas culturas, povos, civilizações, climas e relevos. Trabalhar novecentos anos, independente do tema, em um semestre e em um curso de graduação de História, já soa como assustador, e isso piora ao pensarmos que estamos tratando de um continente como um todo. Não há um recorte específico. Tal falta de informação e tais generalizações levam consequentemente a formação de senso comum, algo que como cientistas que somos deveríamos destruir.

Mas talvez o que seja mais perigoso seja a pintura da possibilidade de rescrita da história para além dos grilhões do capitalismo periférico. O crescimento econômico dos países africanos hoje em dia é, sem a menor sombra de dúvida, algo de se admirar: Países como Angola, Ruanda e Congo. Todavia, o próprio recorte destas terras como nações é consequência de sua colonização. Infelizmente, passamos do ponto e não teremos uma história deste continente escrita em banto (2). Assim como não teremos uma história do Brasil escrita em tupi. Devemos, como ex-colônias, utilizar da mundialização que nos foi imposta (talvez esta mundialização tenha sido um dos melhores instrumentos que nossos colonizadores nos deram), como instrumento de emancipação. Utilizando a língua que nos foi imposta, podemos quebrar as amarras impostas pela atual fase do imperialismo. Não deveríamos estar buscando diferenciações no passado, pois foi assim que fomos mais facilmente conquistados. Portanto, é nosso dever entender como tais mecanismos de dominação se deram no passado e como se dão hoje.

Não devemos escrever uma história apaixonada, como tem sido feito em relação ao tema, devemos nos livras da patifaria das “desconstruções” e nos munirmos do pensamento dialético para a emancipação não de um povo ou continente, mas da humanidade como todo.

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(1) Querendo ou não, a mundialização trouxe ao progresso científico que temos hoje, e todo porvir.

(2) Criticando a noção de “imperialismo epistemológico”.

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