O largo tempo adormeceu o corpo,

pea.pvl
2 min readOct 5, 2023

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e num dia, sem grandes descobertas passou da letargia para o ócio, o arroubo cego mas honesto e dado em querer sentir e repartir hálitos, garfos de comida, roupas e peles como no cinema, o deslumbramento e movimento das cores a luz e a água a acontecerem tão perto, realmente perto.

Deixou-se levar por aquela probabilidade clássica, dum mais um é igual a dois e mais nada se opõe, nem as diferenças de calcanhar, nem os contrários dos números que os distanciam, nem tão pouco a poesia sublinhada a encurtar emoções e metáforas do coração.

Tudo era pequeno e vencível…tudo parecia encaixar-se na oportunidade e no intervalo do talante. Sem a âncora do molde ideou-se mesmo assim a teia dos cérebros, o contorno dos beijos, do timbre das vozes que se prometem e dos corpos que criam a beleza do que é íntimo e fugaz.

A mudez do gira-discos e aquela música favorita deixou de tocar, talvez versasse uma comoção do passado que se cantou sem se falar, talvez fosse o primeiro sinal de toda a babel por vir…

A austereza dos cérebros, crispam pela verdade e moral, aturdidos na curva da circunstância.

Um sem razão, implacável e céreo

O outro tecia entre desgosto a suavidade de um perdão

desestimado

esquecido

sem rosto e sem a voz que deu lugar ao desencanto

e tudo em remanso foi indo nos dias passados largados ao tempo dos afazeres

não se saberá onde irá chegar todo este veneno que um dia foi enlevo e dádiva

sabe-se porém, que não chegou sequer a fundear nem a qualquer memória de salvação

restos dos restos a preto e branco e como nos filmes mudos vai-se esquecendo aos poucos,

a voz, a velocidade dos gestos

o cheiro da pele,

no corpo

sem serventia

amou-se.

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