“Somos Imigrantes”

Pedro Bulhões Camargo Kosa
6 min readSep 28, 2017

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Por Dora, Gabriel Paes e Pedro Kosa

Fotos: Pedro Kosa

No último domingo (25) o Estádio do Pacaembu recebeu a grande final da 4ª edição da Copa de Integração dos Refugiados. O evento foi realizado pela ONG África do Coração, em parceria com a ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) e a Prefeitura de São Paulo. O jogo, disputado entre Nigéria e Marrocos, acabou com o placar elástico de 9 a 4 e os Nigerianos levantaram a taça.

Os próprios estrangeiros preferem ser chamados de “imigrantes”. Para alguns, o termo pode ser um dos fatores que inibem uma adaptação mais rápida deles à cultura local.

As partidas eliminatórias da competição aconteceram no fim de semana anterior e foram realizadas no dia 16 no CERET (Centro Esportivo, Recreativo e Educativo do Trabalhador), e no dia 17 no Estádio Municipal Jack Marin, no Parque da Aclimação. O CONTRA-ATAQUE esteve presente nos três dias de evento.

O evento reuniu diversos times de regiões como África, Oriente Médio, e América do Sul, mas para o coordenador Abdulbaset Jarour, o campeonato vai muito além de algumas partidas entre equipes. “O futebol une raças, une políticos, une religiões” afirma. Abdul também abordou a questão da intolerância com imigrantes e refugiados. “É muito importante quebrar a ignorância, xenofobia, preconceito e o racismo, e nós fazemos com ajuda do esporte”, comenta.

“O futebol une raças, une políticos, une religiões”

A competição, que está tomando dimensões maiores todos os os anos, já recebeu uma edição em Porto Alegre, no começo do ano na Arena do Grêmio. “Estamos crescendo um pouco a cada anos e em 2018 queremos expandir a competição para outros estados como Rio de Janeiro e Minas Gerais, que são outras regiões do Brasil com muitos refugiados e imigrantes”, explica Abdul.

A grande final no Pacaembu teve presença de muitos torcedores na arquibancada, tanto de brasileiros quanto de imigrantes e refugiados. O evento no dia 24 também teve grande cobertura da mídia.

Quando os jogadores subiram ao gramado, foram prontamente saudados pela torcida dos companheiros e dos brasileiros da Organizada Antifascista, que entoaram cantos como “Refugiados bem-vindos, joguem com raça contra o racismo!”, “Laiá Laiá Laiá, Refugiados, aqui é o seu lugar!” e “Não pri-va-ti-za! Não pri-va-ti-za!” (Em referência a intenção de conceber o Pacaembu à iniciativa privada).

Para esta edição, a organização decidiu que mulheres brasileiras estariam à frente das delegações, para auxiliar no que fosse preciso. A voluntária Namíbia acompanhou a Seleção de Guiné-Conacri (não confundir com Guiné-Bissau), eliminada precocemente do torneio. Segundo a Madrinha, o que vale é a solidariedade: “é o primeiro ano com madrinhas na Copa. Escolheram apenas mulheres, todas brasileiras, para ajudarmos a organizar, intermediar as questões de alimentação, transporte, uniforme e linguagem”, comenta. “Também para fazermos gravações do vestiário, ônibus e mostrar como é a preparação dos jogadores”.

“Falam línguas diferentes mas, pelo jogo, estão sempre unidos. Cada um tem sua história de como vieram para cá, fugidos ou não da guerra.”

A madrinha falou também dos objetivos do evento: “um dos intuitos da Copa é justamente a questão da integração, fazer com que eles se sintam em casa, sejam acolhidos e bem recebidos. Foi um prazer enorme”, afirma.

Vanda teve um pouco mais de sorte e foi escolhida para auxiliar a Seleção da Nigéria, que sagrou-se campeã, “peguei esse time maravilhoso, chegamos na final e ganhamos!”. Ela também falou da relação entre os jogadores no evento, “Estou adorando a união entre eles, um povo ajuda o outro. Falam línguas diferentes mas, pelo jogo, estão sempre unidos. Cada um tem sua história de como vieram para cá, fugidos ou não da guerra”.

A madrinha da seleção vencedora também comentou seus planos para as próximas edições: “no começo, não sabíamos muito como ajudar, mas agora já pensamos em como panfletar e chamar a torcida pra lotar isso aqui na próxima vez!”.

Até o fim de 2016, mais de 65 milhões de pessoas foram forçadas a deixar seu lar em busca de sobrevivência. Esse número, atrelado à onda conservadora e neonazista da política atual, torna a situação desses refugiados ainda mais dramática.

Apesar de não poder comunicar-se com elas, Vanda torce para que as pessoas remanescentes nas áreas de conflito consigam sobreviver, e sugeriu:

“Refugiados, venham para o Brasil. Somos acolhedores. Venham para somar, ver essa união! Às vezes temos dificuldades como desemprego… mas a gente passa por cima. A união faz a força” — Vanda, Madrinha da Seleção Nigeriana

Viemos para levantar a taça”, declarou o técnico do time nigeriano Mavis Ajare ao término do primeiro tempo da partida final. Ajare creditou o entrosamento de sua equipe à dedicação de seus jogadores e energia depositada nos treinos que aconteciam todos os sábados no Parque Villa Lobos, aonde se reuniam e buscavam equipes para jogar contra eles, em uma espécie de jogo-treino. O técnico afirmou, ainda, esperar que a Copa ajude a Nigéria a ser reconhecida como um país do futebol.

Até o apito inicial, o Marrocos era apontado como o favorito a levar a taça, muito em função do desempenho técnico da equipe nos jogos anteriores. Até a primeira parada para reidratação dos atletas, a partida era parelha. Os marroquinos já haviam carimbado a trave em uma cobrança de falta e davam indícios de que confirmariam o favoritismo. Após a pausa, o volume de jogo da Nigéria foi maior e, antes mesmo do fim do primeiro tempo, já haviam marcado 3 gols.

O segundo tempo foi bastante movimentado, mas a taça já estava praticamente na mão dos nigerianos, que chegaram a abrir seis gols de diferença. Ao final do jogo, Marrocos ainda tentou esboçar uma reação, marcando 4 gols, mas que não foram suficientes devido à regularidade dos nigerianos ao longo da partida. Placar final: 9 a 4.

Há quatro anos que a Copa é organizada pela ONG “África do Coração”, envolvendo refugiados de 20 nacionalidades distintas. Neste ano, a ACNUR, agência da ONU para Refugiados, além de apoiar, como vinha fazendo nos anos anteriores, trouxe as empresas Sodexo e Netshoes como patrocinadores. Apoiaram o evento, também, as Secretarias Municipais de Direitos Humanos, de Relações Internacionais, de Esportes e Lazer da Prefeitura de São Paulo, o SESC, a Caritas Arquidiocesana e a Cruz Vermelha.

Acompanhe o trabalho da ACNUR e da África do Coração através de seus portais:

ACNURwww.acnur.org

AFRICA DO CORAÇÃOafricadocoracao.org/

Originally published at medium.com on September 28, 2017.

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Pedro Bulhões Camargo Kosa

Estudante de comunicação social — jornalismo na PUC-SP | Estagiário em jornalismo na RedeTV! | Parte da equipe da página O Contra-Ataque