Renato Augusto e o valor da palavra

Pensando em Preto e Branco
4 min readJul 22, 2021

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Renato Augusto foi anunciado pelo Corinthians nessa quinta-feira (Reprodução / Corinthians)

Por Daniel Keppler

Em março de 2016, pouco tempo após se transferir do Corinthians para o Beijing Guoan, Renato Augusto deu uma entrevista para Jorge Nicola, onde falou sobre a adaptação à vida na China, os desafios no novo clube e as perspectivas para a carreira. E por três vezes, citou o Timão:

“Com o maior prazer do mundo. É um clube que vou guardar com muito carinho, porque teve uma equipe médica que soube entender de que meu corpo precisava, me deu a chance de atingir o auge da minha carreira e porque foi o melhor time em que já joguei.” [Se voltaria a jogar no Corinthians]

“Hoje, não! Aprendi que nunca pode-se dizer ‘nunca’, até porque pode acontecer de o Corinthians não me querer. Mas vou dar preferência para o Corinthians, em São Paulo, e para o Flamengo, no Rio.” [Se jogaria no Palmeiras ou São Paulo]

“Cabem os dois clubes no meu coração.” [Se ele se considerava mais corinthiano que flamenguista]

Renato venceu a Copa da China de 2018 pelo Beijing Guoan (sina.com.cn)

Na China, Renato acumulou 152 jogos, garantindo um status de ídolo local, o mesmo que outro ex-corinthiano conseguiu em outro clube daquele país: falo de Paulinho, estrela do Guangzhou Evergrande até o início desse ano, quando rescindiu o contrato. O motivo foi a pandemia, que impede os jogadores estrangeiros de viajarem até a China para reforçarem seus times.

Paulinho marcou época no Corinthians, tanto quanto Renato Augusto. Entre 2010 e 2013, construiu uma carreira que culminou nos títulos da Libertadores e do Mundial de Clubes, dos quais participou com destaque. Nesse meio-tempo, recebeu sondagens e recusou propostas de transferência de clubes como Roma, Arsenal e Inter de Milão, até aceitar a transferência para o Tottenham, após a Copa das Confederações. Mas não deixou o Brasil sem antes fazer uma promessa:

“É difícil de falar de um momento como esse. Mas tenho certeza de que foram três anos maravilhosos na minha carreira. Anos de conquistas. Anos de trabalho, com pessoas corretas e coerentes que sempre me ajudaram. O que tenho para falar do Corinthians, da torcida, da diretoria, da comissão é até logo, daqui a pouco eu volto, por tudo o que fizeram por mim. A diretoria sabe que um dia eu volto, seja daqui 5, 6, 7 anos, porque esse time é diferente”

Fica clara a diferença entre como Renato Augusto e Paulinho se referiram ao Corinthians logo após saírem. Ambos foram gratos, mas enquanto um escolheu o caminho do pragmatismo sincero, o outro optou pela promessa emocional. Vocês sabem qual discurso gera mais expectativa. E vocês sabem como a Fiel reage sob expectativa: cobra, e cobra muito.

Essa cobrança vem perseguindo Paulinho a cada janela onde ele fica disponível no mercado, seja para se transferir, seja para ser emprestado. Dessa vez não foi diferente. E diante de uma promessa tão firme como a feita em 2013, fica difícil não entender a torcida quando a decepção chega, quando surgem especulações sobre uma possível ida ao Red Bull Bragantino, ou quando o volante abre negociações com o Grêmio.

Paulinho treinou no Red Bull Bragantino no início do ano (Reprodução / Red Bull Bragantino)

Por outro lado, temos Renato Augusto, que embora tivesse lugar em qualquer time da Série A, e embora não tenha prometido nada a não ser uma prioridade para negociar com o Corinthians (e só em São Paulo!), escolheu o Timão. Não só isso: fez questão de não sair mal do Guoan, deixando as portas abertas, mesmo que sua idade talvez não lhe permita um retorno à Ásia. Porém, novamente, ele foi pragmático, mostrando que pouco mudou em cinco anos.

Ou seja: o que um jogador promete para a torcida não importa mais do que o que ele, na prática, faz. Renato Augusto tinha tudo para agir como Paulinho. Tinha lugar em times que poderiam pagar bem mais que o Corinthians, e que hoje estão em situação financeira muito melhor, com elenco mais preparado e disputando competições onde o Corinthians não está. Renato tinha zero obrigação de agir de acordo com o que disse em uma entrevista em 2016. Mas ele agiu.

Eu sei, ele não está vindo para o Corinthians por isso. Mas é sempre importante, ainda mais em tempos onde o futebol está cada vez mais rendido ao dinheiro, constatar que ainda há jogadores que, não importa quanto tempo passe, seguirá sendo um só. E isso é algo que vale a pena valorizar.

Que sirva de lição: atleta corinthiano, entre ser honesto consigo e fazer média com a torcida, escolha a primeira opção. O tempo vai recompensar.

E bem vindo de volta, craque!

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