Uma comunista que acredita em anjos

pollyanaferrari
3 min readOct 16, 2018

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Quando eu tinha 14 anos encenei The Wall, de Pink Floyd na escola do interior, na terra do Agronegócio, e pela primeira vez meu pai me chamou de comunista, e vem repetindo todos esses anos. Aos 20, pintada de palhaço, voltando do sarau [que meu grupo de teatro fazia para pagar o aluguel da pensão], a dona do “muquifo” me chamou de comunista ao abrir a porta. Tudo volta tão fresco à memória ouvindo The Wall no repit. Aos 21, grávida, ganhando o piso de Jornalismo, e com grana para almoçar ou jantar, fui xingada de comunista, vermelha. Tive 2 carros Lada e alguns manobristas da famosa Rua Amaury, onde dirigia o conteúdo de um portal se recusavam a parar meu Lada, “não manobro carro russo”. Comunista, muito prazer.

“Sustento sozinha dois filhos e você vai manobrar meu Lada, disse num sábado de plantão no IG para rapaz do estacionamento”. Quando disse vou ser professora e voltar a PUCSP, onde aprendi ser gente, humana, meu chefe disse: “Vai fazer voluntariado agora? Bom, esse seu jeito comunista….

Dezoito anos sendo comunista com muito orgulho na PUCSP, onde a cada dia reafirmo o ser humano para algumas gerações. No lançamento do 7 livro [2018] sobre o horror das fakenews ouvi de alguém próximo, “está vendendo bem?” Por que não escreve romance, você e essa sua mania de ser comunista. Marielle, presente. Aproveito, o textão desabafo para dizer que o 8 livro, Fluido, fluxo, lançamento agora em novembro, será Creative Commons e download Free. Nada mais coerente para uma comunista.

Capa do livro Fluido, fluxo que será lançado durante o congresso ABCiber, em Juíz de Fora (UFJF) entre 21 e 23/11.

Muito prazer, Pollyana, comunista e feliz com meu rosto no espelho! É libertador ser você mesmo. Não viva em cima do muro, na sua zona de conforto. Vamos virar o jogo. Saia do sofá, lute pelo amor, pelo sol, pelo direito de ser você, ou seja, o que você quiser ser. O que quiser vestir, que opção sexual quiser escolher pra hoje, que orixá, buda, pastor quiser seguir. Lute pelo direito de ser sem gênero, sem culpa, sem medo. Lute pelo seu direito de ser feliz, pelo seu direito de ter comida no prato, ter teto e abraço.Tantos já foram queimados nas fogueiras por nós, tantos antepassados já lutaram por nós até aqui.

Saia da sua bolha, do seu Netflix, da sua cerveja IPA e lute pelo sol brilhando. 13 dias para mudar. 13 dias para dizer Não para as trevas. A idade média não chegará apenas para os mestiços, para os pobres, para os muros pichados. As trevas chegarão mais rápido na sua varanda gourmet. Pense comigo: o fluxo incessante da fakenews também vai te pegar. Você um dia vai acordar e ver que você também é fake. Sua vida bacana só existe nas telas do seu celular. Daí Joãozinho, como dizia meu amado Tio Dave, nem 5 gotas de rivotril vão te salvar. Resolva seu ódio, seu preconceito, suas fobias, sua solidão, suas sombras na terapia, não na urna.

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pollyanaferrari

Autora de Como sair das bolhas, A força da Mídia Social, Jornalismo Online, entre outros livros. Profa. PUC-SP. http://migre.me/tk6wE