Amizade Platônica

Pollyana Moraes
3 min readNov 5, 2015

Pior do que amor platônico é a amizade platônica. Muito mais grave. Quando seu melhor amigo diz que você não é o melhor amigo dele, que ele tem um outro melhor amigo. Você se acha traído, desapontado, desprezado. Oferece o máximo de sua conversa e lealdade a alguém que escolheu um terceiro como confidente. Não é fácil.

Mas não estou aqui para contar o lado de quem é traído e sim daquele que trai — sim, porque a vilania foi, é e sempre será mais interessante do que salvar o mundo. Eu traí a amizade platônica que alguém sentia (?) por mim e isso me fez refletir sobre Platão:

“A amizade é uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro.”

Sim! Meus amigos, a amizade tem por princípio, ser recíproca. Parte da educação emocional envolve entender que, infelizmente, nem sempre o nível de amor, amizade e admiração nas relações são recíprocos… Quando isso acontece, o melhor é não forçar a barra, porque ninguém gosta de cobranças e porque a amizade tem que ser expontânea, fluir normalmente. Se acontecer de você realmente admirar uma pessoa e querer fazer parte do círculo de amigos dela, o ideal é fazer a sua parte, sem esperar retorno, ou seja: doar seu tempo e seu afeto sem esperar retribuição. Sério.

Caso o contrário, você vai saborear um sentimento amargo ao se dar conta de que tudo o que você já fez e falou não teve brilho suficiente para conquistar o reinado da confiança. Lembra que os jogos, os socorros e a cumplicidade não convenceram o parceiro a partilhar de idêntico sentimento. O outro ainda acredita que tem um sujeito mais capacitado a entendê-lo do que você. Se ele pudesse optar, não estaria ao seu lado.

Isso desequilibra sua fé. Nasce uma covinha no riso, as sobrancelhas tropeçam nos olhos. Estar ilhado na admiração é perceber que você é coadjuvante enquanto pensava atuar no papel principal. Na hora em que descobre a verdade, não há inveja, e sim decepção. Parece que foi usado, parece que foi um sparring, parece que o passado foi nada. Nem pode reclamar como acontece no amor platônico. Não pode pedir estorno dos dias vividos, ou gritar que é injusto ou tomar um porre.

Dores de amizade são discretas e silenciosas. Não ser correspondido na amizade cria um vazio sem precedentes. Eu sei. E peço desculpas pelo mal que tenho causado.

O Fabrício Carpinejar contou como aconteceu com ele. Vejam o relato:

Na escola, meu melhor amigo era o Cristiano, o único colega a quem emprestei meu time de botão, o único a quem contei que amava a Gisele. Atravessava as tardes em sua companhia: jogando videogame, disputando corridas de bicicleta nas ladeiras da Mostardeiro, solucionando infindáveis cálculos de matemática.

E não é que numa redação da 5ª série, na qual revelávamos nossas grandes parcerias, Cristiano lê alto para toda turma, diante do quadro-negro, que seu amigo do peito era o Gustavo? Fui pego desprevenido, não tive tempo de esconder a tristeza, que ficou visível no rosto, escandalosa como perfume de goiaba.

Naquele instante, conheci a força secreta da rejeição. Gostava dele e ele preferia o Gustavo. Eu me percebi corneado na amizade. Um corno manso das confissões. Risquei o Cristiano rapidamente do meu texto. Mas não veio nenhum nome para substituí-lo. Não tinha segundo melhor amigo.

Menti para a professora que não terminei o texto. Ela entendeu minha solidão, e não me repreendeu. Passei a voltar sozinho para casa.

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