Vinho Barato (poesia)
A alva cor de vinagre não contesto
Se mata a sede, a bebida é o bastante.
Bebem até suor se for brilhante
O que traz a musa em seu torpe gesto.
Suave fluido da cor da mentira
Onera o santo, bebido em intento
Devotamente ingerindo o nojento
Dos fios vermelhos que ela carpira,
E ressurge com a destra na faringe
Com sinal da cruz a imunda figura
Que esparzia o infido gesto de jura
Em prata fingida no que ela tinge.
E em amarelo e negro poluído
Faz surgir nome sem conhecimento
Quando roga ao ídolo e vem volvendo
Na agrura do franco Mestre cuspido.
Suplica então, vacilante, à bebida
Num asco que a faria vomitar,
Em contenda entre o desgosto e o rogar
Para venerar a crença fingida.
A aparente fleuma da nova seita
Repleta de decoro e diamantes
Cativa no embriagar por instantes
Até que a canção silente se deita.
E sem seu domínio esquiva da luta,
Orai Maria, ajoelhai Sofia!
Tentem refuta do passo que envia:
A sobeja pena que o vinho imputa!
E em seu sono vem o vigor do Vento,
A verdadeira oração de Virtude
Que a asquerosa bebida não ilude
Por lisura e cura de pensamento!
Prata fulgente impera quando pura
Quando não há mancha no eminente.
Tece, espera, impera contente
O ardente e sumo fogo da secura!
Punge o único primor: o Vazio…
Manifesta o verdadeiro Tutor
O que fulgura no vero louvor
Dono do seio, do Mar e do rio;
E a serpente de lava do celeste,
Fervente providência onipotente,
Que sobe sempre ao cosmo, persistente
Que do fátuo vinho derruba a peste
Leva consigo chave e fechadura,
O metal da taça sempre vazia,
Que quase inexistente se faz fria
E não tem de venal sequer moldura.
Possuído som ou perdido em quietude
Da lacrimosa face da Verdade
O rido dom vem fido em Vaidade,
Há na renúncia a maior saúde.
O maior gesto de Vera deidade
É quando acaba do Vinho o torpor,
Quando chegam Veracidade e a dor:
“In vino veritas” há brevidade,
Na sobriedade habita o Amor.