Tudo é uma questão de ponto de vista
Afinal, toda história é contada a partir de uma perspectiva, seja ela qual for.
Dito isso, a escolha correta de um ponto de vista pode transformar uma narrativa sem graça em uma experiência única para os seus leitores.
Digamos que você esteja diante de outra pessoa, frente a frente. Entre vocês, presa por um fio invisível no teto, uma moeda. Se escolhermos o seu ponto de vista, veremos um lado da tal moeda. Se escolhermos o da outra pessoa, veremos o outro lado. Cara ou coroa, certo?
E escolher um ponto de vista adequado para a sua história, seja ela ficcional ou não, é essencial para atingir seus objetivos.
Toda história é contada por alguém para outra pessoa.
O que nos leva a um ponto importante antes de falarmos sobre pontos de vista:
Foco narrativo & narradores: uma história de amor
Pois é.
Segundo o linguista José Luiz Fiorin, foco narrativo, ou ponto de vista, é a maneira com a qual você irá narrar a sua história. E sabe quem determina isso? O narrador.
Em Dom Casmurro, quem nos conta a história não é Machado de Assis, mas Bentinho. É nosso protagonista quem determina:
- Nosso nível de proximidade com ele e as outras personagens e
- quais ações e sentimentos serão expostos
Se pararmos para pensar, estamos completamente à mercê do narrador que nós, autores, escolhemos para contar a história.
Segundo Norman Friedman, autor de O Ponto de Vista Na Ficção, precisamos fazer algumas perguntas para definir o foco narrativo. E elas têm muito a ver com o narrador escolhido. São elas:
- Quem conta a história? Como ela é contada?
- Qual é a posição/ângulo assumido por quem conta a história?
- Quais são os canais utilizados por quem conta a história?
- Qual a distância estabelecida entre leitor e narrador?
Para Friedman, essas perguntas criam um norte mais estabelecido para a definição do foco narrativo e até dos narradores. Quer um exemplo?
Em Dom Casmurro, Bentinho é quem nos guia pela história. Se quisermos entrar em detalhes, ele é o que chamamos de narrador-protagonista. Todas a ações e sentimentos giram em torno dele. Sabemos tudo — ou quase tudo — sobre a história e suas subjetividades porque Bentinho estava sempre no centro dos acontecimentos. Ele é, de certa forma, a história.
Mas aqui vale ressaltar um ponto bem importante sobre Dom Casmurro. Além de ser um narrador-protagonista, Bentinho é um dos maiores exemplos de narradores não confiáveis da nossa literatura. Ou seja, a credibilidade dele é comprometida seja por mentir ou apresentar um estado mental meio… debilitado.
No entanto, se pegarmos outro livro como, por exemplo, O Grande Gatsby, temos em Nick, primo de Daisy Buchanan, um clássico exemplo de narrador-testemunha. Nick estava lá, presenciou os acontecimentos, mas não era o protagonista da ação que, nesse caso, era Jay Gatsby.
Qual narrador é o melhor? Depende. Histórias diferentes demandam narradores e pontos de vistas diferentes.
Lembre-se das perguntas de Friedman:
Quem conta a história? Como ela é contada? Qual é a posição/ângulo assumido por quem conta a história? Quais são os canais utilizados por quem conta a história? Qual a distância estabelecida entre leitor e narrador?
E, aos poucos, defina quem será o seu narrador e seu ponto de vista.
Mas antes que esse artigo fique longo demais, aí vão mais três coisas importantes para você pensar antes de escolher o ponto de vista da sua história:
I. Pense nos “olhos” da narrativa
Escolher um ponto de vista é como decidir quem vai contar a história.
Se estamos dentro da cabeça de um personagem — ponto de vista também conhecido como primeira pessoa — temos a acesso a todos os sentimentos dele.
No caso de segunda pessoa, com o uso de “você”, como se nos dirigíssemos a alguém, puxamos o leitor para dentro da história.
Na terceira pessoa, narração que usa “ele” e “ela” para se referir às personagens, o autor fica sempre por perto, limitado a somente uma visão por vez.
Se você quer brincar de Deus e conhecer os pensamentos de todos, talvez o narrador onisciente seja uma boa escolha.
Nenhum ponto de vista é melhor do que outro. Todos eles servem a um propósito.
II. Cada ponto de vista = um sentimento
Como eu disse, nenhum ponto de vista é melhor ou pior do que outro. Todos são necessários.
Se você quer mais intimidade, talvez seja uma boa escolher a primeira pessoa. Ou talvez você queira mais abrangência? Vá com o narrador onisciente.
Não existe certo ou errado quando o assunto é ponto de vista.
Como sempre, a ficção é feita de escolhas que funcionam ou não.
Qual tipo de emoção você quer causar nos seus leitores? A escolha do ponto de vista certo pode ajudar a criar esse clima na história.
Pense nessa escolha como a “câmera” da narrativa. Ela vai ser mais próxima ou mais afastada? Qual vai funcionar melhor?
Só você pode dizer.
III. Experimentação é a chave
Como você vai saber qual ponto de vista funciona melhor para a sua história? Testando.
Escreva uma cena em primeira pessoa e depois a reescreva em outros pontos de vista. Somente essa pequena mudança vai impactar todo o tom da narrativa. Você, como escritor, saberá quando se sentir confortável
Decidir o ponto de vista certo é o primeiro caminho para construir uma história forte. Lembre-se: personagens e situações vêm e vão, mas seu ponto de vista é quem vai estar com o leitor do início ao fim.
Ah, e deixa eu contar uma coisa pra você…
Eu escrevo comédias românticas que se passam no sul do Brasil e deixam o coração dos leitores quentinho. Para conhecer meu trabalho é só acessar meu site ou assinar minha newsletter gratuita ✍🏻☕