A construção de uma estrela pornô pré-adolescente

Moda contemporânea para meninas do Ensino Fundamental (parte 1)

Rádio Fêmea
QG Feminista
17 min readSep 27, 2020

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Por Mardia J. Bishop / Artigo publicado no livro Pop-Porn: Pornography in American Culture, editado por Ann C. Hall e Mardia J. Bishop, 2007.

Nota da tradutora: Este artigo trata especificamente do contexto cultural, político e econômico dos Estados Unidos nos anos 2000. Embora pareça distante e alguns dados estejam desatualizados, a realidade do texto se assemelha, em muitos aspectos, à nossa cultura, graças a imposição cultural estadunidense nos países do hemisfério sul.

O texto está dividido em 2 partes. Para ler a continuação, clique aqui.

Madonna, 1985.

Nos anos 1980 e início dos anos 1990, Madonna foi culpada pelas escolhas pornográficas da moda das meninas de saias curtas pretas, meias-calças pretas e blusas pretasem formatos de corset. Com base em comentários da mídia, parece que a Material Girl foi totalmente responsável pelo consumo de opções de roupas pornográficas por meninas.[1] No final dos anos 1990 e início dos anos 2000, a ex-Mouseketeer da Disney, Britney Spears, continuou a tradição de se tornar o modelo da moda pornográfica, inaugurando a popularidade dos jeans de cintura baixíssima.[2] Sem dúvida, algumas meninas se vestiam especificamente para imitar suas modelos ou Britney, mas o surgimento e popularidade dos estilos pornográficos na moda popular faz parte de um movimento cultural maior, que viu a pornografia se tornar onipresente na cultura popular estadunidense. Muita pesquisa tem sido feita em várias indústrias onde a fusão é ainda mais aparente: a mídia, a publicidade, a moda. No entanto, como argumenta Susan Driver, “questões complexas sobre como a juventude se envolve com a intensificação de seus campos sexuais de visão como parte de suas rotinas diárias assistindo TV, jogando videogames, apreciando filmes e vídeos musicais como assuntos desejáveis e objetos desejados são muitas vezes negligenciados”.[3] O que mais se ignora é como o surgimento de roupas pornográficas estereotipadas como “da moda” ou socialmente aceitável afeta as meninas. Estudos abordaram a influência da moda “stripper” ou “estrela pornô” em adolescentes e na moda em geral [4], mas quanto às meninas jovens, somente existem estudos sobre a sexualização de meninas, não estudos específicos sobre como a moda sexualiza a menina pré-adolescente ou criança. Examinando as roupas populares para meninas de 5 a 11 anos, é claro que a moda pornográfica não se limita a mulheres adultas ou adolescentes. Está em toda parte, e seus efeitos são poderosos e de longo alcance.

Minha sinopse do que é atualmente popular para meninas em idade escolar primária é baseada em observações de roupas à venda em um típico shopping suburbano de classe média baixa a alta. A maioria das roupas descritas são da Macy’s, uma loja de departamento nacional e respeitada. Embora fotos de roupas em anúncios semanais de varejistas e revistas de moda forneçam sugestões de roupas que são tendência, optei por navegar nos shoppings para descobrir o que realmente está disponível e quais opções são oferecidas às jovens meninas e seus pais quando participam desse grande passatempo estadunidense: as compras de shopping.

Para abordar a moda contemporânea para meninas em idade escolar primária, que seriam meninas no jardim de infância até o quinto ano — ou com idades entre 5 e 11 anos — , tive que olhar em dois departamentos diferentes devido às políticas de tamanhos do mundo da moda dos EUA. Aqui, há vários níveis de tamanhos para mulheres e meninas. Os tamanhos das mulheres, que são tamanhos 36–50, são voltados para mulheres com 25 anos ou mais. Os tamanhos infantis, que são tamanhos 1–13, são principalmente para adolescentes (alunas do 7º e 8º ano, de 12 a 14 anos) até mulheres jovens na faixa dos 20 anos. Os tamanhos das crianças, que são tamanhos de 8 a 16, são para meninas de 7 a 11 anos, ou do 2º ao 5º ano. Os tamanhos das meninas, que são tamanhos de 4 a 6, são para meninas de 4 a 6 anos ou jardim de infância e 1º ano. Há também tamanhos estratificados para crianças (2T-4T), bebês (0–24 meses), e, claro, tamanhos maiores para mulheres que são maiores que o tamanho 16 para mulheres, bem como tamanhos maiores para crianças dentro do tamanho das crianças. As descrições de tamanho e faixas etárias são faixas típicas. Quão pequena ou grande é a roupa e qual a idade ela se encaixa depende do designer e, às vezes, do corte da roupa. O tamanho 10 de alguns designers seria semelhante ao tamanho 8 ou outro tamanho 12.

Atualmente, a maioria das roupas nas prateleiras dos varejistas para meninas de 5 a 11 anos são estilos que provêm da indústria pornô. Como Valerie Steele aponta, há uma relação entre roupas e sexualidade. “A moda é um sistema simbólico ligado à expressão da sexualidade — tanto o comportamento sexual (incluindo atração erótica) quanto a identidade de gênero.” [5] De acordo com Steele, roupas, materiais, cores e tendências que estão ligadas a temas sexuais, e comumente usados na indústria pornô, incluem espartilhos, sapatos e botas de salto alto, os materiais de couro, borracha, pele, as cores preto e vermelho, e a tendência de usar roupas íntimas como roupas casuais. De fato, como descrito a seguir, a moda contemporânea para meninas do ensino fundamental vem diretamente da indústria pornô, incluindo o uso de roupas íntimas como roupas casuais, os tipos de materiais usados e estilos de sapato.

Body de renda para bebês.

O estilo mais popular de blusas atualmente disponível para compra é uma blusa de alcinha ou a parte de cima do baby doll, tradicionalmente uma peça de roupa usada por baixo de uma blusa, mas atualmente usada por conta própria. Elas são feitas de cetim, seda, renda e lantejoulas — materiais que tradicionalmente têm sido associados à indústria pornô ou roupas eróticas. As blusinhas são feitas para serem apertadas e são decotadas na frente e atrás. Outra parte de cima popular é inspirada no espartilho, que pode ser uma camiseta com um espartilho atrás para ser amarrado, valorizando a forma do corpo, ou um espartilho real. Mais uma vez, essa peça é tradicionalmente uma roupa íntima, e quando não é usado como tal, está associado à indústria pornô ou é considerado uma peça de roupa fetichista.

Pode-se às vezes usar um bolero por cima do baby doll, que é uma peça de roupa curta tipo suéter que termina logo abaixo da área do peito e é amarrado em um nó, formando um decote “V”. O bolero mais comum é feito de vários tipos de fios. Com base nas minhas observações, essas peças, nos manequins do departamento feminino infantil, parecem cair mais perto da área dos seios, enquanto os boleros nos manequins do departamento adulto caem na cintura. O resultado de tal comprimento para as meninas é que a área das mamas foi enfatizada mais do que a das mulheres. É claro que a maioria das meninas de 5 a 11 anos não desenvolveram seios. Consequentemente, seus seios emergentes e pré-emergentes são enfatizados.[6]

Outra tendência nas vestimentas da parte superior do corpo são as camisetas com uma frase escrita na área do peito. A Hollister’s, uma loja semelhante a Abercrombie & Fitch, vende tamanhos infantis. Como os tamanhos da Hollister são menores do que um tamanho típico infantil, crianças de 9 a 11 anos tendem a frequentar a loja. Algumas frases em camisetas incluíam: “The Love Doctor Is In” [O Doutor do Amor Chegou], “Naughtier than I Look” [Mais Danada do que Pareço], “Life Is Better Blonde” [A Vida é Melhor Loira], “Catch Me and I’m Yours” [Me Pegue e Serei Sua], “Your Boyfriend Says Hi” [Seu Namorado Disse Oi], “Say Hello to My Little Friends” [Diga Oi Para os Minhas Amiguinhas] e “No Tan Lines on this Beach Bum” [Sem Marquinha de Biquíni Neste Bumbum de Praia]. A Limited Too, que vende roupas em tamanhos para crianças da 2ª a 5ª série (7–11 anos) e é considerada o lugar “legal” para fazer compras entre meninas do ensino fundamental, tinha várias camisetas com frases, incluindo uma que dizia: “É assim que uma bonitinha se parece”.

Os itens mais populares disponíveis para serem usados com a parte de cima do baby doll são jeans ou saias em camadas. Ambas as peças são decotadas, geralmente começando logo acima da área púbica, de modo que os ossos pélvicos ficam expostos. Os jeans mais populares são desgastados ou rasgados de várias maneiras. As saias em camadas são curtas e parecem ser feitas juntando camadas de babados. A maioria tem três camadas. Pelas vestimentas, parece que as saias devem ser as mais curtas e decotadas possíveis, ganhando o apelido de “cintos”.[7]

As roupas formais são tão inspiradas na pornografia quanto as roupas casuais de tops e saias em camadas. Uma investigação de quais opções estão disponíveis para crianças de 5 a 11 anos mostra peças que pareciam imitar a lingerie da marca Frederick’s of Hollywood. A seção de roupas formais da Limited Too apresentava vestidos frente única, camisolas, baby dolls e minivestidos justos. A maioria dos vestidos era feita de um material de tipo acetinado. Com base nas roupas disponíveis, o que meninas devem usar em suas ocasiões mais elegantes (casamentos, bat mitzvahs) é anunciado no catálogo da Frederick como lingerie erótica para mulheres.

O calçado da moda para meninas do ensino fundamental consiste em botas de salto alto com várias fivelas ou sapatos de salto alto e plataforma. Também prevalecem as sandálias de salto alto com tiras finas. Na verdade, era difícil encontrar sapatos de salto baixo em tamanhos adequados para meninas do ensino fundamental.

Na moda contemporânea, além de usar a tradicional calcinha como roupa, está disponível uma roupa íntima especial para ser usada com a moda popular. A Limited Too vende roupas íntimas de cintura baixa a partir do tamanho 7 (basicamente para crianças de sete anos) para serem usadas com jeans e saias decotadas. Também vende calcinhas string. A Abercrombie & Fitch, voltada a jovens de 7 a 14 anos, vende calcinhas fio dental para meninas pré-adolescentes, algumas com frases como “Feeling Lucky” [Sortuda], Wink Wink [Piscadinha]e Eye Candy [Colírio para os olhos].[8] O fio dental, é claro, vem diretamente da indústria pornográfica. Ariel Levy reconta a história da criação da calcinha fio dental para “cobrir” as strippers, para que Nova Iorque não ganhasse má fama durante a Feira Mundial de 1939.[9]

Para a parte superior do corpo, sutiãs com enchimentos com estampas de marcas de brinquedo como Bratz, Barbie e Saddle Club estão agora disponíveis para meninas a partir dos seis anos. O porta-voz do distribuidor dos sutiãs ou “bralettes” (sutiãs sem estrutura rígida) afirma: “A ideia do enchimento é que as meninas sejam discretas à medida que se desenvolvem”.[10] Embora o enchimento esconda os seios emergentes das meninas (até que os seios se desenvolvam e empurrem o enchimento para fora) dos olhos inquisitivos e objetificantes dos outros, potencialmente salvando as meninas do constrangimento e/ou comentários sexuais, a presença de “seios” em uma criança de seis anos, geralmente com o peito achatado, simplesmente encoraja mais olhos a estarem naquela área em formação, enfatizando demais a importância dos atributos físicos de uma menina.

Sutiã infantil.

Com base em minhas observações, a maioria das roupas disponíveis para meninas do ensino fundamental no shopping suburbano local é da indústria pornográfica, que chamarei de moda/roupas pornográficas.[11] Enquanto passeava pelas lojas, as mesmas perguntas surgiam: “Por que a maioria das roupas disponíveis para meninas é pornográfica? Por que a moda contemporânea para meninas do ensino fundamental parece muito mais velha e reveladora para uma criança de 7 anos? Por que não há muita diferença entre o que está disponível para uma mulher de 7 e 33 anos? Como as garotas se sentem ao usar roupas pornográficas?”. As respostas teóricas a essas questões tratarei mais tarde neste ensaio, mas as respostas da moda lidam com o efeito de gotejamento da moda. Basicamente, as roupas são projetadas para tamanhos femininos ou juvenis e, em seguida, são adaptadas para tamanhos infantis e femininos por meio de cortes, tecidos e mudanças de cor. Ao conduzir minha pesquisa sobre moda contemporânea, examinei primeiro o departamento juvenil porque, conforme observado pela compradora de roupas e consultora de moda Brynn Chamblee, a moda pornográfica foi projetada originalmente para esses tamanhos. De acordo com Chamblee, a moda é tradicionalmente projetada para tamanhos femininos e depois adaptada para os tamanhos mais jovens; mas a moda pornográfica é diferente, pois as roupas são projetadas para tamanhos juniores e depois adaptadas para os tamanhos mais jovens e mais velhos.[12] Outra diferença que o mundo da moda experimentou com o advento da moda pornográfica é a extensão das adaptações da moda.

Tradicionalmente, as adaptações da moda param no nível dos tamanhos das meninas: ou seja, os tamanhos das mulheres e das crianças (para idades de 7 e acima) são semelhantes, mas os designers têm estilos diferentes para as meninas mais novas. Com a moda pornô, esse efeito (chamado de economia de gotejamento) é visto em tamanhos de bebê. A Children’s Place, uma loja de roupas infantis de baixo custo, exibia minissaias de estampa de leopardo em tamanhos de 6 a 9 meses.[13] A Macy’s apresentava camisolas de renda preta, boleros de renda preta e saias em camadas de renda preta no tamanho 2T, normalmente o tamanho voltado para crianças de dois anos.

Com a nítida existência da moda pornográfica, a próxima pergunta é: como as crianças respondem ou reagem a essas modas? Obviamente, a idade e o nível de compreensão da sexualidade impedem a coleta de dados de crianças do ensino fundamental. Em vez disso, é útil discutir o assunto com professores dessa faixa etária, homens e mulheres bastante objetivos na linha de frente da infância. Consequentemente, eu me voltei a professores do ensino fundamental para tentar entender por que as meninas se vestem de maneira pornográfica e como interpretam quaisquer significados por trás das escolhas de suas roupas; basicamente, “como as meninas se envolvem com a intensificação de sua sexualização”? Além disso, eu queria descobrir por que os pais permitem que suas filhas se vistam dessa maneira. (Optei por não entrevistar os pais porque concluí que eles não podiam ser inteiramente objetivos. Afinal, eu estaria perguntando a eles, parafraseando o título de um livro recente de Celia Rivenbark: “Por que você está vestindo sua filha de seis anos como uma vadia?”).[14] Além disso, os professores forneceram uma perspectiva prática sobre a relação entre a moda pornográfica e as meninas no ambiente escolar. Realizei uma pesquisa com professores do ensino fundamental e médio de um condado da região metropolitana de Atlanta. A maioria eram mulheres brancas. As escolas do condado, no entanto, eram diversas em termos socioeconômicos e étnicos.

Vestido de renda, sutiã e calcinha infantil.

As professoras do jardim de infância até a 3ª série (8–9 anos) concordaram de maneira esmagadora que as meninas usavam roupas pornográficas[15] pois pensavam que isso as fazia parecer mais velhas. Elas comentaram que as meninas estavam tentando imitar estrelas da mídia ou irmãs mais velhas; então, parecer mais velhas era importante para elas. Além disso, meninas em todos os níveis do ensino fundamental usam a moda pornográfica para “parecerem legais”. A partir da 4ª série (9–10 anos), no entanto, as professoras notaram que as meninas usam roupas pornográficas para “serem notadas pelos meninos”. A maioria das educadoras também concordou que a maioria das meninas é muito jovem para associar sentimentos específicos às suas roupas ou como elas as fazem sentir. Apesar disso, as entrevistadas mencionaram que suas alunas atribuem um significado às suas roupas se apresentarem um animal ou personagem de desenho animado favorito, ou se for presente de alguém especial. As meninas usam roupas pornográficas porque é isso que as meninas mais velhas fazem, então as mais novas pensam que parecerão mais velhas. As professoras da quinta série concordaram que, embora as meninas dessa idade (10–11 anos) comecem a usar roupas para atrair os meninos, somente às vezes elas “usam suas roupas de uma forma verdadeiramente sexual”. Logo, elas estão usando roupas pornográficas para parecerem mais velhas e porque é “legal”.

Na maioria das vezes, as crianças podem escolher suas roupas. As professoras indicaram que, já na primeira série, as crianças (6–7 anos) podem e são incentivadas a tomar suas próprias decisões sobre moda. São os pais/responsáveis que pagam pelas roupas, então por que eles pagam pela moda pornográfica? A maior parte das professoras indicou que os pais não querem dizer “não” aos filhos, que querem evitar brigas com eles e as roupas sempre provocam brigas; muitas vezes, os pais compram o carinho dos filhos e preferem ser amigos em vez de educadores. As professoras da quinta série comentaram que os pais permitem as roupas “para que [suas crianças] sejam aceitas pelos colegas”. Algumas mencionaram que os pais estavam tentando viver indiretamente por meio de suas crianças, ou viam o nível de atratividade presumido delas como um reflexo; então eles queriam ter certeza de que as crianças estivessem vestidas de forma “atraente”. Algumas professoras comentaram que alguns pais não viam nada de errado com as roupas. A resposta geral, no entanto, foi que os pais reconhecem a moda pornográfica como inadequada, mas permitem que suas filhas a vistam porque querem que as crianças os vejam como amigos; ou permitem que elas usem roupas pornográficas porque “vai caber”.

As professoras, no entanto, afirmam que “as meninas são empurradas para uma idade ‘mais velha’ antes de estarem prontas para aceitar a responsabilidade que vem com isso.” Várias professoras comentaram que as meninas são forçadas a parecer e agir como uma pessoa mais velha quando não estão em um estágio de desenvolvimento para compreender os limites. Consequentemente, elas estão em risco psico e fisicamente. Além disso, usar roupas pornográficas incentiva recompensas pela aparência, e não por suas capacidades e habilidades. As meninas chamam a atenção pelo que vestem, não pelo que realizam na escola. A moda pornográfica “reduz a autoestima das meninas porque incentiva a atenção negativa e reduz o autorrespeito; ao usá-la, as meninas comunicam com muita clareza que irão tolerar o mau comportamento”.

Do ponto de vista prático, as professoras identificaram questões de concentração e segurança como consequência. Basicamente, as meninas que usam roupas pornográficas distraem os meninos, com hormônios em desenvolvimento, da 4ª e 5ª série (9–11 anos), assim como outras meninas. As professoras comentaram que sentiram que a maioria das meninas se sente desconfortável com as roupas porque estão constantemente puxando as alças e barras para cima ou para baixo. Além disso, as meninas parecem desconfortáveis ao usar alguns dos tops porque enfatizam o desenvolvimento dos seios — o que a maioria não quer, pois são muito grandes ou muito pequenos, ou porque seu processo de maturação física é algo que as deixam envergonhadas e elas querem manter privado. Quanto às questões de segurança, as professoras identificaram o salto alto e a bota como inseguros para andar, principalmente nas aulas de educação física.

Sapato de salto alto para bebês. Sim, para bebês.

Ao todo, as entrevistadas se dividiram quanto à tendência da moda. Metade delas acha que a moda pornográfica era mais prejudicial do que outras tendências, porque fazia as meninas crescerem muito rápido e as colocava em risco emocional e físico. Como disse uma professora: “Uma camiseta tie-dye não diz ‘vagabunda’.” A outra metade não tinha certeza ou mencionou outras tendências da moda que consideraram mais prejudiciais do que a moda pornográfica, como as minissaias nos anos 1960. A maioria das tendências mencionadas eram tendências que em sua época foram usadas como declarações políticas; isto é, demonstrações conscientes de revolta contra as estruturas de poder, como as mulheres que ficaram sem sutiã na década de 1970. Embora muitas tendências da moda comecem como declarações políticas conscientes, como a moda grunge no final da década de 1980 ou a moda gótica no final dos anos 90, o propósito revolucionário logo se perde quando o estilo se torna popular e dominante. A moda pornográfica é diferente da maioria das tendências. Apesar de algumas pessoas argumentarem que a moda fortalece as mulheres ao permitir que exibam seus corpos, o início da tendência não foi uma declaração política consciente, mas uma emulação das celebridades atuais.

Os resultados da pesquisa indicaram que a maioria das meninas é muito jovem para associar sentimentos específicos às suas roupas ou como se sentem com relação a elas; mas, ainda assim, elas usam roupas pornográficas porque é “legal” ou as faz parecerem mais velhas. Apesar dos sentimentos positivos das meninas em relação a essas roupas, da perspectiva das professoras com base em suas observações de como as alunas se movimentavam e se comportavam ao vesti-las, as meninas se sentiam fisicamente desconfortáveis, seja por causa do caimento ou da exposição do corpo.

Muitos professores e pais, no entanto, argumentam que é apenas moda, apenas roupas. Entretanto, não são. A moda pornográfica é parte de nossa cultura pornificada atual, na qual aspectos da pornografia se infiltraram na cultura pop contemporânea, desde a moda e os brinquedos até a televisão e a música. E nessa cultura pornificada predominam os estereótipos sexuais e de gênero. A pornografia reduz as meninas “a um de dois estereótipos sexistas: 1) objetos sexuais a serem pegos e rebaixados e 2) loucas por sexo e à espreita”.[16] Basicamente, a pornografia posiciona as mulheres como objetos que existem para agradar sexualmente os homens. “Provar que você é atraente, digna de luxúria e — necessariamente — que você busca provocar a luxúria é um trabalho exclusivamente feminino.”[17] Para homens serem sexualmente atraentes, de acordo com o mundo pornográfico e nossa cultura pornificada, a atratividade física é necessária. Consequentemente, como Ariel Levy argumenta, em nossa cultura pornográfica o valor das meninas está vinculado à sua aparência física: basicamente, uma menina tem valor se se veste e se parece com uma estrela pornô, tornando-se atraente para os meninos.

[1] No artigo “Haute Porn, Hard-core Couture”, de J. Leo, Madonna é creditada por popularizar “muitos estilos pornôs — sutiãs pontudos, bustiês apertados”. Ver J. Leo, “Haute Porn, Hard-core Couture,’ U.S. News and World Report, 3 de junho, 1991, 20.
[2] Um típico artigo a respeito é “Britney Brigade”, que começa dizendo: “A corrida do ícone pop é agora uma tendência de estilo. É ruim que milhões de jovens garotas, de crianças a adolescentes, queiram se parecer com ela?” e continua discutindo sobre a moda de roupas “minúsculas” que Britney é creditada por popularizar. Ver Nady Labi et al., “Britney Brigade,” Time, 5 de fevereiro, 1991, 66.
[3]Susan Driver, “Pornographic Pedagogies?: The Risks of Teaching ‘Dirty’ Popular Cultures,” M/C Journal 7.4 (2004)(accesso em 1 de setembro, 2005).
[4] O mais notável é a pesquisa de Ariel Levy sobre moda, pornografia e sexo para meninas do ensino médio, na qual ela descreve as escolhas da moda contemporânea para meninas dessa faixa etária e as entrevista sobre seus sentimentos em relação à pornografia, sexo, seus namorados e sua imagem corporal. Ver Ariel Levy, Female Chauvinist Pigs: Women and the Rise of Raunch Culture (New York: Free Press, 2005), 139–69.
[5] Victoria Steele, Fetish: Fashion, Sex and Power (Oxford: Oxford University Press, 1996), 4.
[6]
Uma vitrine de loja que observei tinha manequins vestidos com blusinhas e boleros. Os manequins foram posicionados logo abaixo de uma placa que dizia “Meninas de 7 a 11 anos”, que seria para meninas de 7 a 11 anos. Os manequins tinham seios grandes.
[7]
Levy, Female Chauvinist Pigs, 142.
[8]
Ibid., 143.
[9]
Ibid., 142.
[10]
Citado em Lindsay Beyerstein, “Padded Bras for Six-year-olds?” (September 14, 2006)(accesso em 5 de outubro, 2006).
[11]
Eu também vi esse estilo chamado de “roupas de stripper” e “estrela pornô”.
[12]
Brynn Chamblee, entrevista pessoal, 1 de setembro, 2005.
[13]
Em minha investigação de roupas femininas, passei um dia examinando as lojas do shopping. Dois dias depois voltei a tirar fotos (clandestinamente) do que observei. Naquela intervalo de tempo, o Children’s Place vendeu todo o seu estoque de minissaia de pele de leopardo para bebês.
[14]
O título real do livro de Rivenbark é “Stop Dressing Your Six-Year-Old Like a Skank: And Other Words of Delicate Southern Wisdom” (Boston: St. Martin’s Press, 2006). [Em português, algo como “Pare de Vestir sua Filha de Seis Anos como Uma Vadia: e Outras Delicadas Palavras de Sabedoria do Sul].
[15] Não identifiquei nem defini a moda “pornográfica” até a conclusão da pesquisa. No início dela, pedi às professoras que identificassem e descrevessem o que consideravam roupas inadequadas para a escola. Embora a maioria dos comentários se concentrasse na moda “pornográfica”, outros tipos de roupas mencionados eram, nas palavras das professoras, vestidos “de gangues” e vestidos de “rap”, que elas descreveram como calças muito grandes e sapatos que não estavam amarrados.
[16]
Henry A. Giroux, “Teenage Sexuality, Body Politics, and the Pedagogy of Display,” em Youth Culture: Identity in a Postmodern World, ed. Jonathan Epstein (Oxford: Blackwell, 1998), 41.
[17]
Levy, Female Chauvinist Pigs, 33.

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