A favor dos copycats

Rafael Dahis
4 min readDec 30, 2013

Durante muito tempo, me juntei ao coro dos críticos dos copycats. Empreendedorismo e originalidade, nesta minha opinião de outrora, eram uma coisa só. Qual a graça de transferir tecnologia? Puxar casos de sucesso de um lugar para o outro? Inovação era invenção — e eu queria ficar maravilhado com super ideias nunca antes ouvidas. Ambiciosamente, sonhava em ver empreendedores inovando do Brasil para o mundo, deixando que eles — os gringos — sejam nossos copycats.

A segunda fase foi passar a apreciar estes empreendedores. Quanta visão, quanta pesquisa! Ninjas em descobrir fortes tendências nos mercados externos e aplicá-los a blind spots no mercado local. Farejar negócios lá fora, com a cabeça no nosso país. Esses caras sabem fazer contas e conseguir, acima de tudo, fazer dinheiro (tanto na forma de investimento e quanto em termos de receita).

Além de visão, acurada execução também era necessária. O “mercado de copycats” é de certa forma agressivo e as barreiras de entrada tendem a ser light. Há que se executar muito bem, tentar ser o first-mover e manter-se na vanguarda para não tomar dos outros copycats (que talvez copiarão você e não o exemplo externo).

Certo que trabalhar com um modelo de negócios já existente pode ajudar a minimizar o risco. A sagacidade e o foco na execução são essenciais.

E o empreendedor que faz esta escolha é sábio — já que a criação de um novo negócio se faz através de validação e tentativa de minimização dos riscos.

E ai vem a terceira fase da minha relação com os copycats, onde os fracos não tem vez. A fase em que, de forma até polêmica, valorizo bastante os copycats. Nesta etapa, entendo que copycat é um empreendimento com seus riscos particulares e saber navegá-los exige extrema extrema habilidade. Pressiona-se para a mesma boa performance do seu irmão mais velho, enquanto na verdade, os dois irmãos vivem em fases (e inclusive ambientes) diferentes. Vivendo um pouco “lá e cá”, posso dizer: não há história igual contada por produtos e países diferentes.

Dificilmente um produto que faz sucesso lá fora pode ser exatamente copiado para o Brasil e apresentar a mesma trajetória. Os mercados são diferentes.

Vejam o exemplo de serviços de food delivery, que já são extremamente bem estabelecidos nos EUA e agora começamos a ver alguns pipocando no Brasil. O americano já tem hábito de pedir comida em casa — algumas vezes por semana. Enquanto o brasileiro, mais família, mais “dona-de-casa”, era mais acostumado ao delivery ocasional, a pizza para juntar os amigos e uma ou outra coisa para acompanhar o futebol. Trazer um modelo destes para o Brasil exige entendimento profundo e certamente adaptação a outros hábitos. E exige que aceitemos abertamente o axioma “performance passada (do irmão mais velho lá) não é garantia de performance futura (do irmão tupiniquim aqui)”.

E os apps de Taxi, novo boom dos empreendedores brasileiros? Same thing. Taxi no Brasil e Taxi nas “gringas” são coisas diferentes. O Uber e Lyft, que estão indo muito bem lá fora, e possivelmente inspiraram os apps de Taxi no Brasil, dificilmente funcionariam nessas nossas ruas. Não pegamos carona, cara. Quem empreendeu com perspicácia e soube entender as diferenças foi trabalhar com taxistas individuais e cooperativas, e está tendo sucesso com a nova sensação. Mudando os hábitos dos brasileiros — porque entendeu os brasileiros.

Nem preciso comentar muito sobre compras coletivas. Podem até alegar que o movimento dos players brasileiros foi muito parecido com o que vimos lá fora. Mas sem dúvida as motivações dos usuários eram distintas. O americano era cuponeiro desde sempre. Colecionar cupons era um hábito — que se passava de pai para filho. Há anos vendem-se organizadores de cupons em lojas e papelarias. Há anos os americanos folheiam seus jornais re recortam os anúncios de desconto. Já o Brasileiro, apesar de nunca ter tido hábito parecido, era um malandro por natureza, gosta de tirar vantagem e economizar. Ama desconto. Um mesmo produto acabou alcançando, de maneira parecida, diferentes mercados. Mas a pegada teve certamente que se ajustada para cada um deles.

O que torna mais difícil o trabalho de um empreendedor-copycat é a própria sombra do seu irmão mais velho (e gringo).

Cada nova feature, cada nova decisão, cada novo resultado é inevitavelmente comparado entre os dois. Fugir deste espelho e diferenciar-se exige muito feeling, e certamente coragem para escolher tomar um pouco mais de risco com objetivo de atingir resultados ainda melhores. É sair do trilho, exatamente por acreditar que a trajetória não deve ser a mesma para os dois produtos.

Os copycats ajudam a nivelar mercados.

Eles têm seu papel educativo entre novos empreendedores “em transição”. Estes, dificilmente conseguiriam sobreviver na selva da pressão por ideias 100% novas e disruptivas (se é que isto existe). Não teriam fôlego para uma busca como esta. A possibilidade de começar com um modelo já validado em outro país, lhes oferece um norte e consequenetmente, mais coragem.

O mesmo fenômeno acontece com investidores. Observe os recentes investimentos das firmas de Venture Capital brasileiras, minimizando risco ao apostar em modelos já existentes lá fora.

Por fim, o copycat é essencial para a criação do ecossistema no Brasil. Precisamos deles. Trazem conceitos, coragem, exemplos e muitas vezes até sucessos para a nossa recém-nascida comunidade de startups digitais. A cultura do risco tal qual conhecemos é na verdade a cultura de altíssimo risco para obter altíssimo retorno. Existem outros niveis de risco até um mercado amadurecer e poder fazer esta transição. E os copycats encaixam perfeitamente nesta fase.

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Rafael Dahis

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