Veganismo no Brasil

Raw vegan.
9 min readMay 22, 2020

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Como um movimento underground com bases no punk, transformou o veganismo no Brasil.

O veganismo nos dias de hoje é muito difundindo aqui no Brasil, diversas classes, pessoas de diferentes visões, experiencias e posições politicas estão aderindo a filosofia.
Apesar de a muito tempo o Brasil ter registros de vegetarianos como o jornalista Carlos Dias Fernandes que já atuava como um propagador do vegetarianismo como autor do livro “Proteção aos Animais” e até mesmo a fundação da Sociedade Brasileira de Vegetarianismo ( 1917 ) o veganismo ainda não era conhecido por aqui.

STRAIGHT EDGE

O Straight edge foi difundido nos anos 80´s com o Minor. Threat, porém já existem indícios que por meados dos de 77 a 80 já existiam alguns grupos de anarco-punks que tinham uma vida livre de drogas mas sem mencionar o termo “straightedge”.
O straight edge se resume a ter uma vida livre de drogas, cigarro, cerveja, um postura positiva e libertária.

Live for This — No galpão do Jabaquara — Foto Mauricio Santana

Esse movimento nasceu dentro do PUNK que na época era totalmente atrelado ao alto consumo de drogas e o straightedge que veio através de uma música do MINOR THREAT com o mesmo nome, que fala justamente o disso, dos punks que na época pareciam “mortos vivos”, abusando de drogas.
Uma marca importante dentro do stright edge é o “X” marcado nas mãos, segundo historiadores do movimento diz, o X era para marcar quem era menor dentro do bares de shows e não poderiam consumir bebida alcólica.

VEGAN ANARCO-PUNK

O veganismo ganhou muita força quando bandas como Flux Of Pink Indians e o CRASS já falavam de libertação animal atrelado a uma politica libertária e questões sociais, isso no começo dos anos 80’ o veganismo já tinha a sua porção politica.

“Se não fosse pelo anarco-punk, especialmente as bandas que cantaram sobre libertação animal, o movimento vegan/direitos animais não seria tão grande como é hoje, e não há discussão!”

Rat — Guitarrista do Statement — percursos do VEGAN STRAIGHT EDGE

Só conhecemos o veganismo globalmente por influências dessas bandas que vieram do underground e do submundo para falar de libertação animal e se juntar a causas como a ALF ( Animal Liberation Front ) e transformar a causa animal e chegar a inúmeras pessoas, o fundador da banda STATEMENT, Rat diz exatamente isso — “Se não fosse pelo anarco-punk, especialmente as bandas que cantaram sobre libertação animal, o movimento vegan/direitos animais não seria tão grande como é hoje, e não há discussão!”

VEGAN STRAIGHT EDGE

Entre o crescimento das ideias de libertação animal dentro do ANARCO-PUNK surgiu também o movimento VEGAN STRAIGHT EDGE, que foi a junção do veganismo com o movimento straight edge.
Esse junção surgiu sem realmente o propósito de ser assim, o próprio Rat, que era vegano, porém seguia uma vida livre de drogas, fundou o STATEMENT e o VEGAN REICH que na época seriam os percusores do termo VEGAN STRAIGHT EDGE, Rat sempre comentou que nunca usou esse termo “straight edge” apesar de nunca consumir drogas.
Uma vez que também junto com essas ideias, surgiu também o movimento HARDLINE que por sua vez, tinha ideias mais extremistas tanto sobre o straightedge, veganismo quando sobre ações libertárias.

Capa do EP de 1992 do Earth Crisis

Após isso, a junção de não usar drogas e falar sobre libertação animal, ganhou forças nos anos 90´s e começou a se expandir dentro do movimento Hardcore e do metal.
Bandas como EARTH CRISIS, REPRISAL, MORNING AGAIN já começavam a falar sobre veganismo de um modo bem firme e ganhar milhares de seguidores pelo mundo todo e seguir uma linha de militância em prol do veganismo.

Além disso, o vegan straight edge começou a expandir por diferentes pontos de vista, foi ai também que surgiu as bandas chamadas de KHRISNACORE bandas seguiam a visão do movimento hare-khrishan começaram a integrar , o maior expoente do gênero seria o SHELTER com suas letras amorosas e positivas, criou uma legião de fãs e adeptos, mas também outras bandas surgiram falando de religão, sociedade, consumo e libertação animal, como o 108, SKINKIN DEEPER, CRO-MAGS entre outros, foi então que o boom desse movimento partiu para o Brasil

“Fim dos anos 90 em São Paulo foi quando tive meu primeiro contato com a cena straightedge* de SP e consequentemente onde eu ouvi falar de veganismo, direitos animais (que engatinhava a época) e uma alimentação sem carne, ovos, leites e seus derivados. Muito disso devido ao anarquismo, que era a visão política da imensa maioria dos punks da época.” — Franz.

CHEGANDO NO BRASIL

Franz, um vegan straight edge lendário na cena, comenta como foi sua introdução e como viu o movimento vegan straight edge surgir no Brasil. “Fim dos anos 90 em São Paulo foi quando tive meu primeiro contato com a cena straightedge” de SP e consequentemente onde eu ouvi falar de veganismo, direitos animais (que engatinhava a época) e uma alimentação sem carne, ovos, leites e seus derivados. Muito disso devido ao anarquismo, que era a visão política da imensa maioria dos punks da época.”

“Cosméticos não testados em animais na época eram raros, informação sobre nutrição vegetariana era bem difícil de encontrar (vegana então…) e por conta disso o que nos restava era estudar, ler, pesquisar muito pra saber montar um prato que suprisse todas os requisitos nutricionais.

Franz ainda comenta o fato de na época ( anos 90 ) não ter internet e muitas das informações eram adquiridas ou por trocas de cartas ou através de fanzines onde se compartilham discos, receitas que na época na tinha em relação a alimentação vegan, mas também não só a alimentação, como também produtos, segundo Franz — “Cosméticos não testados em animais na época eram raros, informação sobre nutrição vegetariana era bem difícil de encontrar (vegana então…) e por conta disso o que nos restava era estudar, ler, pesquisar muito pra saber montar um prato que suprisse todas os requisitos nutricionais. O sabor em muita das vezes ficava em segundo plano (quem aqui tomou extrato de soja da mãe terra sabe do que estou falando), mas o que importava era a vida e a liberdade dos animais.”

A VERDURADA

1992 surgiu a Liberation, selo voltado a bandas straight edges e também vegans, foi uma grande potência na propagação do movimento para o Brasil e o mundo e do crescimento da cena.
Em 1996 surgiu então talvez o que seria o mais importante acontecimento dentro do movimento o Coletivo Verdurada. Inicialmente a verdura surgiu na famosa “casinha” onde sempre tinham bandas, palestras e no final um almoço vegetariano servido pelo icônico Lila.

Cartaz da verdurada

A verdurada foi talvez o maior divisor de águas, foi onde o vegetarianismo — veganismo realmente ganhou potência e muitas pessoas começaram a conhecer a ideologia que iria se espalhar por todos os cantos. Quando a verdurada passou para o “galpão” as coisas já tinham ganhado uma certa solidificação, muitas pessoas aderiram ao vegetarianismo e ao veganismo, e toda essa atmosfera começou a refletir principalmente na cidade de São Paulo onde se tornou um polo no Brasil.

“Ir a shows dessas bandas nas verduradas e ouvir falar sobre veganismo, conversar sobre direitos animais, aprender receitas nos zines e comer a comida que era servida ao final dos shows era o ponto máximo dessa época onde aprendíamos juntos sobre veganismo, sobre libertação humana e libertação animal, até por que no meu entender um não existe sem o outro e ambos passam pelo fim do capitalismo”.

Cartazes da verdurada

Não era dificil circular pelos entornos da galeria do rock em São Paulo e não ver alguém como alguma camiseta escrita VEGAN ou VEGETARIANO, começou a sair do underground para a sociedade geral, Franz relata a importância da verdurada na sua formação — “Ir a shows dessas bandas nas verduradas e ouvir falar sobre veganismo, conversar sobre direitos animais, aprender receitas nos zines e comer a comida que era servida ao final dos shows era o ponto máximo dessa época onde aprendíamos juntos sobre veganismo, sobre libertação humana e libertação animal, até por que no meu entender um não existe sem o outro e ambos passam pelo fim do capitalismo”.

Palestra na Verdurada

Além dos shows a verdurada sempre teve cunho politico, as palestras, sempre falavam sobre libertação animal, sexismo, politica e também diversos atos foram organizados dentro do coletivo. Isso começou a chamar atenção de diversas pessoas, podíamos encontrar pessoas que começaram a se identificar com o veganismo frequentando a verdurada sem entender aquele amontoado de gente se jogando umas nas outras e bandas gritando, mas além das diferenças, um ponto de união entre todas as pessoas fazia todo o sentido, o veganismo começou a unir as pessoas de diferentes pensamentos e até as que não entendia o que muitas vezes acontecia nas verduradas.

Foto 1 Good Intenrions Foto 2 Nueva Ética- Foto Mauricio Santana

A partir disso, o veganismo começou a ganhar outras proporções e visibilidade, o que era antes visto apenas como uma ideologia juvenil, passou a se tornar algo maior começaram a surgir os primeiros restaurantes vegetarianos no Brasil que muitas vezes eram ponto de encontro para os straight edges, o Lotus, o Rei do Mate da galera a sorveteria Soroko, todos esses sempre tinham opções vegans e vegetarianas já que nessa época encontrar algo era extremamente raro.

A verdurada não só começou a expandir o movimento Straightedge e o vegatarianismo e o veganismo mas criou uma identidade politica por trás disso tudo, o que sempre foi um dos pilares do coletivo, a verdurada se tornou um encontro libertário uma local de trocas de ideias, encontro com amigos de todas as partes do Brasil e muito conhecimento.

Show do CONDOLÊNCIA BANDA VEGAN STRAIGHT EDGE NA VERDURADA. Apresentando introdução sobre Libertação animal.
POINT OF NO RETURN — Uma bandas principais bandas VEGAN STRAIGHT EDGE
Exposição Verdurada, retirada do Flickr

O LEGADO DA VERDURADA E DO STRAIGHT EDGE

O veganismo só é o que é hoje no Brasil por conta do empenho dessa geração que fez de tudo para expandir o nome do veganismo se hoje o veganismo passou muitas vezes de uma filosifia de vida para um “negocio” tudo isso é graças ao straight edge e também a verdurada.

“Enquanto escrevo isso com o coração aberto, sem regras, com uma memória vivida, lúcida de um tempo histórico e com lágrimas nos olhos mas orgulho do quanto o STRAIGHT EDGE ne transformou como pessoa, escuto a música que mais marcou minha vida.”

O veganismo surgiu como uma ideologia única, mas se expandiu de uma forma que aderiu a diversas frentes de questionamentos, o anarco-punk, o punk, hardcore e o straight edge que pegaram uma ideologia que transformaram em musicas, em revolução sonora se hoje a elite e até a Xuxa é vegan é por conta do movimento PUNK do submundo, das pessoas que lutaram contra o capitalismo e venceram com uma sun-cultura.

O veganismo expandiu foi por que existiu a verdurada, as paletras e o ativismo mesmo que de modo centralizado.
Em uma época onde não existia nada, nem comida, nem informação rápida, a única forma de entender e disseminar o veganismo era através da musica.

CHIBATA — POINT OF NO RETURN

Um baque seco
A porta se fechou
Seus olhos se abrem
Você voltou
O ar denso e quente, o cheiro de queimado
A dor de respirar, a mente atordoada
Você acorda ofegante, esfrega o rosto em vão
Permanece o pesadelo — que não acaba mais
No seu olhar, o desejo de não ver
A cena degradante que envolve o seu ser
Você percebe que não poderá escapar
O duro preço da coerência
Um jogo sádico
Um ritual cruel
O esforço de resistir
Recusar a se entregar
A grandeza e a miséria da condição humana
Chutes e socos, choques constantes
Seu sangue escorre, a força se esvai
Amarrado e nú você aguarda
O fim do sofrimento
Mas o veredicto já foi dado
Mais um cadáver não enterrado
Agora já não importa mais

Lutar ou se render
Fruto amargo da repressão
Arrancaram o seu espírito
Te tornaram um corpo vazio
Uma herança de constante horror
O vício do medo adquirido
Homems meio-homems não-homem

O veganismo no Brasil só é o que é, graças a todos que fizeram desse movimento e dessa ideia uma forma de vida.
Obrigado também ao Franz por ajudar XXX

Obrigado a todos!

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Raw vegan.

Um blog que logo será um podcast onde falaremos de veganismo, esporte, saúde, ativismo e também sobre o mundo.