O que o MinC tem mais que a Kaiser?

Eden Wiedemann
4 min readSep 18, 2015

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Ontem um post do Ministério da Cultura criou um buzz infernal nas redes. No post o MinC divulga uma nota oficial onde responde algumas acusações feitas pelo Reaçonaria, uma espécie de portal de oposição. Aparentemente o MinC não leu meu post sobre a verticalização do insulto e bateram palmas pra ver maluco dançar.

O problema não foi o conteúdo em si — afinal um órgão público prestar contas e buscar transparência é algo positivo e recomendável — e sim a abordagem. "Reaças, temos um recadinho pra vocês!". Com ponto de espantação e tudo mais. Uma enxurrada de criticas atingiram em cheio o órgão e sua equipe de comunicação. A existência de uma tensão social serviu de catalisadora e… bum. Problemas. Usar o termo "reaças" cria uma polarização desnecessária e que não pode nunca ser vinculada ao Ministério. Reaças ou Petralhas, como os extremos se chamam, são cidadãos e, apesar de suas diferenças, merecem respeito. É preciso entender que a comunicação de um órgão público ou gestão deve primordialmente, ao menos na teoria, atender as demandas da população e não de um grupo, partido ou pessoa. É preciso falar estando acima de disputas políticas, vaidades ou birras, é preciso prestar serviço de verdade. O conteúdo, seja lá em que canal ou meio seja publicado, deve ter como objetivo melhorar a vida da população.

Eu já defendi várias vezes que a internet funciona seguindo a natureza do movimento de manada. Quatro comentários negativos seguidos em uma postagem estimulam outros tantos em seguida, por exemplo (é uma métrica antiga, mas era, na época real, e duvido que tenha mudado). No caso de uma postagem como essa do MinC os haters causam o estouro da boiada e o resto, bom, o resto vocês estão acompanhando.

— Vocês precisam estar preparados.
— Preparados?
— Nós temos uma quantidade imensa de haters.
— Haters?
— Sim, gente que odeia a marca e vai falar mal de tudo que fazemos!

Eu ouvi isso em uma reunião sobre uma campanha pra Kaiser. Haters, eles diziam. Eu escutei e acenei, com toda atenção, em respeito ao sentimento que eles acreditavam ter tido origem na campanha de anti-propaganda movida contra a marca há anos. Escutei, mas no fundo discordava. Eles não tinham haters, as pessoas não odiavam a marca e nem a cerveja. Elas não se mobilizariam contra ela, por exemplo. Apenas repetiam algo que aprenderam, muitas sem nem ter provado a cerveja. A noção de haters, ou de ter haters, deles estava completamente errada.

Sabem quem tem haters?

Gestões públicas.

É, gestões públicas, em qualquer nível. Governo federal, estadual ou municipal tem haters. E olha que não estou me referindo aos políticos e sim as estruturas. Quando uma gestão é eleita ela deixa no vácuo o cidadão que "escolheu o outro lado e não ganhou". Na maioria dos casos isso significa 30% do eleitorado. Esses, amigos, não apenas não gostam, boa parte deles assume postura que vai além da simples crítica, tendo um tom belicista, gastando tempo em energia em ridicularizar, atacar, denunciar e até mesmo propagar boatos. São milhares de fiscais, apenas procurando uma falha, apenas buscando uma pisada na bola, um pequeno errinho.

Marcas raramente tem haters assim. Um ou outro cliente que teve uma experiência muito ruim, um ou outro movimento que se posiciona contra determinada postura da marca, as vezes uma mobilização maior em cima de um determinado fato que logo cairá no esquecimento.

Some a existência de hater a algo como um humor social negativo. Pense numa variável que de alguma forma interfira em várias reações da população. Quando esse humor social está positivo a população recebe melhor notícias ruins, assume postura mais otimista e coisas assim. Quando esse humor social está negativo os ânimos estão acirrados, a população fica mais agressiva, crítica e resistente àqueles que consideram responsáveis pela situação em que estão.

Como vocês acham que está o humor social agora?

Diante desse quadro todo cuidado na comunicação de órgãos públicos é pouco. Uma legião crescente de haters e descontentes esperam apenas uma leve escorregadela pra gerar um buzz sem fim capaz de tirar o sono de qualquer equipe de comunicação. E não é preciso errar a mão como errou o Ministério da Cultura nesse post, basta ver o caso do Governo do Distrito Federal que virou meme e recebeu uma enxurrada de críticas por um erro banal.

Certamente o responsável pelo SRM deu enter antes de acabar a resposta, não um sinal de desrespeito e sim uma falha operacional que pode acontecer em qualquer lugar. Veja como é curioso, a intenção do GDF de interagir com o cidadão, de conversar, virar contra si mesmo. Uma boa intenção, um trabalho que vem sendo bem feito, gerando problemas…

Cuidar da presença digital de órgãos e pessoas públicas é um desafio, amigos, acreditem.

Mas, e aí, descobriram o que o MinC tem mais que a Kaiser?

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