Na última segunda-feira (9), a Globo estreou sua nova novela das 9, Mania de Você. Escrita por João Emanuel Carneiro, a obra tem uma trama interessante, uma direção competente, belas imagens e um elenco quase impecável. Sob a promessa de que “o jogo vira o tempo todo”, a novela prometia apresentar personagens dúbios. Sim, prometia, porque a edição feita nos capítulos não permite a compreensão do enredo. Estou fortemente incomodado com a falta de desenvolvimento na relação dos personagens, isso porque a Globo cortou cenas ao longo da semana para readequar a novela à grade de programação e para evitar o choque do público — já que, aparentemente, o brasileiro não gosta de sexo e não assiste o Cidade Alerta diariamente com medo de violência.
Saiu na coluna do Léo Dias que o diretor-geral da emissora, Amauri Soares, teria solicitado a redução de cenas desse tipo, visando evitar a fuga de público. O problema é que, por essência, Mania de Você é uma novela erótica e violenta. Diante da solicitação, de uma redução de tempo de arte e da baixa audiência — uma vez que a novela foi exibida em horários diferentes por cinco dias consecutivos — , muitas cenas primordiais para entender as relações dos personagens não foram ao ar. Para exemplificar, trago dois momentos da trama que ficaram confusos. O primeiro envolve o embaraço amoroso envolvendo os protagonistas. Viola (Gabz) e Rudá (Nicolas Prattes) se viram no capítulo 2 e, de cara, houve uma tensão sexual. Depois, os dois ficaram balançados, mas não voltaram a se ver. Nesse meio tempo, Luma (Agatha Moreira) e Viola tornaram-se amigas. Até aí, tudo correndo bem para um climão daqueles dignos de novela clássica.
No capítulo 4, Molina (Rodrigo Lombardi) bola um plano e convida Rudá para um jantar. Eu esperava que acontecesse um climão absurdo, já que, teoricamente, Viola descobriria no jantar que o homem por quem está apaixonada é o namorado de sua amiga. Acontece que Rudá entra na sala e… todos agem naturalmente, incluindo a própria Viola, como se já soubesse! Depois, do nada, ela se incomoda e decide sair, alegando que irá tomar um ar. Rudá vai atrás e, na parte externa da casa, ele a agarra e os dois se beijam na maior intimidade, como se isso já tivesse acontecido antes. Os cortes das cenas acabaram comprometendo toda a trama central da novela, porque não conseguimos entender a relação entre Viola e Rudá, casal protagonista da história. Agora, está difícil se envolver com o enredo.
O segundo problema está na trama paralela de Ísis (Mariana Ximenes). Ela volta ao Brasil com o marido, mas tem um amante. O marido descobre tudo e, com o amante, ela arma um plano para matá-lo antes que seja tarde demais. O capítulo 3, de sua chegada, reservou uma cena quente entre ela e o amante, vivido por Allan Souza Lima. A Globo confirmou que a cena foi ao ar por engano, porque pertencia a uma versão não finalizada do mesmo capítulo. Ou seja, por sorte é que entendemos a relação de Ísis e Guga. Já a trama do marido traído passou por um infortúnio e foi ao ar desconexa. De repente, Henrique (Antonio Sabóia) pede o divórcio. Depois, também repentinamente, ele flagra um encontro dos dois e age como se já soubesse do caso. Não pudemos ver Henrique desconfiando da esposa, como as chamadas de estreia prometiam, então, mais uma vez, a edição comprometeu a trama.
Para a semana que vem, novos cortes estão previstos. Para tentar uma subida na audiência, a Globo unirá 3 capítulos originais em um novo, limando dezenas de cenas que também ajudariam o público a conhecer os personagens. É revoltante, porque, para além do desrespeito com o autor e toda a equipe, isso só confunde ainda mais o público que está acompanhando. Está certo, realmente a audiência caiu, mas eu estou assistindo à novela. Ou tentando entender o que restou dela, pelo menos.
“Aqui na minha ilha, a censura é livre.” — Molina para Viola no capítulo 5. Está falando de sua propriedade, mas poderia ser sobre Mania de Você.