Epiderme

Rita Passos
2 min readAug 13, 2022

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Senti o frio do ar tomando espaço enquanto nossas peles se afastavam e só naquela hora a ficha caiu.
Acabou.
Te deixei dormindo numa paz que é só tua, que vontade de abraçar forte e sentir de novo o calor que emana de quem a gente ama, mas não existe isso de abraços de despedida. Um nunca basta. O jeito é encarar e puxar o ar, aqueles de encher o peito e sair de mansinho.

Há certezas no mundo que eu não gostaria de ter. Uma delas é que, vira e mexe, sei que minha mente vai se perder na bagunça e brilhar teu nome, em horário nobre, no maior outdoor da minha cabeça. Tua ausência na vida deixou um espaço concreto que meu consciente previa e quer se habituar, mas meu corpo ainda sente calafrios e sofre de abstinência. Tudo se espalha em mim como correntes elétricas em contato com a água, e como diz minha mãe: “mar não tem cabelo”.

Sem ter onde me agarrar, só imerso e sinto.

Um dos motivos pelo qual ainda te escrevo, são as dúvidas que pairam e me param:

Será que em algum canto teu vai restar, em sinal de teimosia ou bem-querer, algum resquício meu? Talvez preso ao pescoço, entre os ombros e teu peito, ou dedos, num fio do teu cabelo preto ou perdido na nuca? Em forma de resistência ou saudade, vai se lembrar de como era meu toque? No trocar de células, dizem por aí, que nosso corpo se renova a cada 7 anos. Não sei se estou pronta para que me expulsem de você junto delas, nem se um dia eu quero perder da minha matéria teus rastros, que provam tua presença se porventura nossos caminhos não se cruzarem mais.

Sabes bem, tanto quanto eu, que as coisas não terminam da noite pro dia, de domingos para segundas, de uma semana pra outra, do calor que arde o quarto para o frio da cozinha, com aquela pequena fresta da janela que já é o suficiente pro vento de agosto que abraça São Paulo invadir.

Em coro uníssono todos os meus sentidos estão se questionando:
Um dia será como se eu nunca tivesse aquecido teu corpo?
Um dia vou ter um corpo que você nunca tocou?

Qual é… Diz que isso te assusta também, vai?!

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