O que o livro Design Thinking do Tim Brown me ensinou

Rodrigo Caires
11 min readMar 15, 2019

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Tim Brown é CEO da IDEO, a maior e mais respeitada consultoria de inovação do mundo.

Designer industrial por formação, Tim Brown revela em seu livro que levou 15 anos de profissão para entender o real poder do design. Que não era apenas um elo entre engenharia, marketing e cliente, mas era como o eixo de uma roda.

Diante disso, é possível perceber o quão complexa é a profissão, e ter ideia da dimensão do efeito que um trabalho bem realizado pode alcançar.

O livro não aborda frameworks, ferramentas ou teorias aprofundadas de processos, mas do que se trata o design thinking, qual a sua essência, onde pode ser aplicado, que resultados podem ser obtidos, a importância e as dificuldades do processo de mudança e inovação, além de inúmeros cases inspiradores.

Dividi este artigo em seis espaços, onde fui agrupando premissas, ensinamentos, frases e pontos de vista valiosos sobre design thinking propriamente dito, empatia, ideação, experimentação, o universo dos negócios e alguns cases.

Sobre o design thinking

“O design thinking, ou pensamento de design, é uma abstração do modelo mental utilizado há anos pelos designers para dar vida a ideias.”

Ainda não é uma definição muito esclarecedora, não é verdade? Algumas perguntas estão implícitas como: que modelo mental é esse? Isso é um processo?

Para tentar entender melhor, pensa comigo que um produto ou serviço “wow” — inovador, disruptivo e incrível — só se torna real se ele for financeiramente viável, tecnicamente possível e desejável. Financeiramente viável é tranquilo de entender, normalmente é a primeira restrição a qual somos apresentados. Tecnicamente possível quer dizer se há tecnologia existente ou que possa ser desenvolvida. Teletransporte por exemplo, infelizmente não está disponível, ainda. E o desejável significa que seja algo que o público ou usuário não consiga mais viver sem aquilo, que faça uma significante diferença em sua vida.

É muito comum nos depararmos com ideias e projetos que partem de uma visão simplesmente financeira do tipo “vê aí o que dá pra fazer” ou de um interesse puramente tecnológico e funcional como “vamos fazer a mesma coisa só que de um jeito mais eficiente”. O tal do modelo mental do designer inicia um projeto a partir do lado humano, do que é desejável, com uma abordagem centrada no ser humano, procurando responder questões como: isso faz sentido? Qual é o real problema que as pessoas têm? O que satisfaria as reais necessidades? O que criaria significado e geraria valor?

Agora, vou repetir a definição citada logo acima e acho que você vai conseguir entendê-la um pouco melhor:

“O Design Thinking, ou pensamento de design, é uma abstração do modelo mental utilizado há anos pelos designers para dar vida a ideias.”

Fonte: Google gifs

Como a abordagem do design procura equilibrar as perspectivas dos usuários, da tecnologia e do negócio, fica claro que sua natureza é integradora.

Nessa linha, o briefing não pode ser nem tão restrito que não dê espaço à criatividade e geração de hipóteses, nem vago demais onde caminhe para algo muito incerto e inconclusivo. O bom equilíbrio dará subsídios para que a equipe trabalhe com entusiasmo e consiga gerar ideias revolucionárias.

Falando nisso, inovação é algo que está intrinsecamente ligado ao design thinking. Pela necessidade da busca por coisas novas em um mercado tão competitivo, cada vez mais têm-se aplicado o design thinking como abordagem para alcançar tais objetivos.

E fique atento! Invenção é diferente de inovação. Uma ideia inovadora é aquela que agrega valor, que é bem executada e traz muito significado para quem se beneficia.

Ah, então vamos começar com isso amanhã mesmo!! Bom, não é tão simples, o caminho é longo, requer aprendizado, maturação, mudança de cultura e de modelo mental. Os pilares do design thinking são a empatia, a colaboração e a experimentação. Para que isso aconteça, é necessário que haja a participação direta do usuário no processo, que seja formada uma equipe interdisciplinar, que ocorra o desenvolvimento de ideias a partir da ideia do outro, bem como o incentivo à experimentação, onde tentar, errar, fazer de novo e testar não seja encarado como um desperdício de tempo e dinheiro, mas como uma forma acelerada de identificar as falhas e aprimorar a ideia o quanto antes, evitando que ocorra a infeliz descoberta que o negócio não deu certo, que todo o investimento foi depositado em uma ideia fraca e sem sentido.

É fundamental também, preparar um espaço físico para o trabalho, que ele seja grande o suficiente para que todos os materiais estejam sempre visíveis e que de certa forma possa ser móvel, remodelando conforme a necessidade. Um espaço que estimule a criatividade, pois espaços padronizados tendem a produzir ideias padronizadas.

Fonte: www.pexels.com

Mas tudo isso segue um ritmo, uma dinâmica recorrente entre fases de divergência para criar opções, levantar hipóteses e outra de convergência, direcionada a definições e escolhas.

O design thinking sempre começa com um movimento divergente, afim de aprofundar o conhecimento sobre o público-alvo. Levantar fatores psicológicos, comportamentais, contextuais e etnográficos. Identificar as principais dores, o que ele fala, o que ele pensa e o que ele realmente faz. Este é o caminho e não o obstáculo para a inovação.

Já a fase convergente é o momento de fazer escolhas. É doloroso abandonar uma ideia que parecia promissora, pode gerar ruídos e crises de ego em alguns membros da equipe. É nesse momento onde as habilidades diplomáticas dos líderes do projeto são postas em prática. Mas se faz necessário, pois nunca é possível abraçar tudo de uma vez só.

Ser questionador, investigador, buscar fazer as perguntas certas, perguntar ‘por que’ quantas vezes for necessário aumentará as chances de direcionar a energia aos problemas certos.

Até aqui, foi possível ter uma noção generalista sobre o que é design thinking e como se aplica. O desenrolar de um projeto baseado em design e centrado no ser humano passa por diversas fases, algumas delas foram bem evidenciadas no livro, que são a empatia, a ideação e a prototipação. Vamos entender um pouco mais sobre elas?

Empatia

“Os design thinkers observam como as pessoas se comportam, como o contexto de uma experiência afeta sua reação a produtos e serviços. Eles levam em consideração o sentido emocional das coisas, bem como seu desempenho funcional. E, com base nisso, tentam identificar as necessidades não declaradas ou latentes das pessoas e traduzi-las em oportunidades.”

O trabalho começa por aqui, na tentativa de ver o mundo com os olhos do outro, de calçar o sapato do outro, de passar pelo que o outro passa, vivenciar suas dificuldades e seu ambiente. O que sentem? O que os afeta? O que os motiva? A compreensão emocional é essencial nesse momento, para que bons insights possam surgir adiante.

Para buscar os insights disruptivos é necessário observar os extremos, aquelas pessoas que usam produtos, que pensam, que vivem e consomem de forma diferenciada e inesperada. As clássicas gambiarras por exemplo, nada mais são do que a resultante criativa para uma solução onde não havia os insumos adequados. Da criatividade genuína, muito presente na infância e deixada de lado na fase adulta, pode surgir a ideia perfeita para o que se quer resolver.

Abra os olhos. Observe o corriqueiro e reflita. Analise uma atitude ou objeto como um investigador, aquilo que normalmente você não pára para observar. Por que a faxineira se veste desse jeito? Por que essa garrafa tem este formato? Por que aquela marca usa tal cor? Por que essa pessoa vive tão irritada?

Visualize. Procure fazer registros visuais de tudo. Fotos com o celular ou desenhos, mesmo que rudimentares. Se não sabe desenhar, desenhe assim mesmo.

Não pense, olhe. Ser visual nos permite perceber as coisas de uma outra forma, nosso cérebro passa a criar novas conexões neurais, ele faz associações diferentes de quando nos baseamos apenas em textos e números.

Ideação

A colaboração é essencial neste momento. É hora de reinar o pensamento integrativo, de resistir à lógica do “isso ou aquilo” e favorecer a ideia do “isso E aquilo”. Observar as relações não lineares e multidirecionais como fonte de inspiração e não de contradição.

É o momento do brainstorming, ou tempestade de ideias. Com base no que foi descoberto no momento da empatia, é hora de pôr pra fora tudo o que nosso cérebro conseguir produzir, e sem fazer críticas. Iterar a ideia do colega, evoluí-la e gerar novas ideias.

Não se deve contentar com a primeira ideia que vem à mente, nem adotar a primeira solução apresentada. Devemos exigir opções, há muito mais de onde partiram as primeiras ideias. A busca de novas opções leva tempo e complica um pouco as coisas, mas é o caminho para conseguir obter soluções mais criativas e satisfatórias.

E não se deve esquecer do pensamento visual. Só a representação gráfica pode simultaneamente revelar tanto as características funcionais de uma ideia quanto seu conteúdo emocional.

Prototipação

Na fase de ideação muitas opções são levantadas. Várias delas vão ser descartadas naturalmente, mas aquelas que parecerem mais promissoras precisarão ser prototipadas, iteradas, testadas e validadas.

“Falhe muitas vezes para ter sucesso mais cedo”

O pilar da experimentação é muito presente nesse momento. O propósito não é criar um protótipo funcional, mas tornar uma ideia tangível, dar forma para que seja possível identificar os pontos fortes e fracos.

Os protótipos iniciais devem ser simples, rudimentares e baratos, para que não haja a possibilidade de se apegar, não correr o risco de se prender a uma ideia ruim por muito tempo.

“Prototipar é pensar com as mãos.” (David Kelley)

Usar as mãos para dar vida a ideias estimula o cérebro a novas percepções, aumentando as possibilidades de identificar falhas e rapidamente corrigi-las.

Os líderes devem incentivar a experimentação. Não há nada de errado em fracassar com um protótipo, difícil mesmo deve ser fracassar depois do lançamento no mercado, depois de muito tempo e dinheiro investidos e com a quase impossível possibilidade de voltar atrás e começar de novo.

Meus primos exercitando a criatividade e experimentação com LEGO

O protótipo não precisa ser algo físico. No caso de um serviço por exemplo, o protótipo pode ser uma encenação teatral com um cenário rudimentar ou até um storytelling.

Felipe Macedo em um curso de design thinking na ECHOS Rio

“O cenário econômico brasileiro tem exigido das empresas cada vez mais agilidade e velocidade de adaptação. Modelos de gestão tradicionais perdem força para dar vazão a novas linhas de pensamento, que permitem maior oxigenação da estrutura corporativa. Nesse cenário, ganha mais quem tem mais velocidade e leveza para experimentar.”

Um olhar para os negócios

“A tendência natural da maioria das empresas é restringir os problemas a escolhas a favor do óbvio e do incremental. Embora eficiente no curto prazo, no longo prazo torna a organização mais conservadora, inflexível e vulnerável a ideias revolucionárias dos concorrentes.”

Eu achei super interessante uma ferramenta abordada, que ajuda a avaliar as iniciativas de inovação em uma organização, chamada matriz de formas de crescer.

No quadrante incremental provavelmente estará a maior concentração de projetos de uma empresa. Melhorias técnicas, formas mais eficientes de fazer o mesmo e até a quantidade de sabores de batata frita de um fabricante são considerados movimentos incrementais. Apesar de fundamental, não se deve concentrar todas as energias aqui, pois o risco de engessamento e lentidão de movimentação no mercado pode ser fatal.

Nos quadrantes evolucionários — estender e adaptar — estão os projetos que se expandem para novas direções, tanto para atender necessidades não atendidas do público atual quanto para atingir novos públicos, por exemplo, um carro com motor híbrido — eletricidade e gasolina — na direção de atender necessidades ainda não atendidas e a versão mais barata do iPhone, visando ampliar a fatia do seu público.

O quadrante revolucionário sem dúvida é o mais desejado e o mais difícil. Nele, estão não apenas os projetos de novos produtos e serviços, mas também de novos públicos, eles criam mercados totalmente novos. O Walkman da Sony e o Netflix são bons exemplos disso.

A melhor defesa de uma empresa é diversificar seu portfólio investindo nos quatro quadrantes da matriz.

Por onde começar?

A transformação de uma cultura tradicional de negócios em uma cultura concentrada na inovação e orientada pelo design envolve atividades, decisões e atitudes. Os workshops ajudam a expor as pessoas ao design thinking como uma nova abordagem. Projetos-piloto ajudam a convencer a organização dos benefícios do design thinking. A liderança se envolve no programa de mudança e permite que as pessoas aprendam e realizem experimentos. Montar equipes interdisciplinares assegura que as iniciativas tenham bases amplas. Espaços exclusivos proporcionam um estímulo para o pensamento criativo. A mensuração dos impactos, tanto quantitativa quanto qualitativa, ajuda na argumentação e assegura que os recursos sejam apropriadamente alocados. Faz sentido instituir incentivos para que as unidades de negócios colaborem de novas maneiras, para que os talentos mais jovens vejam a inovação como um caminho para o sucesso, e não como um risco profissional.

Cases

Bank of America

O programa “Fique com o troco” arredonda automaticamente o valor das compras no cartão de débito e transfere a diferença para a conta poupança do cliente. O problema era que as pessoas estavam poupando pouco, apesar de quererem muito. O insight do serviço veio da observação de um hábito, que as pessoas preferiam pagar valores redondos.

Four Seasons

Têm como base a premissa de que hotéis de grande escala e um excelente serviço não são incompatíveis. Nesta rede de hotéis de luxo, os empregados aprendem como se adiantar às necessidades dos clientes e a se basear nas ideias dos colegas. Em um programa, funcionários qualificados, depois de apenas 6 meses podem se hospedar gratuitamente em qualquer hotel Four Seasons ao redor do mundo. O hotel sabe que uma experiência excepcional começa com seu próprio pessoal.

Starbucks

Se transformou em uma marca global baseado no insight de que o ambiente é tão importante para os consumidores de café quanto a cafeína. Mesmo pagando um pouco mais e com outras cafeterias por perto ou às vezes do lado, as lojas da Starbucks sempre ficam mais movimentadas.

O design thinking pode ser empregado a milhares de projetos e empresas. O olhar centrado no ser humano implica em outputs não somente inovadores, mas aderentes às reais necessidades do público.

Antes de qualquer movimento neste sentido, é preciso exercitar a equipe a resolver questões por esse viés, usando esse mindset — modelo mental. Fazer cursos, treinamentos, workshops são ótimas opções para esse primeiro passo.

Imagina se todas as empresas do mundo tomassem o ser humano como base de seus projetos. Seria muito melhor viver neste planeta.

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