O cineasta argentino Matías Piñero, diretor homenageado da última edição do Festival Internacional de Cinema de Curitiba pela Mostra Foco | Lucca Café | Curitiba — PR | 2016 | (Foto: Lex Kozlik)

Filme ou Película!?

Como se referir a um filme em uma conversa com um diretor argentino: filme ou película!? Oh, dúvida cruel! Meu encontro com Matías Piñero, o diretor homenageado da última edição do Festival Internacional de Cinema de Curitiba.

Rômulo Zanotto

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Nem todo Festival é feito só de glamour e tapete vermelho. Geralmente, estes são os mais importantes, inclusive, porque ajudam a lançar mão de diferentes olhares, ângulos, perspectivas. Sobre a vida e sobre a arte.

Lançam pontos de vista menos óbvios do que o das produções habituais, sempre tão formatadas, massificadas e, quase sempre, previsíveis. O OLHAR, Festival Internacional de Cinema de Curitiba, é um destes.

Interessado em ser espaço de mostra e amostra da pluralidade de olhares do cinema sobre o mundo real, o Festival, em sua quinta edição em 2016, costuma ser um alento na grade de programação cinematográfica do restante do ano. “Com aquele cinema tão sufocante”, como descreve o diretor argentino Matías Piñero, homenageado da Mostra Foco. "Uma programação com tanta afirmação e determinação de como sejam as coisas."

A Mostra Foco apresenta ao grande público um diretor com até cinco filmes lançados, mas que ainda não seja muito conhecido. Em 2016, exibiu a filmografia completa de Matías, composta por cinco filmes — ou películas.

Matías Piñero | Festival Internacional de Cinema de Curitiba | 2016 | Lucca Café | (Foto: Lex Kozlik)

Com dez anos de carreira, pela primeira vez Matías está com uma retrospectiva em um Festival. Mas diz que a homenagem não assusta.

“Não me assusto porque não me levo tão a sério. É importante para que eu possa levar meu trabalho a conhecimento de um público maior, só isso”, explica ele, bem pé no chão. Como costumam ser aqueles que fazem cinema mas não se importam com o tapete vermelho. “O estranho é ser objeto de estudo, de foco.”

O diferencial em exibir a filmografia completa, segundo o diretor, “é a possibilidade de ver condensado um trabalho que foi se fazendo ao longo de dez anos. Seria diferente se eu tivesse vindo a cada ano com um filme, perderia este efeito, esta impressão que causa vendo juntas todas as películas.

Ainda desconhecido no Brasil, Matías já apresentou seu trabalho antes no Rio em São Paulo e em Juiz de Fora. Digo-lhe que os brasileiros estamos muito ligados à produção cinematográfica deles e, mais que isso, nos comparamos muito. Ele conta que a recíproca não é verdadeira.

“Muito pouco do cinema brasileiro chega até nós. Vejo filmes brasileiro ao redor do mundo, quando viajo, e sei que se faz cinema em Recife e Belo Horizonte. Conheço também as películas mais famosas, como as de Walter Salles. Mas as menos conhecidas custam a chegar”, esclarece o diretor. “Alguns destes realizadores, eu conheço dos Festivais. Mas certamente há outros que eu teria muito prazer em conhecer e nem sei que existem.”

Nomes do cinema brasileiro? Matías consegue lembrar de cinco: Kleber Mendonça Filho, Gabriel Mascaro, Ricardo Alves Jr., Gustavo Vinagre e Leonardo Mouramateus.

Uma das preocupações de Matías é encontrar maneiras alternativas para contar as histórias que se propõe. “De que maneira posso contar os desamores dos personagens de forma diferente? Como posso mostrar os sentimentos de um personagem? Como posso contar sobre um personagem se perde, sem que seja de uma maneira clássica?”

Flertando com a literatura e com o teatro na composição da obra, ambos também lhe servem de matéria-prima para seus filmes. Mas nenhuma das duas artes é mais importante, como referência, do que o cinema.

“Gosto de ter estas obras e poder contar com elas para preencher o vazio inicial do começo de um processo.”

O objetivo, muito antes, é problematizar e borrar os limites entre as linguagens artísticas. “O que seria cinematográfico? A que nos referimos quando dizemos que algo é cinematográfico?"

Após as primeiras exibições de cada filme, o Festival promoveu um debate com o diretor. Pergunto, então, se ele gosta de falar sobre sua obra ou acha que colocar um filme no mundo já é dizer o que tem para ser dito. Matías diz que gosta.

"É importante refletir sobre o que você já fez, sobre o que você já foi, sobre o que já passou, sobre o que mudou, o quê não faria de novo, como refaria se fosse hoje", finaliza.

Rômulo Zanotto e Matías Piñero conversam durante a 5a. Edição do Festival Internacional de Cinema de Curitiba, no Lucca Café | 2016 | (Foto: Lex Kozlik)

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Rômulo Zanotto

Escritor e jornalista literário. Autor do romance "Quero ser Fernanda Young". Curitiba.