Encontrado o portal para entrar na cabeça dos famosos

rosana hermann
3 min readFeb 25, 2016

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Toda vez que revejo o filme “Being John Malkovich” fico mais encantada. O roteirista Charlie Kaufman é incrivelmente original. Quem pensaria numa história de um bonequeiro (ok, ‘titereiro’, operador de marionete) que descobre um portal para entrar dentro da cabeça (e do corpo) do ator John Malkovich? Se você não viu o filme, veja, se viu, reveja. Ainda me arrepio de medo e curiosidade na hora em que o próprio John Malkovich entra no seu próprio túnel. Aguardar o resultado desse ‘infinito de si mesmo’ é compensador, hilariante. E assustador, porque metaforicamente, esse filme fala de toda a nossa vida na Internet. Começando com o fenômeno me-mim-comigo-eu-e-meu-selfie.

Nossa presença na rede é quase isso, um infinito de nós mesmos. Eu falo de mim, eu posto minha cara, faço streaming do meu passeio, escrevo minhas ideias, vendo meus produtos. O dia todo. O tempo todo. Todos os momentos para sempre. Não satisfeitos com essa onipresença instantânea, começamos a digitalizar o passado para repostá-lo. É o Throw Back Life. O facebook é hoje a AutoBiografia Multimídia de todos nós, a construção de um futuro obituário completo. Assustador? Vai vendo. Mas vai no meu autospoiler: melhora no final.

Mas, sem julgamentos. Estamos todos nessa eterna viagem do autoconhecimento, buscando no universo todos os signos, arquétipos, sinais e experiências em busca da resposta para a pergunta ‘quem sou eu na fila do pãozinho do Universo?’. Super válido.

A novidade é depois de mais vinte anos de Internet comercial no Brasil, temos uma geração inteira que não só aprendeu a mexer botões, clicar links, tocar telas, mas que descobriu coletivamente como ALTERAR O BRINQUEDO! Como mover as coisas e como … entrar na cabeça das pessoas!

Veja o Twitter: antes, a gente ficava ali olhando os Trending Topics. Até que lá nos anos 2000 e pouco, começamos a ‘mexer’ nas hashtags. Juntos, criávamos coisas, combinávamos com os amigos e… voilà! Chegávamos aos Trending Topics. Bic Muller, Emerson Damasceno, tanta gente,todo dia ‘emplacando’ coisas nos Trends. Até hoje a garota faz isso, o tempo todo. E isso é ‘mover’ o Twitter, é mexer os pauzinhos, achar o botão que comanda o brinquedo!

E na TV? Paula Tejando, a Musa da interferência da rede na TV ao vivo. Eles não entenderam ainda, mas NÓS, o povo da Internet (ha!), temos as chaves, as keywords, as tags, a criatividade e o drive interior para quebrar algoritmos e assumir o controle da sua nave! O segredo? O poder da rede.

E agora, senhoras e senhores, uma rede MUITO mais poderosa, a MAIS poderosa das redes, encontrou A ENTRADA DO PORTAL PARA O ANDAR 7 E 1/2.

A maior rede do Brasil sempre foi a de REVENDEDORAS AVON. Sério. Um exército de 1 milhão de mulheres que são acionadas até pelo Ministério da Saúde em campanhas nacional tamanho o alcance e a capilaridade dessa rede.

E agora que estamos todos (quase) online, a maior rede do Brasil é a REDE DE TODAS AS MULHERES. Sim, porque somos a maioria da população.

E assim aconteceu. Fernanda Torres escreveu um texto criticando o feminismo e ‘romantizando’ (pra não dizer ‘apoiando’) práticas de assédio a mulheres, que levantou uma onda gigantesca de repúdio. E um texto, de uma feminista e jornalista, Carol Patrocínio, foi eleito pela rede como resposta oficial. Milhares e milhares de links apontaram para o texto de Carol aqui no Medium. A força de todas as mulheres empurrando a mesma pedra que fechava a caverna, abriu-se por encanto. Abracadabra!

E descobrimos o portal. No andar 7 e 1/2, a entrada para a cabeça de Fernanda Torres. Todas as mulheres entraram lá e isso alterou a consciência de Fernanda. Que pediu desculpas públicas por seu texto equivocado.

Parabéns a todos os envolvidos. À poderosa rede de mulheres. Que esse poder seja usado sempre para o bem, sem ódio, sem vingança, sem desejo de destruição. Parabéns especialmente a Charlie Kaufman, visionário, que já sabia que mais importante que ter pauzinhos é saber como mexé-los.

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rosana hermann

physicist, writer, journalist, blogger, scriptwriter, professor, tv hostess, runner, knitter and twitter lover @rosana