História sobre a história de outra pessoa

ficcional não-ficcional

Samara Lima
Revista Passaporte
2 min readOct 1, 2017

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Parece enredo de novela, invenções de primeiro de abril e, ainda assim, em nenhum momento duvidei de nada; tampouco uma história me tocou tanto, e, ao mesmo tempo, me deixou tão boquiaberta.

Estava na BR, eu e um amigo, com plaquinha na mão.
Para um carro e, ainda sem acreditar que conseguimos carona, entramos.

O carona-salvador falava ao celular. Foram minutos falando, falando e eu achando graça de alguma coisa.
10 minutos. Ele desliga.

arquivo pessoal [2017]

Sem muitas conversas no início, somente aquele quebra-gelo básico sobre o destino-origem, nome... Aliás, o chamarei de Salvador, porque é o que sinto que ele foi.

Vez ou outra, uma troca de palavras para abafar os ruídos da estrada ou preencher o silêncio da paisagem.

“Eu nem deveria dar carona!!”

Após ouvir tais palavras tudo parou por alguns milésimos de segundos e uma eternidade.

Eis a história que originou esta história:

Salvador na estrada indo para algum lugar.
Salvador, há muitos anos atrás, deu carona para um rapaz que teve problemas com o carro na estrada. Ou o problema foi no carro de outra pessoa com quem ele, o rapaz, estava de carona.
Nem importa.

Este estava acompanhado de uma moça e não necessariamente eles se conheciam de longa data.
Nem importa também, tanto faz.

Salvador, o rapaz e a moça na estrada indo para algum lugar.
Se foram para perto ou longe, se estiveram por muito tempo juntos não se sabe.
Uma vez mais, nem importa.

Salvador, o rapaz e a moça na estrada são parados pela Polícia Federal.

Salvador estava na estrada para negociar um pedaço de terra, queria plantar. Já o rapaz estava não somente viajando, como traficando também, e levava consigo muitos quilos de maconha na mochila quando a PF o parou.

Parece que se alguém tem muito dinheiro e anda com alguém que tem muita droga, e, se parados pela Polícia Federal, ambos serão presos.

Ninguém o salvou.
Salvador alegou não estar envolvido.
O rapaz alegou que Salvador nada tinha a ver com aquilo.
Salvador foi preso e ficou mais de ano na cadeia até provar inocência.

Ele quase nunca deu carona na vida e, numa dessas poucas vezes, foi preso injustamente.
Ele, mesmo depois de tudo, parou, abriu a porta do carro, se abriu, nos salvou.

Salvador é da terra, planta no seu pedaço de chão; é rezadeiro, mesmo não usando essa palavra para sê-lo; é preocupado, cuida do outro.

Eu agradeço demais por esse dia, pelo encontro, cuidado, tudo.

* O nome foi alterado porque eu quis mesmo, sem sigilos;
* Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência;
* Esse texto é para aqueles que acreditam no outro apesar dos pesares;

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Samara Lima
Revista Passaporte

viagem, café, cinema, paisagem. aqui, pouco ou nada disso.