Constelação Fílmica: a paixão do fim em Titanic, Before Sunrise e Closer — Perto Demais

Sol de Lótus
5 min readDec 10, 2023

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Constelações fílmicas de “Before sunrise”, “Titanic” e “Closer — perto demais”

Titanic, de 1997, Before sunrise, de 1995, e Closer — perto demais, de 2004, contam a história de alguns amores rápidos e efêmeros. Assim que Titanic inicia, temos uma cena no presente que mostra o navio naufragado e seus restos em cena no fundo do mar. Sabemos que a protagonista sobrevive pois ela, já idosa, aparece. Rose, mulher jovem, de classe alta e prestes a casar sem sentir amor algum conhece Jack, um homem pobre e narrativamente aventureiro. Com a introdução do filme sabemos que Rose sobrevive, mas que Jack certamente não. Ao fim, vemos com clareza que Jack morreu salvando Rose. Já em Before sunrise é contada uma história de dois jovens, Celine e Jesse, que se conheceram nos vagões de um trem que viaja pela Europa. Jesse está apenas de passagem e vai à Viena esperar a madrugada inteira pelo seu vôo de volta pra casa. Assim que conhece Celine, em pouco tempo de conversa a chama para passar os últimos momentos da viagem com ele. Ela vai, vive uma paixão estarrecedora, mas ao amanhecer eles se despedem. Já em Closer essa paixão imediata vira o ponto crítico principal com o início de relacionamentos baseados em uma paixão instantânea mas, ao contrário dos outros dois filmes, essa paixão se estende e acaba quando um dos personagens começa a se sentir também instantaneamente atraído por outra pessoa, passeando por traições e “quartetos” amorosos.

Os dois primeiros filmes, Titanic e Before sunrise, têm diversas características em comum e, entre tantas opções, contarei sobre a relação entre paixão imediata e efemeridade. As duas primeiras narrativas contam a história de duas pessoas que se apaixonam imediatamente mas, logo no início dos dois filmes, os vemos sabendo que aquela relação terá um fim próximo. O espectador assiste o romance com a amarga expectativa do fim. Essa intensidade da atração e da paixão é rodeada de um misto de loucura entre as duas protagonistas femininas. Uma decide largar toda riqueza e o casamento próximo para viajar o mundo com uma pessoa que acabou de conhecer, já a outra decide descer em outra cidade que não a de destino para passar horas com alguém que também conheceu recentemente. Aprofundando-se ainda mais, a experiência também mostra que as duas protagonistas estavam infelizes, insatisfeitas e apáticas com suas próprias vidas, é sentida a desesperança que, ao longo do filme, abre espaço para uma força vital e uma vontade ainda maior de viver. Os dois primeiros filmes, ainda mais subjetivamente, embalaram narrativas que aconteceram quando os personagens estavam de passagem e se deslocando de um lugar para outro: no trem e no navio. Seria, portanto, uma possibilidade de haver uma distância física entre suas realidades e rotinas, uma paixão que surpreende em um momento de passagem que também revela o emocional das pessoas, mudando e se transformando drasticamente. Além desses detalhes e possíveis interpretações, o primeiro beijo dos dois revela ainda mais o sentimento de adrenalina e aventura: em Titanic o primeiro beijo é na proa do navio, na qual um dos dois poderiam cair ao mar. Já em Before sunrise o primeiro beijo acontece numa vista alta de uma roda-gigante. Essa paixão estarrecedora se centra na ideia de que, muito rápido, se deparará com o fim.

Já no último filme, Closer — perto demais, o que acontece é semelhante em alguns aspectos mas abordado de maneira diferente. Um casal se encontra, os dois sentem uma paixão imediata mas, ao contrário dos outros filmes, a paixão se estende para um relacionamento sólido. Vemos, então, o destrinchar dessa relação que, aos poucos, acaba. O ponto inicial para o fim é quando um dos personagens, Dan, se depara com outra paixão imediata e trai sua parceira. A semelhança de se apaixonar instantaneamente, antes algo romantizado e idealizado, é o principal ponto de conflito do último filme que, por esse motivo, diverge dos outros dois. O encontro para o desencontro é a principal característica dessa constelação fílmica. Uma característica em comum, portanto, é compartilhada no filme Titanic e em Closer: nos dois filmes o primeiro contato entre o casal é quando as mulheres vivenciam situações perigosas e de risco e, a partir disso, são “salvas” pelos protagonistas homens.

Alguns questionamentos difíceis de responder surgem ao olhar narrativamente para essas histórias. Será que, em Titanic e Before sunrise, o relacionamento daria certo se não existisse um fim? Até que ponto podemos enxergar a influência do mundo externo, que cada vez mais cria relacionamentos insólidos, como inspiração para os filmes e até que ponto esses filmes também romantizam e influenciam essas relações? Por que as mulheres precisaram de homem para se sentirem salvas e com esperança? É inevitável problematizar a lacuna na ideia social de amor quando nos deparamos, desde os contos-de-fadas, com a romantização do encontro e do “amor à primeira vista”. Closer, com um olhar pessimista, desdobra um possível futuro de casais que começaram uma relação apenas por esse sentimento que é, na maioria das vezes, insustentável. A certeza de que a relação terá um fim — ou um felizes para sempre — faz com que essas paixões sejam possíveis e esses sentimentos se eternizam na memória. Particularmente me sinto mergulhada nesse ideal e individualmente isso me toca. Me vejo e vejo o redor vivenciando cada vez mais relações curtas, imediatas e não-duradouras. Relações que se guiaram pelo primeiro olhar. Relações que só duraram alguns dias de emoções antes de realmente se concretizarem. Além disso, também relações que se concretizaram e, particularmente, nenhuma fluiu por muito tempo. Para além da ideia de que alguém chegará e o coração vai palpitar ao primeiro olhar, que a pessoa vai te salvar do seu niilismo e te fazer enxergar o mundo de outra maneira, que ela vai ser um rito de passagem que você vai lembrar depois de adulta e casada (como é dito em before sunrise), Closer demonstra que se guiar por esses sentimentos pode também fazer com que isso acabe. O que sobra depois do primeiro olhar? E talvez, o que sobrará, é o desejo inerente de encontrar um outro primeiro olhar e vivenciar inícios novamente. Talvez sobrará o fim ao sentir que a paixão acabou ou a ausência de solidez ao romantizar a paixão, tornando, cada vez mais, as relações superficiais e sem profundidade alguma.

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Sol de Lótus

Poeta, multiartista e estudante de Cinema e Audiovisual. Aqui compartilho pensamentos <3